Laura- O Musical: A Coroa de Glória de Filipe La Féria e do Teatro Politeama

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"Laura" (Imagem do Facebook do Teatro Politeama).

Era dia 22 de Novembro de 2023. Na Rua das Portas de Santo Antão, as pessoas fizeram fila para entrar no famoso e mágico Teatro Politeama para assistir a um musical de sonho e de excelência que percorre a vida e presta tributo à Mulher e Maior Atriz do século XX português, a gigante Laura Alves. Este é um sonho do Mestre Filipe La Féria tornado realidade. Segundo La Féria “Este espetáculo é uma história de amor. Não é uma biografia mas um roteiro para um grande Musical que teimei em realizar com muito amor por essa grande Mulher do Teatro que foi Laura Alves, a Rainha do Palco e a maior Atriz do século XX.”.

Por Nuno Alexandre *

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Laura Alves nasceu em 1921. Oriunda de uma família humilde, foi desde pequenina que se sentiu atraída pelos palcos. Entra em cena aos cincos anos de idade na peça “Os Vinte Mil Dólares”, na Associação Recreativa Triângulo Vermelho. Na Escola Machado e Castro a “Lalá” era conhecida por ensaiar e dirigir as suas amigas. Apesar das reprimendas, os professores e família encantavam-se com o talento daquela menina doce com olhos brilhantes e com um belo sorriso. Aos 13 anos de idade estreia-se no Teatro Profissional, na Companhia de Alves da Cunha, no melodrama francês de grande êxito “Duas Garotas de Paris”, no Teatro Politeama, em 1935. Ingressou na Companhia do Teatro Nacional, onde foi ensaiada por Palmira Bastos, nome incontornável do Teatro Português, e foi ao seu lado que interpretou a peça “Riquezas da sua avó”. Contracenou com grandes estrelas da constelação artística nacional e acabou por se tornar num dos maiores nomes do Teatro Português e do Parque Mayer. Integrou o elenco do filme português “O Pátio das Cantigas”, onde interpretou Celeste, filha de Evaristo, personagem de António Silva.

Conheceu o grande Amor da sua vida, o grande empresário de Teatro Português Vasco Morgado, por volta de 1945, na Antiga Feira Popular. Fruto dessa paixão nasceu Vasco Morgado Júnior. Divorciaram-se anos mais tarde, mas esta foi uma linda história de amor. Pela primeira vez, um homem deixou os seus negócios de família para se tornar empresário de Teatro e para construir um Teatro para a sua maior paixão. Nasce assim o Teatro Monumental, creio que era um dos maiores teatros do país, onde Laura levou a cena grandes êxitos. A peça “As Três Valsas”, inaugura o Teatro. Laura Alves foi uma artista de mão cheia. Dançava, cantava, representava. Brilhou em vários registos, passando pelo drama e pela comédia. Entregou a voz, o corpo e a alma aos palcos e ao seu público. Dizia ser uma “atriz do povo”. E foi mesmo. Durante a longa noite do fascismo, Laura foi das pessoas que mais enfrentou a censura. Ela era uma mulher livre, muitíssimo culta e irrequieta. Viajou pelo mundo, traduziu peças e levou-as a cena.

Ela chegou a ir à PIDE pedir autorização para ir à Rússia ver o Bolshoi. Tornou-se na primeira mulher a proclamar a palavra “fascistas” em palco. Este momento acontece em 1959, se não estou em erro na peça “A Rainha do Ferro Velho”, uma comédia americana de Ruth Gordon, que se tornou num dos maiores êxitos da sua carreira. A atriz lutou bastante para a peça passar na censura, e até afirmou que iria para a Avenida da Liberdade com cartazes caso a censura impedisse a peça de subir aos palcos. Outro ato de resistência deu-se durante um comício de apoiantes do General Humberto Delgado no Teatro Monumental, onde agentes da PIDE marcaram presença e perseguiram a multidão que lá se encontrava. Laura ordenou que abrissem as portas do Teatro e escondeu algumas das pessoas. Isto foi um ato de amor e de coragem! Depois do 25 de Abril, durante o PREC (Período Revolucionário em Curso), Laura e Vasco Morgado foram alvo de injustiças, tal como outros artistas. Pairavam no ar as várias ideologias, era frequente ouvir-se falar de nacionalizações, neste caso da nacionalização do Teatro; de saneamentos e de tomadas de posições por parte dos trabalhadores. No fim, o tempo encarregou-se de pacificar o país.

