Exige-se um Governo mais sensível à agricultura, à pecuária, à floresta e ao desenvolvimento rural.
Por Pedro Rei *
Nas duas décadas transatas, Portugal continuou a tropeçar no crescimento e a empobrecer face às economias com perfil idêntico ao nosso. Exige-se mais apoio às empresas e empresários em nome individual, exige-se maior sensibilidade a quem produz riqueza e gera postos de trabalho.
À semelhança dos diferentes setores de atividade económica, Portugal tem, nos setores da agricultura, perdido terreno face às cedências que o Governo do Partido Socialista tem feito aos partidos de esquerda, ondetambém podemos incluir o PAN.
1 – Fragilidades do Ministério da Agricultura (ainda em funções)
É urgente que o Complexo Agro-florestal, readquira e possa afirmar após este ato eleitoral, a sua real importância socioeconómica e o peso político da agricultura e do mundo rural, no novo Governo.
É inconcebível mantermos no futuro um Ministério desmantelado, diminuído de funções e subalterno ao Ministério do Ambiente. Importa recuperar áreas fundamentais para o setor e para o mundo rural, como a gestão das florestas, da água e dos animais, ao que sugerimos o acréscimo da área da alimentação. Só dotado de uma estrutura orgânica capaz, poderá não só debater-se no seio do Governo, como junto das instituições comunitárias na defesa da atividade agrícola, dos agricultores e do mundo rural.
A estabilidade e previsibilidade das políticas públicas neste setor, por parte do Governo de Portugal e da União Europeia são fundamentais para conferir aos empresários agrícolas, aos agricultores e aos jovens, ânimo e arrojo para investir, criar emprego, inovar, introduzir mais tecnologia, em suma desenvolver o território, tornando-o mais produtivo, equilibrado e mais sustentável.
Necessitamos de um Governo com uma política clara, a uma só voz no que respeita à política da água e ao regadio em Portugal. A água é estruturante para o setor, queremos apenas utilizar a mínima indispensável para que Portugal e os portugueses se orgulhem de sermos cada vez mais autossuficientes a nível alimentar e podermos continuar a aumentar na exportação de produtos agrícolas onde efetivamente temos qualidade e somos competitivos.
Necessitamos de um Ministério e um Ministro(a), com força política no próximo Governo.
2 – PRR – Plano de Recuperação e Resiliência
Este plano permite ao país usufruir de meios financeiros oriundos de Bruxelas, para recuperar de forma acelerada das consequências da crise económica que a pandemia já nos causou e que vai continuar a provocar.
São exemplo: o enorme aumento dos combustíveis e da energia, o custo de todos os fatores de produção; sementes, fertilizantes, pesticidas, rações, produtos veterinários e os juros do capital. As orientações políticas para este plano deveriam ser melhoradas e introduzir medidas urgentes no apoio ao quotidiano dos qgricultores, aliviar a pressão dos custos e insistir na melhoria das nossas estruturas associativas por forma a que os agricultores possam estar mais organizados na compra dos fatores e na venda das suas produções.
O novo Governo terá ainda de equilibrar as prioridades deste plano, atribuindo mais meios a projetos de parceria entre as organizações e outras instituições, pelo seu forte elo de ligação e proximidade com os agricultores, uma vez que os investimentos e ações propostas pelo Governo do PS, apenas se focam nos organismos do Ministério, ao invés de investir, em estudos emblemáticos para o setor e em obras coletivas estruturais para o país e que possam servir diretamente os agricultores.
3 – PEPAC – Plano Estratégico da Política Agrícola Comum Desburocratização e simplificação de procedimentos, mais apoio ao investimento, à modernização e ao rejuvenescimento da população agrícola e uma clara aposta no regadio e na defesa do mundo rural são chavões presentes no documento, contudo dotados de poucos recursos para fazer face às debilidades que o setor enfrenta.
Um plano desta natureza deveria ser desenhado a pensar, nas diferentes realidades agrícolas do país, nos diferentes modelos de agricultura e nos seus agricultores. Efetivamente, o plano aborda estes temas, concordamos com o diagnóstico, mas depois a dotação para muitas das medidas é insuficiente.
Seria importante que todos os homens e mulheres do campo, jovens e menos jovens, sintam que este programa foi pensado para cada um deles, só assim teríamos um verdadeiro plano pensado para que empresários agrícolas e agricultores possam investir, criar emprego, inovar, introduzir tecnologia, desenvolver o território com sustentabilidade e aumentar as exportações.
Concordamos que o I – Pilar da PAC, possa contemplar os apoios à agricultura biológica e à proteção integrada, mas a transferência de verbas do II – Pilar (destinado ao desenvolvimento rural e ao investimento), para o I – Pilar, é um absurdo, num país a necessitar tanto de investimento, quer particular dos agricultores, quer em
infraestruturas coletivas como o armazenamento de água, caminhos rurais e produção de energia limpa alternativa para as explorações.
