A recente medida do governo, que permite que os candidatos a juízes já não necessitem de possuir um grau de mestrado, levanta preocupações quanto à qualidade e à preparação do corpo judicial. A magistratura, como pilar fundamental do estado de direito, exige um elevado nível de qualificação técnica e humana. Retirar o requisito do mestrado pode enfraquecer a capacidade dos futuros juízes em desempenharem eficientemente o seu papel.
Por Diogo Fernandes Sousa *
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Em primeiro lugar, é essencial reconhecer que o mestrado em direito oferece uma formação mais especializada e aprofundada, que complementa o ensino de base da licenciatura. A função de juiz requer não apenas o conhecimento das leis, mas também uma capacidade de interpretação e aplicação das mesmas em contextos complexos e em constante mudança. O mestrado proporciona essa base mais rica de conhecimento, que capacita os juízes a lidar com a diversidade de casos com os quais se vão deparar. Sem esta formação avançada, o risco de decisões menos fundamentadas ou de má qualidade aumenta.
Além disso, a exigência de um grau de mestrado não é apenas uma questão de acumular conhecimento teórico, mas sim de aprofundar as competências críticas, analíticas e éticas que são fundamentais. O ambiente académico do mestrado permite aos alunos mais tempo e espaço para refletir sobre questões complexas, debater princípios jurídicos fundamentais e desenvolver uma perspetiva mais madura e ponderada sobre a aplicação da justiça. A ausência desta etapa formativa pode levar à entrada de candidatos na magistratura sem a maturidade e profundidade de pensamento necessárias para lidar com casos de grande complexidade e impacto social.
Outro aspeto negativo desta medida é que pode levar à desvalorização social da profissão de juiz. Exigir uma formação de nível mais elevado para o ingresso na magistratura transmite uma mensagem clara sobre a importância e responsabilidade associadas à função. Ao eliminar o mestrado como requisito, corre-se o risco de banalizar a exigência de excelência para o exercício da profissão, o que pode comprometer a credibilidade dos juízes aos olhos do público. Em última análise, isto pode enfraquecer a confiança dos cidadãos no sistema judicial.
Adicionalmente, é importante considerar o impacto a longo prazo desta medida na qualidade global do sistema de justiça. Um juiz com uma formação insuficiente pode cometer erros graves na interpretação das leis, levando a decisões judiciais erradas, injustas ou mal fundamentadas. Este cenário pode resultar em processos prolongados devido a apelações ou até ao aumento de decisões contestadas, o que enfraqueceria a imagem de Portugal internacionalmente.
Outro aspeto crítico a ter em conta é que o sistema jurídico está em constante evolução. As questões de direito contemporâneas envolvem, cada vez mais, áreas tecnológicas, ambientais e de direitos humanos, que exigem uma preparação robusta. As novas formas de criminalidade, como os crimes cibernéticos ou questões ligadas à inteligência artificial, são exemplos de desafios que exigem juízes com uma formação técnica mais ampla e atualizada.
Em suma, esta medida, longe de democratizar ou simplificar o acesso à magistratura, pode ter consequências negativas para o sistema de justiça. A formação avançada que o mestrado proporciona é um pilar para a preparação dos juízes, assegurando que estes têm o conhecimento, a capacidade crítica e a maturidade necessárias para desempenhar uma função tão importante. Reduzir as exigências pode comprometer a qualidade das decisões judiciais, enfraquecer a confiança pública no sistema e criar dificuldades a longo prazo para o funcionamento da justiça.
* Docente do Instituto Politécnico Jean Piaget do Norte.
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