Novo Ano, novos e exigentes desafios para as IPSS

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IPSS.

Antes de mais quero desejar, para 2023, todo o bem aos atuais e aos próximos Órgãos Sociais da Confederação Nacional de Instituições Sociais (CNIS), assim como a todas e todos que compõem a rede das IPSS, em Portugal. Ao iniciar um novo ano, partilho com os dirigentes das IPSS os novos e exigentes desafios que poderão ter de enfrentar. Não me irei referir às dificuldades decorrentes dos aumentos, imprevisíveis, dos preços de determinados bens. Isso já o estais a sentir, por isso, não é novo. Nem aos valores dos aumentos salariais que pensáveis fazer. Compensar, o mais possível, os colaboradores/as é um dos maiores investimentos, pois são a mais-valia que uma instituição, como qualquer empresa, pode ter.

Por Eugénio Fonseca *

Para este ano, o novo e exigente desafio que considero mais relevante é a transferências de algumas competências do poder central para o poder local. Uma parte significativa delas é nos domínios sociais, educativos e da saúde. Em algumas das áreas destes domínios grandes transformações se podem vir a operar na cooperação das UDIPSS e de cada uma das IPSS com os seus Municípios. Julgo que seria de grande sensatez política, que se fizessem duas ou três experiências piloto, por distrito, durante um a dois anos, para, a partir da realidade, se limarem arestas do que se viesse a verificar menos exequível.

Mas será sempre uma adaptação complexa. É certo que vivemos num Estado democrático, há quase 50 anos. Em termos de organização política, sabemos que não é um regime perfeito, mas que, de entre todos os que a humanidade já conheceu, é o menos mau. Por isso, meio século é pouco tempo para se saber como viver, com autenticidade, em democracia e em liberdade. Tudo se tornou mais difícil quando estes dois valores humanos se deixaram amolgar por uma civilização individualista, em que o interesse dos outros é secundário; o diálogo é substituído por radicalismos; as percentagens valem mais que as pessoas; a liberdade divorciou-se da responsabilidade, e ser livre é um aceder imediatista ao que se almeja.

A forma de fazer política encaixou-se nesta cultura predominante e até lhe tem aberto novos caminhos. Por isso, a construção do bem comum nem sempre é prioridade, pois ela não mostra resultados imediatos. Nesta forma perversa de fazer política, também não lhes convém apoiar, aprovar, permitir que sejam outros a executar, mesmo que as iniciativas sejam válidas para o bem-estar das populações, pois é importante que sejam os que estão a governar a serem os protagonistas de tudo o que for em favor do povo. Tanto na primeira situação como na segunda, o importante são as eleições seguintes. Esta forma de ação política desculpa-se com a maioria dos votos dados pelo povo que dão legitimidade a determinado partido político para governar. É a exaltação da democracia representativa. Todavia, já se deveria ter feito um debate, verdadeiramente democrático, ou seja, cuja metodologia não deixasse nenhum eleitor de fora, para se saber porque persistem níveis tão preocupantes de abstenção. É que quanto maior fosse a base de apoio popular, maior seria a legitimidade dos governantes. Também não se pode esquecer que tão importante é a democracia representativa como a participativa. Esta última não se esgota nas intervenções que os partidos eleitos têm no hemiciclo Parlamentar. Essas asseguram, de forma persistente, uma vigilância sobre quem governa. Mas até seriam mais assertivos se contactassem, regularmente, com as realidades concretas da vida dos seus concidadãos e pelo diálogo democrático, consensualizassem medidas que são, notoriamente, favoráveis ao povo e não se opusessem só por razões de contrapoder.

Esta minha leitura da forma de fazer política em Portugal, aplica-se ao poder central e ao poder local, mas este é onde melhor se pode exercer a democracia. Ele beneficia de um recurso muito importante que é o da proximidade com os cidadãos. Aliás, sem o poder local a democracia não seria possível, enquanto organização política. Os Municípios e as Juntas de Freguesia têm todos os ingredientes para a existência de governos democráticos. Há evidências disso, como sejam a elaboração dos orçamentos participativos, entre outras. Os eleitores, exceto nas grandes metrópoles, conhecem os seus eleitos, os cidadãos podem intervir nas assembleias ou serem recebidos pelos presidentes e autarcas, estão providos de organizações de base, sejam de carater civil ou religioso, etc. Sabem que é fundamental aplicar o princípio da subsidiariedade. Porém, nem em todas as autarquias é assim.

Por isso, o relacionamento entre Municípios que adiram à transferência de competências e as IPSS pode ser um novo desafio ou não. Seja como for, há critérios que têm de ser, escrupulosamente, respeitados: Acredito que já assim foi feito, mas em tudo o que diga respeito às IPSS, o pronunciamento das suas legítimas representantes é uma obrigação incontornável; todos os procedimentos têm de mostrar evidências de inegável transparência; a avaliação de propostas apresentadas às autarquias deve ser feita por equipas que assegurem imparcialidade; os prazos de candidaturas, o decorrer e conclusão das mesmas têm de ser publicadas no sítio oficial do Município; não devem ser aprovados regulamentos sem o parecer prévio da UDIPSS; enquanto as IPSS tiverem respostas para os problemas sociais ou educativos o Município não deve criar outras sob a sua gestão.

Não conheço o que já está determinado quanto a esta matéria. O que pretendi, foi dar o meu modesto contributo para que a relação entre as IPSS e o poder local, em vez de um desafio se torne numa oportunidade de maior consolidação dos valores democráticos e da vivência da liberdade no nosso país. Eles foram-nos dados numa madrugada, mas, facilmente, nos podem ir sendo roubados nas noites dos nossos fundamentalismos que nos possam impedir de cooperar com liberdade e democraticamente.

* Presidente da Conferência Portuguesa do Voluntariado. Artigo publicado originalmente no site Solidariedade.pt.

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