Podemos retirar do PEPAC que os principais instrumentos para a competitividade são os apoios ao investimento (13% do Plano Financeiro do PEPAC – PF), quer em infraestruturas coletivas quer na exploração agrícola e florestal. Espera-se que a percentagem de explorações agrícolas que recebem apoio ao investimento para se modernizarem seja de 16%, incluindo 2% em que o objeto principal do investimento é nas tecnologias agrícolas e digitais, sendo que em Portugal as explorações
com mais de 5ha são apenas 27% do total.
Estes números podem ter várias leituras, contudo destacamos a pouca ambição para o investimento, quer individual quer coletivo e não temos duvidas em afirmar que foi pensado para um universo muito pequeno de beneficiários. Ainda estamos a tempo de corrigir muitas das lacunas do PEPAC, haja vontade política.
4 – Indicadores das debilidades do setor para as quais o novo Governo deve ser mais sensível e pressionar os decisores europeus, pois exigem-se alterações:
a) Produção Nacional
Os agricultores em geral, mas em particular os jovens e os pequenos agricultores são o elo mais fraco na cadeia alimentar e, no que diz respeito à política de preços praticados ao agricultor, o Estado deve intervir sempre que as regras de mercado sejam desrespeitadas, mas também quando não for dada a devida prioridade à produção nacional.
– Produzimos 86% do que consumimos. É bom, mas não devemos recuar, pelo contrário devemos continuar a estimular a produção nacional, aumentar as exportações e promover campanhas junto dos nossos consumidores para preferirem produtos portugueses. Daí a necessidade de rejuvenescer e continuar a investir no setor.
b) Incoerências dos Programas da PAC / Programas Nacionais
– 7% dos agricultores portugueses recebem 70% dos apoios da PAC;
– Praticamente 40% dos agricultores portugueses estão excluídos dos apoios da PAC;
– Seria necessário redefinir o apoio ao RPA-Regime da Pequena Agricultura (500€, 600€, 800€ 1000€, para agora poder descer…);
– Existem zonas negras, regiões onde os agricultores praticamente não recebem apoios anuais, os denominados territórios vulneráveis;
– É inconcebível a maior fatia dos apoios anuais aos agricultores ser paga em função dos históricos referentes a 1992 (com mais de 30 anos), devíamos prever alterar este procedimento o mais rapidamente possível. A previsão do PS é acabar apenas em 2027;
– Deviam existir mais ajudas ligadas à produção, por exemplo, utilizando muito do dinheiro que o histórico ainda atribui sem qualquer justificação ou benefício, apenas porque sim…
c) Setor da Pecuária
O setor da pecuária, nomeadamente a intensiva está atualmente muito pressionada em Portugal, sendo certo que importamos mais de 50% das nossas necessidades, perguntamos quais os custos energéticos desses transportes e também climáticos devido à poluição provocada, seja o transporte de barco ou avião.
Os partidos de esquerda querem a todo o custo combater a pecuária, sob vários tipos de argumentação, contudo esta atividade é apenas responsável por 10% dos gases efeito de estufa produzidos em Portugal, mas segundo eles podemos importar carne.
Existe uma panóplia de burocracia ideológica associada a este setor, parte dela desnecessária, pelo que urge alterar procedimentos, por exemplo, no REAP, tão complexo para muitas explorações.
Relativamente aos produtores de leite de vaca, ovelha e cabra, com os aumentos assustadores de todos os fatores de produção (rações, sementes, adubos, gasóleo, mão de obra e eletricidade), e os preços da venda dos produtos produzidos, a não acompanharem os custos, muitos produtores temem pela viabilidade das suas explorações.
Não basta estar solidário, o Ministério e o Governo têm de intervir nestas situações, e simplificar a vida aos produtores.
d) Programa da Água
É incontornável captar e reter mais água, nomeadamente das chuvas. Espanha, por exemplo, tem uma capacidade de retenção de 90%, Portugal não chega aos 20%.
Não possuímos uma verdadeira gestão do ciclo da água, é necessário definir regras e procedimentos, pois a atividade agrícola e pecuária não gastam água, utilizam a água para a produção de alimentos, não sai do seu ciclo natural.
Existe um Bloqueio Ideológico no país acerca da água (associado aos partidos de esquerda e a ambientalistas), nomeadamente contra as barragens, mas também no seio do Governo que agora cessa funções, vejam-se muitas das tomadas de posição do Ministro do Ambiente.
Todo o Interior do país e algumas regiões do Litoral com excelentes áreas de produção agrícola, deveria potenciar as suas produções pelo aumento da qualidade e da produtividade através da introdução onde não existem de regadios coletivos, bem como, pela melhoria da eficiência dos regadios coletivos existentes.
É urgente redefinir o Plano Nacional do Regadio e é mais urgente acelerar os processos para colocar em execução as obras necessárias, pois da celeridade destes processos vai depender muita da produção agrícola nacional no futuro.
e) Setor da Floresta
A boa gestão da floresta deve contemplar vários serviços desde logo paisagem, biodiversidade, recursos naturais, gestão do fogo, mas também produção, emprego e economia.
