Moliceiros: a “mina de ouro” em Aveiro

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Canal de São Roque, Aveiro.

A atividade turística em Aveiro, especialmente o negócio dos passeios marítimo-turísticos nos célebres moliceiros, tem conhecido uma expansão fulgurante na última década. Quando o atual presidente da Câmara Municipal, Ribau Esteves, tomou posse em 2013, as estatísticas apontavam para apenas 100 mil viagens anuais, a um preço de apenas 3 ou 4 euros por trajeto.

Por Francisco Albuquerque *

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Hoje, o cenário não podia ser mais diferente: são cerca de 1 milhão e 200 mil pessoas a embarcar anualmente nestas viagens, pagando 15 euros cada uma, como o próprio fez questão de relembrar numa recente entrevista à Rádio Terranova, o que perfaz 18 milhões de euros de receita por ano para os operadores. Um verdadeiro salto quantitativo e financeiro que confirma o potencial turístico de Aveiro e o fascínio que os seus canais continuam a exercer sobre visitantes nacionais e internacionais.

No que respeita ao licenciamento destes passeios, os valores também têm sido tudo menos estáticos. Há cinco anos, a Câmara Municipal de Aveiro colocou em hasta pública os direitos de exploração por 1,25 milhões de euros, mas a arrematação final chegou aos 5,4 milhões. Já na mais recente hasta pública, ocorrida no final de 2024, o valor base de licitação foi de 3 milhões de euros, enquanto o resultado final se fixou em 9,6 milhões. Um disparar impressionante, possível de explicar, em parte, pela estratégia de lançar um preço de licitação relativamente baixo para atrair mais concorrentes, acabando por gerar um leilão aceso que inflaciona o valor final. Contudo, não deixa de ser, no mínimo, curioso que se inicie um leilão por apenas 3 milhões de euros para uma conceção de 5 anos quando se estima que a operação gere anualmente 18 milhões de euros em receitas para os operadores com tendência para aumentar ainda mais — e, de acordo com alguns, margens de lucro brutais. Nem sequer é claro se esse volume de receitas permanece efetivamente na região, pois não há garantias de que parte substancial não escape para interesses externos.

Segundo o próprio executivo municipal, o objetivo de canalizar o montante arrecadado seria a execução de várias obras: a infraestruturação dos terrenos da antiga Lota, a construção de uma segunda ponte das eclusas e a criação de um novo lago na extensão do Canal de São Roque. No entanto, após o fecho da hasta pública por um valor muito acima do que se antecipava — ultrapassando 9,6 milhões de euros —, pouco ou nada se soube sobre o reforço destes projetos ou a afetação de mais recursos para outras intervenções complementares. O silêncio e a aparente opacidade deixaram no ar um conjunto de interrogações: terá a autarquia intenção de alargar o investimento nas obras? Será o valor remanescente alocado a outras necessidades prementes da cidade? Ou cairá no esquecimento, deixando os munícipes sem respostas claras?

A verdade é que, ao observar o negócio dos moliceiros, é difícil não falar em “mina de ouro” para quem o explora. Aveiro tem conhecido um boom turístico que, em princípio, deveria beneficiar não apenas os operadores, mas também a cidade como um todo, através de receita municipal canalizada para projetos estruturantes e melhorias na vida urbana. Por enquanto, resta aguardar para ver se os resultados práticos desta última hasta pública corresponderão às expetativas e se as promessas se materializarão em ações efetivas.

Afinal, numa época em que tanto se fala de transparência e boa gestão, pouco ou nada se ganha ao manter secretos os planos para um montante tão expressivo que é, em grande parte, fruto do sucesso dos canais de Aveiro, da beleza dos moliceiros e da atratividade da sua “Veneza portuguesa”, adjetivação tanto ignorante como bacoca, mas de uma eficácia e simplicidade assinalável.

* Gestor Industrial.

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