Nos últimos anos da sua vida, a Laura passou por momentos bastante negativos e trágicos. A doença que a obrigou a afastar-se dos palcos, as mortes de Vasco Morgado e Frederico Valério e por fim a destruição do Teatro Monumental. Um CRIME! A destruição daquele Teatro foi um CRIME! Permitam-me fazer um aparte. Tenho uma profunda admiração por Espanha e pelo povo espanhol, pela forma de como eles tratam a sua cultura e património. Eles têm orgulho na sua história e nas suas origens, sabem preservar o legado das suas glórias, criam incentivos para os jovens consumirem cada vez mais cultura. Ali ao lado, no país vizinho, é impensável fazer com um Teatro o mesmo que fizeram cá com o Monumental, com o ABC e tantos outros. O Teatro é a alma, o amor, a história e a cultura de um povo. É uma arte revolucionária! Há uma mania portuguesa de querer seguir em frente, esquecendo o passado. Isso é errado! Seguir em frente sim, mas sem nunca nos esquecermos de quem somos e de onde vimos! É a nossa história! Deve ser preservada!

Aos senhores políticos da esquerda à direita, peço que parem de destruir Teatros! Ponham os olhos em Espanha e em outros países e comecem a tratar de forma digna os artistas! Acho que faz-nos falta hoje, uma classe política mais interessada pela cultura, mais interessada em falar do setor artístico. Um povo sem cultura, um país sem cultura é um território cinzento e fechado. É um território envolto em nevoeiro, afastado da realidade, das belezas da vida, das tragédias da vida, das gargalhadas da vida, das emoções e de tudo mais. Valorize-se a Cultura e Valorizem-se os Artistas! É triste que uma mulher e grande artista como foi a Laura, uma mulher dos palcos que deu tudo a um país e à sua cultura, não tenha tido o seu merecido reconhecimento em vida.

Sobre o Musical. Assisti a “Laura- O Musical”, no passado domingo, dia 14. Fiquei mesmo junto ao palco. Pude respirar o talento e a paixão que todo o elenco nos transmitiu! A Maravilhosa Sissi Martins, que interpreta Laura Alves; o grande Rui Andrade, que interpreta Vasco Morgado; o João Frizza, que de forma extraordinária e esplêndida interpreta João Villaret; a Paula Sá, que também de forma deslumbrante interpreta a Gigante Palmira Bastos; o Luís Garcia que interpreta Paulo Renato; Filipe de Albuquerque que interpreta Frederico Valério, o último marido de Laura; o Ruben Madureira, que interpreta o ator, realizador e encenador Francisco Ribeiro “Ribeirinho” e Ruy de Carvalho; o Jonas Cardoso que interpreta o Vasquinho, filho de Laura e Vasco Morgado; a Sara Cabeleira que interpreta Milú e tantos outros atores e atrizes brilhantes integram o elenco do Musical. Amei o espetáculo. Foi o primeiro musical que vi ao vivo, e sim está ao nível do melhor que se faz na Broadway ou no West End. Houve vários momentos que me tocaram. No início do musical, aquela primeira cena tocou-me bastante. Por momentos senti a angústia que a Laura sentiu quando viu o Monumental destruído.

Depois todas aquelas belas canções me tocaram, sobretudo a canção “Estou aqui”, interpretada por Paula Sá e a canção “Quem me dera amar-te”, interpretada por Filipe de Albuquerque e Sissi Martins. Neste musical, ri, sonhei e emocionei-me. Foi um misto de emoções! Já há muito tempo que acompanho o trabalho de Filipe La Féria, e a verdade é que ele a cada novo espetáculo, seja uma Revista ou um Musical, consegue surpreender. Sempre pela positiva claro! Toda a equipa esteve muito bem! As pequenas Laurinhas, meu Deus, que talento! Estão todos de parabéns, mas tenho de destacar a genialidade do Sr. La Féria e o imenso talento da Sissi Martins e do Rui Andrade, os dois grandes protagonistas deste musical. Para fazer teatro, para estar em cima das tábuas do palco é preciso, para além do talento, ter paixão e amor pela Arte. E todas as atrizes, atores, bailarinos e toda a equipa mostraram ter amor por aquilo que fazem! Cada vez que entro no Politeama, sinto que estou a ultrapassar um portal para um mundo mágico, onde todos sonham e são plenamente livres.

Este Musical é uma homenagem a Laura Alves e a Vasco Morgado, mas também é uma homenagem a Filipe La Féria, a todos os artistas e à história do Teatro Português! Por isso deixo aqui o convite! Até dia 28, passem no Teatro Politeama e vão ver “Laura- O Musical”! Vão viajar pelo mundo da Laura e pela história do Teatro Português. É a nossa história. Não vão querer perder esta coroa de glória!

Nunca se esqueçam que caminhamos sobre os ombros de gigantes! Vivam os Artistas! Viva o Teatro!

* Estudante de Licenciatura em História na FLUC, Aveiro.

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