O SNS definhou, os problemas avolumaram-se e o presente parece evidenciar que se perdeu o sentido de trabalho em equipas, de envolvimento dos cidadãos e dos profissionais, de decisões nem suficientemente consolidadas e sobretudo não partilhadas.
Por Rui Cernadas *
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Alguém certamente muito sensato afirmou que, quanto se inventa não é mais do que uma combinação de velhos conhecimentos, ainda que não adequados…
A ideia propalada de que, o SNS tem uma nova vida prometida a partir da mera alteração do modelo organizativo da prestação de cuidados de saúde, é um exemplo de como se inventa a partir de princípios e dados nem novos, nem originais.
Falo naturalmente da extensão do modelo Unidade Local de Saúde (ULS) ao conjunto do território continental.
Quanto à “novidade” do modelo em si, recordo que a ULS de Matosinhos, que vai celebrar os seus 25 anos de existência, foi a primeira a ser gerada já no ano de 1999, do século passado.
Pretender ou assumir que uma gestão integrada dos recursos, designadamente cuidados primários e hospitalares, numa determinada e concisa área geo-administrativa como a do concelho de Matosinhos, na verdade um único município, posse replicar o sucesso ou os bons resultados conhecidos, é arriscado quando se transpõe à escala ora evidente.
Era então Ministra da Saúde, de boas memórias, a Drª Maria de Belém Roseira.
E depois dela, já vimos como o exemplo dos Centros Hospitalares, que igualmente fundiram a gestão de unidades hospitalares distintas, mas em áreas novamente sobreponíveis em algumas ULS, pouco eficiente…
O tempo passou e rapidamente.
O SNS definhou, os problemas avolumaram-se e o presente parece evidenciar que se perdeu o sentido de trabalho em equipas, de envolvimento dos cidadãos e dos profissionais, de decisões nem suficientemente consolidadas e sobretudo não partilhadas.
Todos conhecemos muitos, centenas de profissionais que, acordaram no primeiro dia do Ano de 2024 integrados em ULS.
Sem ninguém ter sido devida ou completamente informado para além do óbvio e do que saiu na comunicação social.
E ao invés do que foi anunciado, a nova relação hierárquico-funcional não superou a falta de respostas em saúde, não ultrapassou a “atomização e dispersão das unidades de saúde” referida pelo Senhor Ministro da Saúde, não criou novas Unidades de Saúde Familiar (USF) – além de mudar a designação e eventualmente as condições remuneratórias do pessoal que estava alocado em USF modelo A ou em unidades não USF…
A medida associada de dar médicos de família a mais Portugueses, não decorreu de mais médicos, mas da atribuição a esses médicos de mais utentes.
Isso dificilmente muda o panorama global da oferta assistencial dos Cuidados Primários, tanto mais que se conhece a dificuldade relatada pelos utentes do SNS em obter marcações e agendamentos em tempo imediato ou próximo disso, ainda que inscritos em médicos de família. Aliás, este aspecto nada tem a ver com a sazonalidade vivida ou com a incidência acrescida de infecções e complicações respiratórias.
Ou se quiserem com a falta de estratégia atempada para a vacinação contra a gripe, como se constata agora com o alargamento da campanha a indivíduos sãos, com menos de 65 anos, quando o pico da gripe está no calendário e em dia!
Por outro lado, os recursos humanos hospitalares são escassos e desse lado, as respostas pecam pela insuficiência e pela demora. Falta mesmo perceber em que medida é que, os actuais excessos de mortalidade não se entroncam com aumentos não apercebidos em meio intra-hospitalar ou ainda pelo prolongamento dos tempos de espera aceitáveis, quer em primeiras consultas, quer em cirurgias necessárias.
E estas são questões para as quais, sendo incontroversa a necessidade de boa organização e de superior administração, a implementação do modelo ULS não resolve por si só.
* Médico de Família. Artigo originalmente publicado em Healthnews.pt.
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