Os edifícios das estações da CP da Granja, de Aveiro (antiga) e de Ovar foram, em Portugal, os três primeiros cujas fachadas foram decoradas com painéis de azulejos, todos eles da autoria da dupla de ceramistas aveirenses Licínio Pinto e Francisco Pereira, e executados na Fábrica da Fonte Nova, em Aveiro, entre os anos de 1914 e 1919.
Por Cardoso Ferreira | [email protected]
As estações da CP da Granja, de Ovar e de Aveiro (antiga) são o destino deste roteiro que tem nos comboios urbanos do Porto o seu meio de deslocação. O itinerário pode ter início em qualquer destas estações, começando o nosso na estação de Aveiro.
Ainda que se trate de uma viagem para conhecer a azulejaria artística da autoria de Licínio Pinto e de Francisco Pereira que decora as fachadas exteriores dessas três estações, podemos aproveitar para apreciar, no moderno edifício da estação de Aveiro, o painel que retrata o parlamentar aveirense José Estevão, da autoria de Marcos Muge, aí colocado em abril de 2018.
Estação e praia da Granja
Depois de obtido o bilhete para a Granja, embarcamos num dos comboios “urbanos do Porto” que circulam entre as cidades de Aveiro e do Porto. A chegada à estação da Granja é antecedida pelo troço que cruza os areais da praia a norte da cidade de Espinho.
Na segunda metade do século XIX, a Granja era uma praia muito procurada pelas elites económicas e intelectuais, motivo pelo que logo após a inauguração do troço entre Vila Nova de Gaia e Estarreja da Linha do Norte, ocorrida no dia 8 de julho de 1863, aí foi estabelecida uma estação para servir a Praia da Granja. No entanto, o atual edifício da estação foi concluído em finais de 1914, tendo sido decorado pelos artistas Licínio Pinto e Francisco Pereira, com cerca de 7.700 azulejos da Fábrica Fonte Nova, tanto de padrão como figurativos de grande valor estético, cultural e histórico. Esta foi a primeira estação portuguesa decorada com painéis de azulejos.
No piso térreo encontram-se os painéis figurativos que representam espaços, figuras, monumentos, tradições e trabalhos campestres, enquanto no piso superior, e obedecendo à estética Arte Nova que então estava na moda, impera a decoração por frisos e painéis, com elementos inspirados na natureza, tendo os autores criado um estilo muito próprio, não só pelos motivos vegetalistas que usaram – lírios roxos em fundo amarelo -, mas também pelas cores, com predomínio do verde, roxo, amarelo e rosa.
Assim, no piso inferior encontramos 18 painéis, que retratam temas muito diversos, como:
Castelo de Leiria
Azenha no Tâmega
Coimbra – Universidade
Trecho da Ria de Aveiro
Estrada do Furadouro – Ovar
Moinho – Arredores de Aveiro
Palácio Hotel do Bussaco
Sintra – Palácio da Penha
Convento de Cristo – Tomar
Sintra – Castelo dos Mouros
Torre de Belém
Palácio Hotel do Bussaco
Sé Velha – Coimbra
Ponte romana – Condeixa
Ruínas do castelo dos templários – Tomar
Campanário – Batalha
Fachada do Mosteiro da Batalha
E ainda um painel sem título, mas representativo de vegetação marinha da Ria de Aveiro.
No piso superior, e para além da temática floral, está um friso com embarcações antigas e o grande medalhão com o topónimo da estação.
“A mais graciosa, a mais fresca, a mais asseada das estâncias balneares”
No seu folheto “Praias de Portugal”, o escritor Ramalho Ortigão, frequentador habitual da praia da Granja, considerou essa praia como “a mais graciosa, a mais fresca, a mais asseada das estâncias balneares de recreio do nosso país”.
Na segunda metade do século XIX, e principalmente após a inauguração da estação e do caminho de ferro, a praia da Granja recebeu veraneantes ilustres, entre os quais o rei D. Luís, a rainha D. Maria Pia e seus filhos, o rei Carlos que se hospedava numa casa que ainda existe próximo da estação, o herói militar Mouzinho de Albuquerque, nobres como os condes de Resende, os escritores Ramalho Ortigão, Eça de Queirós, Oliveira Martins, Antero de Quental e Guerra Junqueiro, entre muitos outros. Mais tarde, a escritora Sofia de Mello Breyner Andresen era outra frequentadora dessa praia, que a inspirou para alguns dos seus poemas.
Em ambos os lados da linha férrea, e entre esta e o areal da praia, deparamos com luxuosos “chalet” e grandes moradias, algumas infelizmente já com acentuados sinais de degradação, representativas dessa época áurea da praia da Granja.
De regresso à estação, é altura de prosseguir viagem com destino a Ovar.
Estação e cidade de Ovar
Depois de deixarmos para trás as estações e os apeadeiros de Espinho, Silvalde, Paramos, Esmoriz, Cortegaça e Maceda, chegamos à estação de Ovar, a terceira estação portuguesa decorada com painéis de azulejos, pintados entre 1917 e 1919 por Licínio Pinto e Francisco Pereira, e executados na fábrica Fonte Nova, em Aveiro.
Ao contrário do que aconteceu nas estações da Granja e de Aveiro, para as quais esses dois artistas aveirenses criaram painéis que retratam monumentos e paisagens de vários lugares do país, na estação de Ovar Licínio Pinto e Francisco Pereira inspiraram-se nos cenários campestres das fotografias de Ricardo Ribeiro e António Ribeiro.
