O que é um bom “emprego”?

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Foto site da empresa CHETO.

Um “bom emprego” é o que é bom tanto para a pessoa como para a empresa! Maus empregos conduzem à desmotivação, à desconfiança, e à execução das tarefas estritamente necessárias … para manter o emprego. Empresa alguma beneficia com tal perfil.

Por Arménio Rego *

Diferentemente, bons empregos estão associados a níveis mais elevados de empenhamento, dedicação, foco genuíno na qualidade dos produtos/serviços, empenho na satisfação dos clientes, e lealdade à empresa. Pensarão muitos leitores que esta é uma verdade de La Palisse que não merece sequer uma linha de discussão. Mas, infelizmente, algumas organizações são geridas como se as pessoas fossem apenas um custo, em cujo desenvolvimento não vale a pena investir e às quais importa pagar o menos possível.

O resultado é uma força de trabalho desvitalizada e muito pouco preocupada com o progresso da empresa. Não surpreende que, nesses casos, o desempenho da empresa seja modesto – e que, para melhorar os números, a gestão corte ainda mais nos “custos com pessoal”. Desenvolve-se então um círculo vicioso que, a prazo, resulta mal. Lamentavelmente, as pessoas assim geridas são encaradas com desconfiança e apodadas de “maus trabalhadores”. A gestão atribui a desmotivação à natureza preguiçosa das pessoas – mas é ela própria preguiçosa ao não compreender que a desmotivação radica, significativamente, no desenho dos postos de trabalho e suas condições.

Não estou a sugerir que todas as pessoas são naturalmente motivadas para fazer bom trabalho e atuar com responsabilidade. Mas há razões para acreditar que a grande maioria das pessoas quer ter um posto de trabalho digno e auferir salário digno que permita ter vida digna. Infelizmente, algumas organizações encaram a maioria dos trabalhadores como naturalmente preguiçosos e apenas motivados para sacar o salário no final do mês. Ao tratarem assim as pessoas, remuneraram-nas e tratam-nas mal – e estas fazem jus à “fama”. A profecia transforma-se em realidade. A expectativa confirma-se, num ciclo de mediocridade perpétua.

Escrevo estas linhas baseando-me na investigação que tem sido produzida ao longo de anos. Esta investigação é frequentemente ignorada – por vezes com culpa nossa. Como académicos, estamos frequentemente mais preocupados em publicar papers que os nossos pares leem – e não nos esforçamos suficientemente para dialogar com o mundo fora dos muros da academia.

Não despendemos tempo suficiente na tradução de conhecimento científico em mensagens entendíveis para os práticos. Um livro recente, de Zeynep Ton, professora na escola de gestão do MIT, mostra que podemos fazer mais em prol do que ela própria contempla no subtítulo do livro: como as melhores empresas facultam melhores salários, mais dignidade e mais propósito ao trabalho das pessoas. Documentação publicada no website do Good Jobs Institute, assim como um resumo do livro publicado no website do MIT, ajudam a compreender o argumento da autora. A criação de bons empregos é uma empreitada de médio-longo prazo assente em cinco pilares:

– Investir nas pessoas. Importa veicular às pessoas elevadas expectativas de desempenho, tratá-las como adultas, remunerá-las condignamente, e criar-lhes condições para a progressão na carreira. Foco e simplicidade. A organização deve manter disciplina orientada para acrescentar valor para o cliente. A gestão deve colocar-se ao serviço dos empregados da linha da frente, para que estes sejam produtivos e sirvam o cliente;

– Estandardização e empoderamento. A gestão deve escutar empregados de primeira linha e alavancar-lhes o conhecimento, o tempo e as capacidades para que eles possam, com autonomia e de modo consistente, trabalhar realmente em prol dos produtos e serviços que servem o cliente;

– Formação cruzada e transversal. É crucial combinar especialização com flexibilidade. O excesso de especialização é problemático. Mas a excessiva abrangência das tarefas também o é. O que importa é que cada pessoa seja capaz de atuar, cooperativamente, em prol dos melhores produtos e serviços prestados aos clientes;

– Trabalhar com folgas. É fundamental que as pessoas disponham de tempo para servir os clientes (em vez de “despachá-los”), não façam o trabalho apressadamente e com erros, e aprendam a melhorar. Infelizmente, para maximizar a minimização dos custos, algumas empresas cortam a-torto-e-a-direito, deixando as pessoas em estado de exaustão que se reflete em apressado e mau serviço ao cliente.

Esta abordagem só funciona se for sistémica – isto é, se contemplar os cinco pilares de modo integrado. O desafio é exigente, requer paciência e sabedoria, e não se compagina com soluções mágicas de cartilha. Se for exercido responsavelmente, pode contribuir para criar melhores empresas, desenvolver a economia e criar uma sociedade que contribua para dignificar o trabalho – todo o trabalho. Como afirmou Luther King, “todo o trabalho tem dignidade”. Precisamos de mais “idealismo pragmático”, para que um capitalismo de rosto humano prevaleça sobre uma economia que, segundo o Papa Francisco, “mata”.

* LEAD.Lab, Católica Porto Business School. Artigo publicado originalmente na revista Líder Magazine.

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