Winston Churchill descreveu o ato de votar como o momento central da democracia: “No centro de todos os tributos prestados à democracia está o pequeno homem, que entra na pequena cabine, com um pequeno lápis, e faz uma pequena cruz num pequeno pedaço de papel.”
Por Diogo Fernandes Sousa *
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Esta descrição humilde e poderosa sublinha a força que reside num gesto aparentemente simples, mas que é, na verdade, a fundação da democracia. O voto não é apenas um direito, mas um dever cívico e um instrumento indispensável para provocar mudanças efetivas. Contudo, o voto só terá valor real se for sustentado por uma compreensão plena do contrato social, tal como teorizado por Rousseau, onde os governadores devem servir o povo e podem ser destituídos caso incumpram essa obrigação.
O ato de votar representa mais do que escolher representantes ou manifestar preferências políticas, é a expressão máxima da soberania popular. É através deste gesto que os cidadãos conferem legitimidade aos seus governantes, estabelecendo um vínculo que deveria ser de serviço e responsabilidade. Porém, o voto, por si só, não é suficiente para garantir que os governantes respeitem o mandato que lhes foi confiado. Aqui entra em cena a ideia do contrato social: os governados delegam poder aos seus representantes, mas nunca renunciam ao direito de os responsabilizar e, se necessário, os destituir. O poder, portanto, não é absoluto, mas sim condicionado pela confiança e pela obrigação de servir o bem comum.
No contexto português, muitos cidadãos sentem-se desencantados com os resultados das escolhas eleitorais, devido à perceção de que, uma vez eleitos, os governantes nem sempre cumprem os compromissos assumidos com o seu eleitorado.
A abstenção elevada é um reflexo deste desencanto, mas também uma perigosa abdicação de poder. Ao não votar, os cidadãos renunciam à sua principal ferramenta para moldar o futuro coletivo, deixando espaço para que interesses particulares ou minoritários prevaleçam.
É igualmente essencial recordar que, no espírito do contrato social, o voto não é um cheque em branco. Os eleitores têm não só o direito, mas também o dever de exigir transparência, prestação de contas e compromisso com o interesse público. Governantes que se afastam desses princípios devem ser confrontados, seja através de protestos pacíficos, exigências de responsabilidade ou, em última instância, pela rejeição eleitoral nas urnas. O contrato social é um pacto dinâmico e cabe ao povo zelar pelo seu equilíbrio.
Churchill e Rousseau, de formas distintas, convergem numa lição essencial: a democracia só funciona quando há uma interação ativa entre o povo e os seus representantes. O pequeno gesto de marcar uma cruz no boletim de voto é o início de um processo contínuo de vigilância e participação. Votar é essencial para trazer mudanças, mas só será efetivo se for acompanhado de uma cidadania consciente e exigente.
A democracia não é perfeita, mas é o melhor sistema de que dispomos para garantir a liberdade e a dignidade de todos. Para que funcione, cada cidadão deve exercer o seu direito de voto, mas também compreender que o poder não pertence aos governantes, mas ao povo. O pequeno lápis e a pequena cruz são símbolos de algo muito maior: a soberania popular e o dever de proteger o contrato social que mantém a democracia viva e funcional.
* Escritor do Livro “Rumo da Nação: Reflexões sobre a Portugalidade”. Professor do Instituto Politécnico Jean Piaget do Norte.
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