No Dia da Mulher, um olhar pela comunidade piscatória da Murtosa, no distrito de Aveiro. A presença de “várias dezenas de pescadoras”, muitas delas profissionais, é considerado caso único, pela sua expressividade, num sector que em Portugal é ainda muito dominado pelo homem.
O dia-a-dia da pesca no feminino é feito de alegrias e tristezas. “Brincamos, cantamos, mas também choramos. Com a onda da ria não se nota a gente a chorar”, disse Domingas Brandão.
Mãe e avó é uma das pescadoras profissionais mais antigas da praia da Torreira. Desde os 19 anos que encontra na Ria de Aveiro ajuda para sustentar a família Arrais. “Já andou muito tempo sozinha e era a única” no barco a pescar com as artes artesanais. Agora trabalha como mariscadora. “Há mais mulheres a pescar na nossa zona porque não temos fábricas”, constata. Domingas Brandão volta a terra a meio tarde, “às vezes com 20 quilos de berbigão, outras nem isso”.
Sem alternativas de emprego, há cada vez mais mulheres a recorrerem à actividade piscatória a par dos maridos e filhos, apesar da falta de marisco e peixe na laguna. E são as primeiras a sentir o desânimo dos homens quando “a pesca é pouca” e falta rendimento. “Ainda começam a ralhar connosco, ficam chateados”, conta Vivelinda.
No regresso de mais um dia de pesca ou apanha de bivalves, a mulher tem pela frente outra jornada, a vida doméstica. “Então não custa?! Chegamos cansadas. Nem apetece ir para casa, tratar dos filhos. Isto é difícil”, conta Andreia Caravela, de 39 anos.
Embora com alguma relutância, os homens foram aceitando a presença feminina na faina. “Têm a carta de arrais, cédulas marítimas. Antigamente não se via nada disto. Eu prefiro que ficasse em casa, deixava-me mais descansado. Mas é a vida”, disse um pescador que tem como braço direito a esposa.
Com muitos maridos ausentes na pesca do arrasto ou longínqua, são as mulheres da Torreira que assumem o leme da actividade piscatória.
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