Os abusos sexuais de crianças na Igreja Católica têm sido uns dos assuntos mais marcantes da agenda mediática do nosso país. Nunca os erros de alguém podem ser desculpados com o mal praticado por outros, muito menos quando são maiores as responsabilidades éticas de quem pratica esses erros.
Por Eugénio da Fonseca *
Porém, flagelos desta natureza, como deixam marcas indeléveis no mais íntimo das vítimas que, em algumas, nunca chegam a cicatrizar, também ficam na memória histórica das comunidades, a diferentes níveis, em que estes hediondos crimes acontecem. O país deve recordar-se do escândalo que foi, em 2002, a descoberta dos abusos sexuais de menores na Casa Pia. Este doloroso tempo por que está a passar a Igreja Católica deve servir para que outras instituições, se já houve algum indício, tenham também a coragem de mandar estudar este gravíssimo problema.
Como em tudo, a solução mais adequada é a prevenção, embora, infelizmente, no nosso país, se continue a apostar mais na remediação, mesmo sabendo que ela traz custos muito mais elevados. Nesta área da proteção de crianças, jovens e pessoas vulneráveis a prevenção é fundamentalíssima, pelo que gostaria de dar o meu contributo às IPSS no que à mesma diz respeito, socorrendo-me de um manual elaborado pela Cáritas Portuguesa que encontrei disponível no site[1] desta instituição católica. Limitar-me-ei a transcrever alguns tópicos de um resumo desse manual, vertido para um folheto destinado à sensibilização para esta problemática e que julgo ser muito útil, com as necessárias adaptações, para todos os dirigentes e técnicos das IPSS. As propostas são as seguintes:
1.º Assumir o compromisso de formar todos os colaboradores das IPSS numa lógica de responsabilidade e profissionalismo tendo em vista a sua realização como pessoas; Proteger crianças, jovens e pessoas vulneráveis com respeito absoluto pela sua dignidade; Responder em tempo útil e de forma adequada às suspeitas ou denúncias de abusos cometidos dentro ou fora das IPSS.
2.º Desenvolver o próprio Sistema de Proteção que disponha de mecanismos para receber e tratar eventuais denúncias e maus-tratos; Dispor de um Código de Conduta que balize os comportamentos de todos os colaboradores das IPSS; Cada UDIPSS deve ter um Conselho de Proteção ou mesmo a própria IPSS, conforme a sua dimensão, que coordene toda a atuação neste tipo de situações, promova o debate, assegure a transparência dos procedimentos adotados e promova ações de formação específicas; As Direções das IPSS terem um especial cuidado na seleção e formação dos recursos humanos e na difusão de uma cultura centrada no “cuidar e proteger”; Construir um Mapa de Riscos para identificar e corrigir erros, abusos e maus-tratos, corrigir e desenvolver medidas preventivas adequadas; Reavaliar anualmente o Sistema de Proteção e toda a atuação neste campo.
3.º Todas as suspeitas de abuso ou maus-tratos devem ser analisadas pelo Conselho de Proteção de acordo com os princípios da diligência, eficiência e salvaguarda da confidencialidade de todos os implicados, e das vítimas, em especial; O principal objetivo é garantir a segurança e apoio às vítimas em todo o processo; Sempre que possível, escutem-se as vítimas, os seus familiares, testemunhas e o suspeito, sendo os seus depoimentos reduzidos a escrito; Todo o procedimento garantirá a proteção da intimidade e dignidade de todas as pessoas envolvidas e o respeito pelo quadro legal nacional e Internacional; Para além das obrigações previstas pela lei, as direções das IPSS devem reservar-se no direito de desencadear as ações disciplinares que considerem oportunas: contra a pessoa implicada na violação da política de Proteção e do Código de Conduta da respetiva instituição; contra a pessoa que notifica, sabendo que o facto notificado é falso; Sempre que esteja em risco a integridade física ou psíquica, a liberdade da criança, jovem ou de qualquer pessoa vulnerável, devem as direções fazer as diligências necessárias e suficientes para a mitigação do perigo através do contato com as entidades oficiais.
4.º A avaliação e revisão periódica de todo o Sistema é um aspeto crucial para o enraizamento de uma cultura de cuidado e dos seus valores e para a aferição da qualidade e impacto da atuação de cada IPSS.
O folheto de que me servi para deixar todas estas sugestões colocam em realce o que, pessoalmente, já acima referi, e, dando ênfase à mesma preocupação, concluo: “Mais importante que detetar situações de abusos ou maus-tratos, é evitar que eles ocorram.”
[1] https://caritas.pt/spcj-pv/, visto em 3, de março, de 2023.
* Presidente da Confederação Portuguesa do Voluntariado. Artigo publicado originalmente no site Solidariedade.pt.
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