A decadência do sistema liberal, devido ao seu desinvestimento social em benefício do negócio privado, permitiu que a extrema direita tenha vindo a crescer nos últimos anos.
Por Ernesto Oliveira *
Não como uma alternativa ao que já existe, mas como uma uma resolução dogmática do problema, que na verdade visa em acentuar ainda mais as desigualdades e garantir o sistema. Aproveitando-se das minorias mais fragilizadas, que menos segurança e direitos têm na sociedade, constrói um discurso onde as diferenças são um problema. O que é falso, sabe-se que quem acumula milhões e biliões, seja em que moeda for, é quem cria o emprego precário, a mão de obra barata e uma sociedade injusta. Caso contrário seria impossível fortunas tão exageradas.
Hoje em dia 1% da população tem cerca de metade da riqueza do mundo. Enquanto 71% da população tem cerca de 3% da riqueza. O problema não se fica pelo trabalho mal pago. Sabe-se também que cerca de um décimo da população mais rica é responsável por metade das emissões poluentes mundiais. Enquanto cerca de metade da população, a metade mais pobre, é responsável por um décimo das emissões. Um sistema desigual, onde quem tem mais poder enriquece com as injustiças.
O esquema do lucro é o esquema de exploração mais básico do sistema liberal. Ele é um exemplo de como se enriquece com injustiças. Veja-se algo em concreto nos EUA, relacionado com a indústria de fast-food. Por cada dólar gasto em chicken wings, apenas dois cents vão para os trabalhadores. Não se coloca a questão de o restante dinheiro ser para a reposição de stock ou gastos de manutenção, uma vez que os donos da indústria acumulam riqueza na casa dos biliões de dólares.
Em Portugal não é diferente. Enquanto pagam salários escassos a quem trabalha, os 5 mais ricos acumulam cerca de 10 milhões de euros. O caso torna-se mais grave quando a EDP, que deveria ser um serviço para a população e não uma fonte de riqueza para um punhado de pessoas, ainda no ano passado distribuiu cerca de 700 milhões de euros pelos seus acionistas. A par disto, grande parte das empresas mais lucrativas não pagam impostos em Portugal, como é o caso do grupo PSI20, que ainda em 2019 distribuiu mais de 2 milhões de euros pelos seus acionistas.
A pandemia do COVID-19 veio expor ainda mais a situação. Enquanto os bilionários aumentaram a sua riqueza em cerca de 10 triliões de dólares, estudos demonstraram que o resto da população poderá levar mais de uma década a recuperar da crise causada pela pandemia. Neste contexto, as empresas aproveitaram o desespero dos trabalhadores para impor situações que trariam mais lucro, cortando direitos e aumentando a carga laboral. Em Portugal, também muitas pessoas perderam os seus rendimentos ao mesmo tempo que o governo português põe Portugal em terceiro na lista dos países da zona Euro que menos investem no combate à crise causada pela pandemia.
A situação está à vista, e é difícil mudar um sistema quando quem beneficia dele é dono de quase todos os recursos e infraestruturas. Para quem estuda ou trabalha é passada uma imagem de individualismo e competição, que nos mantém distraídos daquilo que poderia ser o coletivo e a igualdade. No entanto, ainda por mais longínqua que a mudança pareça estar, não nos esqueçamos da inesperada Grândola Vila Morena. Sempre conscientes que a luta antifascista, a luta feminista, a luta LGBT, a luta antiracista, a luta climática, as lutas pelos direitos e igualdade não são desligadas da luta anticapitalista. A organização de quem luta por uma sociedade melhor foi crucial em todos os momentos da história assim como o é agora.
* Militante do Bloco de Esquerda, Aveiro.