Para uma nova vida cultural

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Teatro Aveirense.

É preciso fomentar a participação de todos, ouvir e compreender as angústias e desilusões acumuladas, e encontrar novos estímulos mobilizadores, e naturalmente reforçando os meios em seu auxílio.

Filipe Guerra *

A Constituição consagra o “desenvolvimento cultural da população, a democratização do ensino e da cultura são objectivos constitucionais cujo cumprimento cabe ao Estado”. Simultaneamente ao projecto constitucional, os sucessivos governos de PS, PSD e CDS cortaram verbas e apoios consecutivamente, alijando responsabilidades governativas entregando-as às autarquias locais. Quando não a entidades privadas que no sector encontraram oportunidades de negócio, elitizando-o e reduzindo-o a critérios progressivamente mais económicos e culturalmente inúteis.

No caso de Aveiro, além do desinvestimento público do Estado central, deu-se o aberrante movimento da maioria local PSD/CDS de desclassificar o Museu Nacional Santa-Joana para apenas municipal, o que foi conseguido. Naturalmente não se verificando até hoje qualquer melhoria na oferta cultural, para lá de um ou dois “acontecimentos” meramente propagandísticos e distantes da população.

O ambicioso projecto de elevação de Aveiro a “Capital Europeia da Cultura” tem sido apresentado(e vindo a ser dotado de meios materiais e humanos) como um objectivo camarário. Ora, não havendo a tal ambição qualquer oposição objectiva e de fundo, cumpre no entanto perceber quais os objectivos deste projecto e quais as suas etapas intermédias. Ou seja, se a “Capital Europeia da Cultura” é um objectivo em si mesmo ou se será o corolário de um processo cultural de progresso e de participação, quer da população ou da miríade de agentes do sector.

A realidade actual de Aveiro não é positiva, na esmagadora maioria, as associações e colectividades batem-se com crónicos problemas de subfinanciamento, de ruína das infraestruturas, escassa participação, e muitas vezes também de sentimentos de desesperança apenas ultrapassados pela vontade férrea e militante entrega associativa dos homens e mulheres que resistem no dia-a-dia.

É preciso fomentar a participação de todos, ouvir e compreender as angústias e desilusões acumuladas, e encontrar novos estímulos mobilizadores, e naturalmente reforçando os meios em seu auxílio. É importante ter claro que a vida cultural do Concelho não se contabiliza na miríade de festivais, concertos ou ciclos, mas sim pela participação popular, uma participação não apenas espectadora mas igualmente participativa e criativa.

A Cultura é uma componente imprescindível do desenvolvimento económico e social de um território, é factor de soberania e ampliação da democracia, e em Aveiro é urgente despertar valores, referências e raízes patrimoniais, favorecendo a liberdade criativa, o pluralismo artístico e cultural e o confronto de diferentes correntes.

* Jurista, eleito do PCP na Assembleia Municipal de Aveiro.