A recuperação de imóveis públicos de elevado valor patrimonial que não estão a ser usufruídos pelas comunidades e seus visitantes, através da realização de investimentos privados é um dos objetivos de Programa REVIVE, criado numa iniciativa conjunta dos Ministérios da Economia, da Cultura e das Finanças, constitui uma oportunidade única para o território do Forte da Barra.
Fátima Lopes Alves *
É uma honra poder referir-me a um elemento tão importante do património local edificado da Ria de Aveiro – o Forte da Barra – porque este espaço que vai a concurso, no âmbito do Programa REVIVE, faz parte das minhas memórias de infância e de família e atualmente da minha vida profissional.
Quando nasci, no Forte da Barra, havia apenas um edifício de hospedagem, com caráter turístico que era pertença dos meus avós maternos (Germano e Aldegundes) – na época chamava-se Pensão Jardim – assumida na sua designação o elemento urbano relevante do lugar do Forte da Barra – o Jardim -, ladeado pelas casas maiores, pela capela da Nossa Senhora dos Navegantes, onde os meus pais casaram há 60 anos, e pelos edifícios pertença do Porto de Aveiro (Direção Geral dos Portos / JARBA/ APA).
O Jardim, era um lugar privilegiado de convívio, recreio e lazer dos que por cá passavam e dos que por cá viviam o ano todo.
Neste pequeno aglomerado viviam cerca de 10 a 12 famílias que conviviam intimamente com Porto de Aveiro, representado neste conjunto urbano pelo interessantíssimo edifício JARBA, onde funcionavam as oficinas. Muitos dos que aqui moravam acabaram por se tornar trabalhadores do Porto, trazendo muitas vezes outros membros das suas famílias para cá trabalhar.
Neste pequeno lugar, para as crianças e jovens que aqui residiam, as férias letivas eram momentos de imensa liberdade de tempo, em permanente contato direto com Ria e o seu Porto.
O plano de água da Ria de Aveiro banhava todo o aglomerado, o produto turístico que se oferecida já era imenso e diversificado – Ria, mar, sol e natureza.
Nadar, andar de bicicleta, observar as diferentes espécies de fauna e flora, eram atividades do nosso dia-a-dia de férias, onde o tempo não tinha horas e o dia, para os mais novos, terminava com o pôr-do-sol!
Aprendia-se a nadar na caldeira (hoje Marina do Forte), aprendíamos a andar de bicicleta no jardim Oudinot (até sem mãos!), fazíamos longas caminhadas a pé até à SACOR (hoje Terminal de Granéis Líquidos), à praia da Barra – Praia da Meia Laranja ou na Praia do Paredão (atravessando a ponte de madeira, a pé ou de bicicleta), ou, aqui mesmo ao lado – no cais do Forte da Barra – atravessávamos para o triângulo no bote da D.ª Ester, ou apanhávamos a lancha para S. Jacinto e, lá chegados, íamos até ao mar (a pé ou de bicicleta), atravessando parte da zona florestal de pinhal onde se apanhavam as doces Camarinhas.
Aqui mesmo, no edifício do Forte da Barra, subíamos, vezes sem conta, as escadas que dão para o Forte, entrávamos, também vezes sem conta, naquela que era a casa de férias de um dos Diretores do Porto (na altura da minha infância o Eng.º Barrosa). As férias eram verdadeiros momentos infindáveis de recreio e convívio entre amigos e famílias.
Não se falava em turismo de natureza, percursos pedestres ou pistas cicláveis, mas tudo isso acontecia aqui neste território e, acontece hoje, com inovação em diversos segmentos do turismo.
O território do Forte da Barra soube adaptar-se, soube inovar-se na sua fruição, soube manter as valências naturais de um ecossistema lagunar desafiante para qualquer uso ou ocupação, seja ele ambiental, social ou económico.
Hoje, celebramos o lançamento do concurso público de concessão do Forte da Barra de Aveiro, no âmbito do Programa REVIVE, que tem por objeto a concessão de uso privativo de duas parcelas dominiais e respetivos edificados, designados por Forte da Barra, com vista à realização de obras, incluindo infraestruturas, e posterior exploração para fins turísticos, como estabelecimento hoteleiro, estabelecimento de alojamento local, na modalidade de estabelecimento de hospedagem, ou outro projeto de vocação turística.
O Forte da Barra é um produto territorial endógeno de longa data com elevado potencial; passando momentos de maior ou menor procura turística, foi-se mantendo com esforço dos que aqui ainda se conservam (como o Café da D. Lurdes), ou dos que acreditando no seu potencial, investem agora (como é o caso do Restaurante Marina do Luís Lavrador).
Com a abertura e fixação da Barra de Aveiro é identificada a necessidade de construção de um novo farol, mais próximo da entrada da Barra, de grande alcance e da maior intensidade de luz! O Farol do Forte da Barra perde importância e perde também a função de apoio à navegabilidade, passando os seus edifícios a ser residência de funcionários da então Direção Regional de Portos (neste caso do Porto de Aveiro).
A recuperação de imóveis públicos de elevado valor patrimonial que não estão a ser usufruídos pelas comunidades e seus visitantes, através da realização de investimentos privados é um dos objetivos de Programa REVIVE, criado numa iniciativa conjunta dos Ministérios da Economia, da Cultura e das Finanças, constitui uma oportunidade única para o território do Forte da Barra.
Não podia estar mais feliz com o lançamento deste concurso, quer como utente deste espaço de recreio e lazer, mas também na qualidade de presidente do Porto de Aveiro, proprietário do edificado, reconhecendo a necessidade de valorização do seu património (edificado ou não), como elementos estruturantes de desenvolvimento local e também regional.
O Programa REVIVE constitui, para este Conselho de Administração, desde o primeiro momento, uma iniciativa e oportunidade única para o Forte da Barra, para o município de Ílhavo, para a região mas também para o Porto de Aveiro, que pese embora não tenha por vocação o negócio turístico, tem a responsabilidade social e territorial de contribuir para prossecução dos objetivos de reabilitação e valorização do seu património edificado e não edificado, em equilíbrio com a atividade portuária.
Gostaria ainda de agradecer, publicamente, a toda a equipa do Programa REVIVE e, aos colaboradores do Porto de Aveiro, que de forma muito empenhada conseguiram preparar todos os elementos do concurso que hoje se publicita. Não foi tarefa fácil mas conseguimos! E a expectativa que temos é muito elevada.
Finalizo, esta minha intervenção, reafirmando que o Porto de Aveiro está e estará sempre disponível para ser um parceiro ativo na promoção do desenvolvimento local e regional.
* Presidente do Conselho de Administração do Porto de Aveiro. Discurso proferido na cerimónia de lançamento do concurso REVIVE.