O irracional das freguesias de Aveiro

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Junta de Freguesia de Eixo-Eirol (Aveiro).

Com a assinatura do memorando da Troika em 2011 pelo governo do Partido Socialista, foi realizada em 2013 uma reorganização das freguesias, conhecida pela “lei Relvas”, com o objetivo de melhorar a eficiência, em Aveiro reduziu de 14 para 10 freguesias.

Por Miguel Branco *

A verdade é que esta reforma foi uma espécie de conferência de Berlim para a divisão de África, em que era necessário agregar freguesias à pressão, olhou-se para o mapa e foi-se juntando até chegar ao número pretendido.

Em Aveiro, tal como em muitas zonas do país, fez-se o irracional, quem conhece o território sabe o quão desajustado foi agregar Requeixo, Nossa Senhora de Fátima e Nariz numa freguesia e Eixo e Eirol noutra. Já no caso de Glória e Vera Cruz esta união de freguesias não foi muito sentida por ser um território urbano, onde o papel principal é o da Câmara Municipal.

Se o leitor residir em freguesias urbanas é normal não dar importância a esta questão, é natural que não o compreenda, que o menospreze, que pense que se trata de “bairrismos”, que diga o já habitual: “mais freguesias, mais tachos”, como se querer o poder e o processo de decisão perto da população fosse bairrismo ou como se ser autarca numa freguesia rural fosse algum “tacho”.

A importância de uma freguesia numa zona urbana e numa zona rural são completamente diferentes. As freguesias nas zonas rurais são o garante do desenvolvimento destes territórios, são quem conhece melhor as características do território e da sua população e por isso têm uma melhor capacidade de decisão.

Num território com uma zona urbana e uma zona rural, é normal que a atenção do poder autárquico tenha foco nas zonas urbanas e menospreze as zonas rurais, é normal.

Se nos últimos anos houve algum aumento dos investimentos públicos nas freguesias em Aveiro, deve-se ao facto de a Câmara Municipal ter entrado numa fase bastante positiva, não se deve à fusão das freguesias, sendo que até, na minha opinião, freguesias mais pequenas saberiam aplicar com maior eficácia estes investimentos.

Pegando no exemplo de Eixo e Eirol, podemos ver uma freguesia com uma zona dormitório da cidade de Aveiro como é Azurva, em Eixo, e na mesma freguesia uma zona rural como é Eirol, com características completamente diferentes da zona referida anteriormente. Como é que uma freguesia que tenha uma zona urbana, e uma zona rural consegue fazer um plano de desenvolvimento da freguesia se as necessidades no seu território são completamente díspares? Não é possível, não podemos resolver os problemas das zonas rurais com as políticas das zonas urbanas, como erradamente tem vindo a ser feito por todo o país impulsionado por estas uniões de freguesias.

A verdade é que um estudo realizado por investigadores do ISEG, concluiu que esta reforma não se traduziu num aumento de eficiência nos serviços prestados à população na região centro, tal como na esmagadora maioria do país. Esta fusão de freguesias trouxe graves problemas, como a perda de proximidade do poder e processo de decisão à população, a homogeneização das culturas e perda da identidade local, problemas a nível de representatividade da população, a supremacia das freguesias com mais eleitores e a deterioração da qualidade dos serviços de gestão de uma localidade.

Por esse motivo, o Parlamento aprovou uma nova lei-quadro com um regime transitório para criação, modificação e extinção de freguesias. É a oportunidade de olhar para o mapa das freguesias do nosso concelho e refletir, olhar para a freguesia de Requeixo, Nossa Senhora de Fátima e Nariz e a freguesia de Eixo e Eirol e ver se fazem algum sentido.

Na minha opinião, de quem conhece o território, de quem viu o antes e depois da fusão das freguesias, este mapa é completamente irracional. Noutros concelhos este assunto já está em cima da mesa, e Aveiro não pode ser exceção. Numa altura que se fala tanto, e bem, em descentralização, não se compreende centralizar o poder em uniões de freguesias, tendo em conta que, quanto mais perto o processo de decisão está da população, mais a decisão será benéfica para essa população.

Este assunto não deve servir como arma política, não deve servir para fazer campanhas eleitorais como vimos nas autárquicas por parte de uma coligação. É uma discussão que não pertence a partidos, a movimentos ou a individuais, é uma discussão que tem de ser feita pelas populações das freguesias agregadas e os órgãos eleitos.

Para concluir, as freguesias só fazem sentido perto das populações, o poder e a decisão só é eficiente perto das populações. Está na hora de mudar o mapa das freguesias de Aveiro.

* Vogal na Assembleia de Freguesia de Eixo e Eirol. Licenciado em Geografia pela Universidade de Coimbra e mestrando em Planeamento Regional e Urbano na Universidade de Aveiro.

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