Portugal não deve contar com o impulso dos tradicionais ‘motores’ europeus

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União Europeia.

O crescimento económico da União Europeia (EU), principalmente depois da saída do Reino Unido, assenta em dois blocos económicos, em dois motores finamente interligados e complementares, em dois países centrais: a França e a Alemanha. Um terceiro motor que pela dimensão populacional, liderança em alguns setores industriais e centralidade geográfica poderia jogar um papel importante no crescimento da UE, a Itália, gripou já há vários anos e não se vislumbra qualquer probabilidade de recuperação no curto / médio prazo.

Por Jorge Fonseca de Almeida *

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O motor alemão, contudo, dá sinais preocupantes sinais de velhice. A sua fórmula de sucesso esgotou-se. Três problemas estruturais impedem-no de funcionar:

– a perda (voluntária? / imposta pelos EUA?) de acesso à energia barata, fornecida pela Rússia (o Nord Stream 2 constituía a grande aposta para o futuro da competitividade alemã e selaria uma aliança de longo prazo com os moscovitas);
– a decisão (voluntária? / imposta pelos EUA?) de reduzir as trocas comerciais com a China, que se traduz em menores exportações (depois de um pico em 2022 as exportações reduziram-se drasticamente em 2023 e a tendência de contração permanece);
– a viragem (voluntária? / imposta pelos EUA?) de implementar uma nova estratégia: a da industrialização baseada numa economia de guerra.

A perda do seu mais importante fator competitivo, do seu maior mercado e uma reestruturação violenta levaram a uma contração da economia alemã. O motor gripou. Parou. Entrou mesmo em modo de marcha atrás.

Mas como em qualquer avião moderno o voo pode prosseguir só com um motor. Mas conseguirá a França puxar a União Europeia? Dificilmente. Por um lado não tem dimensão suficiente. Mas por outro este motor também deita fumo. Um deficit orçamental gigantesco, uma dívida pública em crescendo, um atraso tecnológico grande, e as elevadas taxas de juro do Euro, condicionam a economia francesa que estagna dolorosamente para as classes populares que empobrecem a olhos vistos.

Neste contexto, Portugal prossegue a sua trajetória de corrida para os últimos lugares da União Europeia em termos de PIB per capita, com uma política exageradamente dependente do turismo (uma indústria que empobrece quem nela aposta) e de exportações maioritariamente feitas por empresas estrangeiras. Os fundos colossais do PRR e um crescimento da força de trabalho tem impulsionado o PIB cujo crescimento contudo não ultrapassa os níveis anémicos do que se considera estagnação. Um crescimento económico inferior ao crescimento do emprego mostra que a produtividade do trabalho está a diminuir. O que, naturalmente, não augura nada de bom, mas que se compreende no quadro da expansão do turismo (indústria de mão-de-obra intensiva e de baixos salários).

A re-industrialização com base nas indústrias de guerra / defesa não encontra em Portugal empresas nacionais fortes nesta área que possam liderar este projeto de crescimento pelo que o contributo desta estratégia europeia será necessariamente reduzido e confinado ao papel de fornecedor de mão-obra barata a empresas estrangeiras que aqui se instalem ou subcontratem PMEs portuguesas. Não devemos, pois, ir por esse caminho.

Portugal é um país arquipelágico. Tem uma enorme exposição ao Atlântico. Uma vantagem competitiva relevante de que não extraímos suficiente valor. O setor do Mar, quantas vezes confundido/reduzido ao turismo de praia, tem potencial para com os investimentos certos impulsionar o nosso país para fora da maldição da estagnação que nos atormenta desde a infeliz e pouco preparada entrada na moeda única. A construção naval, as pescas, a aquacultura, a exploração e mineração submarina, o aproveitamento da energia, o transporte marítimo, o alargamento e modernização dos portos, são subsetores importantes para uma estratégia de crescimento nacional.

Em resumo: Portugal não deve contar com o impulso dos tradicionais motores europeus, que se encontram estagnados sem que se encontrem reunidas condições que ditem a sua retoma no futuro próximo, nem deve embarcar na re-industrialização com base na indústria de guerra / defesa porque não tem campeões nacionais suficientemente fortes nesta área. Pelo contrário Portugal tem uma exposição oceânica que lhe permite traçar um caminho próprio se para isso conseguir desenhar uma estratégia coerente e sustentada canalizando para estes setores o investimento, público e privado, necessário.

* Artigo publicado originalmente no ‘Blog da Ordem dos Economistas’.

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