“O processo” de encomendas de bens e serviços necessários ao combate à crise pandémica utilizado pela Câmara de Ovar, concelho que esteve em cerco sanitário entre março e abril, revelou-se “ambíguo” e “sem definição clara de um protocolo de tramitação que deveria ter sido previsto” refere uma análise feita pelos vereadores do PS apontando, ainda, “a inexistência da evidente identificação de responsáveis em cada uma das fases necessárias” a compras e contractos.
Os eleitos Fátima Bento e Artur Duarte assinam a “auditoria” de 60 páginas que fizeram “às contas das medidas de combate à pandemia da doença da Covid-19 apresentando, a terminar, 14 conclusões.
Logo no início, é deixada uma nota de estranheza por não ter havido “qualquer tentativa” por parte da Câmara de maioria PSD de “acautelar o ressarcimento por parte do Estado, designadamente do Ministério da Administração Interna e do Ministério da Saúde, pelos custos incorridos” nas ações de apoio, no âmbito das quais foram orçamentados 700 mil euros no primeiro trimestre do ano.
A Câmara é acusada, também, “de atuar de uma forma voluntarista sem cuidar do impacto financeiro das medidas tomadas.”
Isto apesar de uma parte da não execução do “orçamento Covid” dever-se, na ótica dos socialistas, à “circunstância do cenário pandémico não ter, felizmente, atingido as proporções aventadas” na altura.
Assim, a aquisição de equipamento que se sabia, à partida, não ter uso futuro “prefigura a existência de uma gestão pouco cuidada dos dinheiros públicos.”
Ao nível da facturação, o PS detetou “situações onde o descritivo” da mesma “por ser demasiado genérico, não evidencia a quantidade dos bens e serviços prestados e ou por quem usufruídos”, bem como “uma informalidade excessiva no processo de aprovação das encomendas e do pagamento”.
Para os vereadores da oposição, o processo de abastecimentos em causa “fomentou a existência de práticas pouco claras, nomeadamente no que respeita à aquisição de Equipamentos de Protecção Individual (EPI).
Adjudicações a empresas de gelados, construção e até remoção de cadáveres
» “Carece de uma boa explicação o facto de a Câmara ter seleccionado sete empresas do mesmo concelho (Águeda), comprando-lhes essencialmente máscaras e não tendo excedido a facturação de cada uma delas os tais 20.000,00 permitidos pelo ajuste directo simplificado. Mais estranhamos, ao analisar o objecto social de cada uma delas, tratarem-se de empresas de fabrico e comercialização de gelados, duas da indústria de construção civil, outra de aluguer e venda de cadeiras de rodas, outra de fabrico de peças e acessórios de metal para a construção civil, uma outra de contabilidade e consultoria e até temos uma que se dedica à desinfecção e limpezas, remoção e transporte de cadáveres. Pasme-se que, esta última, foi fundada na segunda quinzena do mês de Abril de 2020, e a 7 de Maio já facturou 19.250 Euros, valor esse a que acresceu o IVA à taxa legal, ao Município de Ovar.”
“Embora corroboremos da opinião de estarmos na presença de uma situação muito grave, consideramos que a mesma não deixa de ser equiparável à existente noutros pontos do território nacional pelo que, o empolamento que foi dado em Ovar, contribuiu para a tomada de decisões e para assunção de encargos desproporcionados em bens, cuja necessidade é questionável, cujas quantidades em muitos casos é desconhecida e a preços que tememos não tenham sido os normais do mercado, mesmo à data em que os factos ocorreram”.
PS acusado de fazer interpretação incorreta das respostas técnicas e deturpar explicações
A maioria PSD reagiu num comunicado, contestando o método e as conclusões da análise socialista porque “não fez uma correta apreciação e enquadramento das respostas técnicas que foram dadas e deturpa as explicações prestadas e a legislação aplicável.” Por isso, “muitas das considerações e conclusões do relatório não correspondam à realidade e aos factos ocorridos”.
A presidência deteta “erros de redação e interpretação”, bem como “juízos incorretamente formulados sobre esclarecimentos técnicos prestados”, lamentando “profundamente, a deturpação ou falta de competência técnica para a formulação de opiniões assentes na ausência de domínio legal e contabilístico das matérias por quem pretendia assumir as funções de auditor”.
Aquisições dentro do regime legal
“Todas as aquisições de bens e serviços destinadas à prevenção, contenção, mitigação e tratamento de infeção epidemiológica por COVID-19, bem como à reposição da normalidade em sequência da mesma, foram efetuadas no quadro do regime legal das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2, em matéria de contratação pública e de autorização de despesa, constantes do Decreto-lei 10-A/2020, de 13 de março, conjugadas com os princípios e as disposições normativas que constam do Código dos Contratos Públicos, e foram, devida e oportunamente, justificadas, fundamentadas, enquadradas, autorizadas e pagas por quem tem competência para o efeito”
Ler comunicado completo da maioria PSD na Câmara de Ovar.