Ao invés, considerando o congestionamento dos terminais de contentores do porto de Leixões, que lutam contra a falta de espaço para o parqueamento de contentores e a impossibilidade de expansão da sua área seca é fundamental que o porto de Aveiro possa ser uma alternativa ou um complemento, pois o recurso a um terminal congestionado é sinónimo de custos acrescidos para as mercadorias movimentadas.
Por J. Pedro Braga da Cruz *
O porto de Aveiro tem evidenciado um assinalável crescimento: em 2019 movimentava 20% das cargas marítimas no norte de Portugal e 4% do norte da Península Ibérica.
No entanto as mercadorias movimentadas são produtos intermédios e peças de grandes dimensões. Estes tipos de cargas são transportados por navios fretados para o efeito e não pelos de linha regular (de transporte de contentores ou ro/ro)
E porque é que será assim? Não é seguramente pela dimensão do mercado, pois o porto da Figueira da Foz tem tráfego de contentores, com um movimento de mercadorias que é um terço do movimento do porto de Aveiro.
Ao contrário do tráfego feito por navios fretados pelos carregadores titulares da carga, o serviço regular é organizado pelos armadores, os quais colocam os seus navios a fazer viagens com um itinerário pré-definido, em termos de portos de escala e de calendário – ou seja, os serviços de linha oferecem espaço para o transporte de unidades de carga, seja contentores, seja veículos.
Disso decore que os fatores críticos para o transporte de linha regular são: o tempo de viagem, a frequência das escalas e o preço.
No modelo de análise proposto pelo porto de Valência (que aqui adotamos como referente) e que procura ter em conta a perspetiva dos armadores, ou do navio, toma-se o tempo de escala, ou seja, o período de tempo compreendido entre o momento de chegada do navio à proximidade do porto e o momento em que abandona a área deste, como determinante da “qualidade do serviço portuário”, sendo que a competitividade de um porto será tanto maior quanto maior for o rendimento da operação de carga e descarga e da minimização das operações acessórias, como manobra de (des)amarração do navio e da pilotagem.
Para estes critérios o porto de Aveiro encontra-se em linha com o que os portos de dimensão equivalente oferecem. Mas o fator que realmente mais penaliza o tempo de escala fortemente acrescido pelo tempo de espera para entrar e sair do porto em segurança.
O troço final da ria tem velocidades de corrente de maré elevadas que atingem valores de 4 nós na enchente e de 6 nós na vazante. Para termo de comparação, fora da barra e até cerca de 3 milhas da costa a corrente é sul, não atingindo valores superiores a 1 nó.
O nível da maré aumenta e diminui segundo uma variação graficamente traduzida por uma curva sinusoidal, e as condições favoráveis do ponto de vista de navegação ocorrem numa janela temporal limitada, em torno do momento de inversão da maré.
Nestas condições podem ser impostos tempos de espera significativos, situação que é agravada por as marés irem ocorrendo de dia para dia sempre a horas diferentes.
Assim, porque é afetado pela irregularidade do tempo de espera a escala seria variável, ainda que previsível, pois as marés são previsíveis esta uma condicionante que desfavorece o porto de Aveiro perante as alternativas na sua proximidade, e designadamente o porto de Leixões.
Mas, ao invés, considerando o congestionamento dos terminais de contentores do porto de Leixões, que lutam contra a falta de espaço para o parqueamento de contentores e a impossibilidade de expansão da sua área seca é fundamental que o porto de Aveiro possa ser uma alternativa ou um complemento, pois o recurso a um terminal congestionado é sinónimo de custos acrescidos para as mercadorias movimentadas.
Contributos a ter em conta para o aumento da competitividade do porto de Aveiro
É, pois, necessário estudar como se pode reduzir a velocidade da corrente de maré no porto de Aveiro, quiçá revertendo parcialmente as modificações introduzidas nos anos 80, alargando as secções de escoamento definidas pelos diques de guiamento então construídos.
Deve-se sublinhar que a entrada para os cais do setor norte do porto de Aveiro se faz na zona de confluência dos canais de Aveiro e de Ovar do que resulta que a manobra de passagem do canal para a doca obriga o navio a ficar exposto lateralmente à força da corrente, que o empurra contra as retenções laterais da embocadura – sendo esta, obviamente uma situação crítica para a segurança.
Naturalmente que da beneficiação das condições de navegação comercial não poderão resultar desequilíbrios para a Ria no seu todo.
Ao se pretender limitar a velocidade da corrente de maré, será de esperar uma redução do prisma de maré e da amplitude desta, aproximando o regime das condições anteriores às obras referidas. Com a redução do volume do prisma de maré é de esperar uma atenuação na renovação da água, particularmente sentida nas zonas da ria mais afastadas da barra.
Um outro contributo para a competitividade do porto é a melhoria da ligação ferroviária.
De acordo com a perspetiva das Infraestruturas de Portugal as intervenções a que a linha da Beira Alta está a ser submetida irão permitir elevar de 16 para 67 o número diário de comboios de mercadorias.
Para além disso, cada comboio poderá passar a transportar mais carga. As intervenções a que a Linha da Beira será sujeita envolvem a construção da concordância com a Linha do Norte na Pampilhosa, reabilitação de túneis e de pontes, alteração de estações para permitir o cruzamento de comboios com 750 metros.
Com as condições de operação resultantes da renovação da Linha da Beira Alta espera-se uma redução do custo do transporte ferroviário de cerca de 40%.
Ou seja, se na configuração atual o hinterland (plataforma logística) dos portos do norte alcança Salamanca, com as os aumentos de competitividade e inteligente articulação desses mesmos portos – designadamente do de Aveiro e Leixões -, ess plataforma poderá alargar-se permitindo disputar o mercado de Valladolid e aproxima-la do grande mercado da região de Madrid.
Procurei sintetizar (alguns d)as necessidades de desenvolvimento do porto de Aveiro e das oportunidades que a sua articulação com o de Leixões e o uso da melhoria do Corredor Internacional Norte – que inclui a Linha da Beira Alta –, lhe podem trazer enquanto poderoso recurso do setor económico do noroeste peninsular.
Coisas que se espera constituam objeto de ponderação atenta e ação determinada: é que são interesses da região e do país.
* Engenheiro, ex-presidente do Porto de Aveiro, membro da PLATAFORMAcidades – grupo de reflexão cívica, [email protected]
“No pós-Autárquicas 21” é uma iniciativa que retoma a “Agenda Cidadã 2030” identificando os desafios que se colocam aos cidadãos e às entidades capazes das respostas necessárias à melhoria sustentada da nossa vida coletiva.