Vacinas novas, desafios antigos

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Produção de vacinas.

Devemos ter o cuidado necessário para não expandir a infodemia, uma epidemia que consegue produzir efeitos tão nefastos como o vírus.

Por Mário André Macedo *

A espera mais aguardada dos últimos anos está prestes a terminar. A agência europeia do medicamento, pode emitir parecer favorável à vacina da Pfizer a dia 29 de dezembro e a dia 12 janeiro fazer o mesmo à vacina da Moderna. Encontra-se ainda em processo de análise, as vacinas da AstraZeneca e da Janssen.

De forma expectável, antes de haver vacina a circular, já temos bastantes teorias carregadas de desinformação. Este é um tema bastante sensível, que requer uma comunicação simples e adaptada a toda a população. A vacina não será obrigatória, o que é uma boa medida, assim como é a opção pela sua universalidade e gratuitidade. Agora, é necessário que a campanha de comunicação seja bem planeada e chegue a toda a população. Além dos grupos anti-vacinas, que seriam sempre contra, há pessoas com naturais e legítimas dúvidas que devem ser esclarecidas.

Como foi possível ter vacinas de forma tão rápida? A pergunta tem interesse e é relevante sintetizar a resposta. As recentes epidemias provocadas por outros dois coronavírus, a Sars (2002-2004) e a Mers (2012), lançaram as bases para futuras vacinas por doenças causadas por vírus desta família.

A tecnologia que utiliza o adenovírus como vetor para induzir uma resposta imune, começou a ser trabalhada no final da década de 1980. A outra tecnologia utilizada nas atuais vacinas para o Sars-Cov-2, o ARN mensageiro, que consiste em envolver uma pequena partícula de material genético viral envolvida num envelope lipídico, que induz a célula a produzir uma específica proteína viral, que por sua vez provoca a desejada resposta imune, é mais recente.

Mesmo assim, em 2018 existiam já 7 projetos em fases avançadas, que se proponham utilizar esta tecnologia para, entre outras, vacinas para o HIV e alguns tipos específicos de cancro. Ambas as técnicas têm a vantagem de se constituírem como “vacinas modulares”, como que uma solução pré-feita e validada para qualquer novo agente que surja, sendo apenas necessário realizar pequenos ajustes. Desta forma, o espaço temporal necessário para desenvolver uma nova vacina é bastante encurtado.

A resposta tem um final óbvio – dinheiro. Para o desenvolvimento desta vacina houve financiamento público como nunca houve na história. Com uma enorme quantidade de recursos à disposição, sem necessidade de acomodar os riscos em caso de insucesso, foi possível apresentar resultados em tempo recorde. De facto, estamos perante um feito incrível, que apenas há 15 anos seria considerado ficção científica.

Um dos novos mitos mais propagados pelas redes sociais, está relacionado com a possibilidade de a técnica de ARN mensageiro (mRNA) poder alterar o ADN, a informação genética das células humanas. Na realidade, o mRNA vai apenas ensinar as células musculares a produzir uma específica proteína viral, não interagindo com o ADN. A molécula injetada após cumprir a sua função é degradada e a proteína produzida, é destruída pelo sistema imunitário.

As restantes teorias em redor desta nova técnica fazem menos sentido. Mas dado o contexto excecional, é importante o investimento para as desmontar. Por isso, não, o Bill Gates não está por detrás de um maquiavélico plano para colocar chips nas pessoas, de forma a controlar a população com auxílio das torres de 5G. Esta teoria não é apenas falsa, como impossível. A internet pode ser um terreno fértil para este tipo de alegações. Devemos ter o cuidado necessário para não expandir a infodemia, uma epidemia que consegue produzir efeitos tão nefastos como o vírus.

A logística e o desafio é enorme e durará todo o ano de 2021. Os enfermeiros terão um importantíssimo papel pela frente, irão vacinar de forma segura e rápida, seguindo rigorosos critérios pré-definidos, na medida em que as vacinas cheguem ao nosso país. Pode não ser possível extinguir o vírus, mas será possível controlar e tornar a doença residual, para desta forma, as nossas vidas retomarem ao normal. Não esquecendo que simultaneamente, são necessárias políticas públicas que consigam dar resposta à atividade programada não efetuada e recuperar a economia. O próximo ano terá de ser o ano da superação.

* Enfermeiro especialista em saúde infantil. Artigo publicado originalmente no site Healtnews.

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