No presente, só a fachada da estação virada para a rua é que apresenta os painéis originais, da autoria de Licínio Pinto e de Francisco Pereira, uma vez que os painéis originais que estavam colocados na fachada virada para as linhas (gare) foram retirados (encontrando-se dois deles no Museu de Ovar), e substituídos por outros, inspirados em desenhos da artista ovarense Beatriz Campos, e executados por Fernando Gonçalves no ano de 1980, no Atelier Razamonte, de Vila Nova de Gaia.
Assim, nos painéis originais, os temas representados são:
Moinho nas Luzes – Ovar
O Rio da Madria – Ovar
Estrada do Furadouro no Carregal – Ovar
Arredores de Ovar
Aldeia e Capela de S. Donato – Ovar
Ovar – Açude do Casal
Lavadeiras no Lopo – Ovar
O Lopo na Madria – Ovar
Rio e ponte do Casal – Ovar
Arredores de Ovar
Arredores de Ovar – Madria
Arredores de Ovar
Paisagem vareira
Na fachada da gare, os temas dos painéis que agora se podem apreciar, são:
Barco de mar – Furadouro – Ovar
Capela do Calvário – Ovar
Chafariz da Praça – Ovar
Barco da Ria de Ovar
Arredores de Ovar
Locomotiva – século XX
Guarda de P. N.
Locomotiva – século XIX
Paisagem vareira.
Os últimos cinco são de temática ferroviária.
Um passeio pedonal
Depois da visita à estação, pode-se optar por um passeio pedonal pela cidade de Ovar, com passagem pelo parque urbano e visitas a alguns monumentos situados no centro urbano, como a Igreja Matriz, a capela do Calvário, as pequenas capelas da Via Sacra, o Museu de Ovar, o Museu da Ordem Terceira e, um pouco mais afastada, a Casa Museu Júlio Dinis, que evoca a vivência deste conhecido escritor em terras vareiras e nas quais se inspirou para alguns dos seus romances, tendo imortalizado o médico local João José da Silveira na personagem do doutor João Semana.
E regressados à estação, embarcamos rumo a Aveiro, passando pelas estações e apeadeiros de Válega, Avanca, Estarreja, Salreu, Canelas e Cacia.
Estação e cidade de Aveiro
No edifício da nova estação de Aveiro, ao lado do painel de azulejos que retrata José Estevão, subimos uma das escadarias (a pedonal ou a rolante) do lado direito até ao piso superior, para apreciarmos os painéis que se encontram no edifício da antiga estação, situado ao lado, para apreciarmos os painéis aí colocados em 1916, e que fazem desse imóvel o segundo do país decorado com painéis artísticos.
Começamos a visita pela facada Este, o seja, do lado da gare, onde encontramos os seguintes painéis temáticos, da autoria de Licínio Pinto e Francisco Pereira:
Trecho do Vouga
Pórtico da Capela do Senhor das Barrocas
Mosteiro de Alcobaça
Castelo de Santa Maria da Feira
Saída para o mar d’um barco de pesca (Furadouro)
Trecho da Ria de Aveiro
Buçaco – Monumento da Batalha
Castelo de Almourol
Igreja da Misericórdia
Medalhão do Manuel Firmino
Armas da Cidade
Ponte da Rata – Eirol
Costa Nova do Prado
Mais recente (1986), é o painel comemorativo dos 75 anos da Linha do Vouga, assinado por Breda, e executado na Fábrica Viçorzette, em Águeda.
Um pouco mais afastado, no edifício das antigas instalações sanitárias, encontram-se dois painéis, que retratam o Canal Central na cidade de Aveiro e os Palheiros da Costa Nova do Prado, datados do ano 2000, da autoria de F. Lista, e executados na Fábrica Artecer, de Vila Nova de Gaia.
Dos cais de embarque das linhas 4 / 5 consegue-se uma melhor visão dos painéis situados nos níveis superiores.
Agora, passamos para a fachada Oeste, virada para a Avenida Dr. Lourenço Peixinho, onde se encontram os painéis com os seguintes temas, retratados por Licínio Pinto e Francisco Pereira:
Medalhão de D. José de Salamanca y Mayol
Medalhão com embarcação
Medalhão com o Farol da Barra
Vindimas em Anadia
Chegada d’um Barco de Pesca – S. Jacinto
Marinhas de Sal de Aveiro
Margens do Rio Vouga
Trecho da Ria de Aveiro
Entrada do Jardim – Aveiro
Tricana em 1916 – Aveiro
A Peixeira – Aveiro
“Trecho da cidade – Aveiro”
O Pescador – Aveiro
Tricana em 1870 – Aveiro
Farol da Barra – Aveiro
Ponte do Poço de S. Thiago – Vale do Vouga
Palace Hotel Bussaco
Museu Regional – Aveiro
Aveiro nos princípios do Século XVIII
Trecho da cidade – Aveiro.
Parte das fachadas laterais estão revestidas com azulejo de padrão.
O ‘novo’ edifício da antiga estação de Aveiro
Depois de se apreciarem os painéis de azulejos, e também o bonito edifício da antiga estação, construído na década de 1910, é altura de se entrar nesse imóvel que agora acolhe um espaço de exposição e venda de produtos identitários de Aveiro (ovos-moles, sal, flor de sal, entre outros) e da região da Bairrada (nomeadamente vinhos e espumantes).
Em seguida, pode-se optar por descer a avenida até ao centro da cidade, para uma viagem de barco moliceiro pelos canais urbanos. Na cidade, sugerimos visitas ao Museu de Aveiro / Santa Joana e ao Museu da Cidade, a algumas das igrejas, com destaque para a Sé (S. Domingos), Carmelitas, Carmo, Misericórdia e Santo António / S. Francisco, e ainda ao Parque Infante D. Pedro.
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