A floresta tem de ser uma atividade lucrativa para os produtores, para os madeireiros e para os industriais transformadores, acentuar a riqueza deste setor pelo sacrifício do rendimento dos produtores, compromete a produção da matéria prima no futuro. Os produtores devem receber um preço justo pela madeira, bem como ser apoiados pelos programas florestais; no apoio a novas plantações, na reflorestação e na limpeza e preservação das florestas.
Portugal e o PS, não aprenderam, com as infelicidades dos incêndios de 2017? Muita legislação, nova paixão ministerial, mas muito pouca execução e ações no terreno.
31% do nosso território é constituído por matos incultos e pastagens débeis, e é nessas que o programa do PSD defende que podem ser plantados eucaliptos, sendo que 30% dessas áreas têm de ser plantadas com espécies de crescimento lento. Parece ser uma medida racional e equilibrada, acima de tudo sem fundamentalismos.
É necessário rever as políticas da floresta, e dos apoios previstos para este setor no PEPAC.
f) JA – Jovens Agricultores
Relativamente aos Jovens Agricultores, acentua-se o envelhecimento da nossa população agrícola com mais de 65 anos, 55% dos nossos agricultores têm mais de 65 anos. Em 2009, os jovens representavam 9,4% dos agricultores e atualmente são apenas 3,7%. Mais ambição, mais apoios na instalação de Jovens Agricultores e apoios diferenciados em função das características das diferentes regiões são fundamentais.
Importa lançar um programa de acompanhamento técnico aos Jovens Agricultores em fase de instalação e após a aprovação do projeto, bem como criar a figura do tutor agrícola para os Jovens Agricultores.
O acesso ao crédito continua a ser um enorme problema para o jovem investidor, pelo que deveriam existir linhas com bonificação de taxas de juro apoiadas pelo programa, facilitadoras deste entrave.
A terra não trabalhada ou não utilizada continua a ser um entrave, para poder ser utilizada por exemplo, num projeto de instalação de um Jovem Agricultor. As soluções do Banco de Terras e Bolsa de Terras, ainda não conseguiram ser solução. Deveria ser reeditado o modelo crédito PAR para a compra de terras, pois as medidas em vigor não têm grande procura.
Denota-se uma ambição muito contida no número que o PEPAC pretende atingir, na instalação de com novos Jovens Agricultores. 3500 novas adesões é manifestamente reduzido em função da imperiosa necessidade em rejuvenescer o setor.
Pede-se ao novo Governo especial atenção em relação a este tema Jovens Agricultores.
g) JER – Jovens Empresários Rurais / Desenvolvimento Rural
Os territórios rurais cada vez com menos população ativa, com poucos jovens e crianças, deixam antever o caos no ordenamento das florestas, da paisagem, o aumento de áreas incultas, o declínio da agricultura e da pastorícia, bem como o desaparecimento progressivo das atividades económicas. A resposta das populações ao avanço desta realidade é a migração para os centros urbanos, move-os a esperança de encontrar legitimamente melhores condições de vida, mas à medida que engrossam, os problemas já de si delicados com que se deparam estes aglomerados urbanos, acabam todos por perder qualidade de vida agravando-se progressivamente com o passar dos anos.
Pela primeira vez nos últimos 50 anos, a população Portuguesa registou uma perda de mais de 200 mil residentes. A população recenseada em 2021
é inferior à registada 20 anos atrás.
Importa reter que 70% da nossa população reside em 30% do território dito mais urbano, ao que acresce que 85% do nosso território é rural. Portugal tem de inverter este ciclo de desertificação e abandono sistemático dos territórios rurais e das suas gentes, todos os partidos políticos sem exceção concordam, mas chegados à governação limitam-se a anunciar medidas e até criar ministérios associados a estas causas, para depois não acontecer quase nada. Em sentido inverso nesta equação estão os autarcas que tudo têm feito para contrariar esta realidade, apetrechando as suas cidades, vilas e aldeias de condições para que as pessoas possam ter melhores condições, mas faltam programas concretos de apoio ao investimento e políticas incisivas e mobilizadoras capazes de inverter esta tendência e provocar uma “revolução” positiva de valorização destes territórios, das suas gentes e dos novos residentes, só uma verdadeira task-force composta por vários ministérios impulsionada pelo Primeiro-Ministro, poderia resolver este enorme problema nacional, transversal a outras realidades.
Importa ter bem presente que a atual responsável pelo ministério, ignorou esta figura, ou não teve força política junto do governo, para que se pudesse constituir um grupo de trabalho interministerial, capaz de lhe conferir um conjunto de medidas dentro de uma regulamentação a criar.
É tempo de separar o trigo do joio.
Pela nossa parte continuamos a acreditar que é possível lutar por Portugal, pelos Agricultores, pelos Jovens Agricultores e pelos Jovens Empresários Rurais.
* Presidente da Associação dos Jovens Agricultores Portugueses (AJAP).
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