Quando em novembro de 2021 a Associação da Hotelaria de Portugal avançou com o número de 15 mil trabalhadores em falta, só para os hotéis, se pecámos, foi por defeito.
Por Cristina Siza Vieira *
Turismo em Portugal é o prato forte do momento, de que todos se sentem habilitados a falar, por boas e más razões. De uma banda, é apontado como responsável pela forte recuperação da economia portuguesa no pós-covid, que nos irá permitir uma saída acelerada da crise, antecipando as previsões de retoma, quer por parte das autoridades portuguesas, quer das internacionais.
De facto, da Comissão Europeia vem o consolo da previsão de um crescimento económico em Portugal em 2022 de 5,8%, muito acima da Zona Euro (2,7%), e é apontado o Turismo Internacional, em franca recuperação, como o inequívoco responsável para este crescimento.
De outra banda, não há dia em que não se fale da tremenda falta de pessoas para trabalhar no Turismo, especialmente na hotelaria e na restauração.
Sem dúvida uma e outra são constatações verdadeiras e ambas estão ligadas, quer já no momento presente, quer no futuro. Porque sem pessoas não há Turismo e sem Turismo o nosso país não prospera, o que se fizer hoje irá marcar o futuro do país.
O tema da escassez de RH é já velho. Basta navegar nas notícias por essa busca e, já em 2017, os hoteleiros vinham alertando para a necessidade de se captarem pessoas para as escolas e profissões hoteleiras, quer para house-keeping, serviço de cozinha e mesa, quer para receção, revenue managment, apoio administrativo, etc. Em 2019 foi reforçado o sinal de alerta e apontada a urgência em serem abertos canais mais ágeis para captar trabalhadores emigrantes, sobretudo no perímetro da CPLP.
Portanto, o que aconteceu de lá para cá foi o agravamento dessa situação, que, aliás, veio a atingir vários setores económicos, e toda a Europa ocidental. E os tais “canais” não-abertos.
As causas são várias, por isso as soluções tudo menos fáceis.
Desde logo apontam-se o nosso “inverno demográfico” – a baixa taxa de natalidade em Portugal -; a maior qualificação das pessoas; os salários baixos; os horários e condições de trabalho; a rigidificação da contratação coletiva; o peso dos custos laborais para as empresas; os prolongados esquemas de lay-off e apoios ao desemprego durante a pandemia e a conversão noutros tipos de funções e trabalho que a mesma potenciou.
Vários destes constrangimentos são comuns a quase todos os países europeus, dos menos aos mais fortemente “turísticos”.
Para não irmos mais longe, aqui ao lado, em Espanha ,a indústria turística diz que lhe faltam 100 mil trabalhadores; em França a maior associação do setor diz que faltam 250 mil, só para cafés e restaurantes; em Itália o presidente da maior federação diz que faltarão este verão 20% dos trabalhadores necessários e o ministro do Turismo concretiza: 250 mil. Já para não falar no Reino Unido, neste caso mais ainda a braços com as consequências do Brexit e a saída brutal de emigrantes.
Ou seja, quando em novembro de 2021 a Associação da Hotelaria de Portugal avançou com o número de 15 mil trabalhadores em falta, só para os hotéis, se pecámos, foi por defeito. É que, com a expectativa de crescimento que o verão nos traz, esse número ficará muito aquém das necessidades, havendo ainda que somar todas as outras fileiras do Turismo, particularmente na restauração.
Dado o diagnóstico, que soluções poderão ser desenhadas? Aponta-se a necessária subida de salários como cura para este desespero. E criticam-se os empresários por hoje arrepelarem os cabelos quando pouco fazem para cativar e reter os trabalhadores. Será assim? É justa a crítica? Será que a subida dos salários, admitindo que as empresas a podem suportar, só por si iria resolver o problema?
Não creio. Porque o tema é muito sério e merece séria reflexão, deixo para a próxima crónica a minha perspetiva.
* Vice-presidente executiva da AHP – Associação da Hotelaria de Portugal. Artigo publicado em https://www.hoteis-portugal.pt/.
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