Será [a Igreja portuguesa] capaz de acolher esta experiência e a energia que a caraterizou e transformar em linhas de ação os desafios e apelos lançados pelo Papa?
Por Manuel Pinto *
No fecho de uma intensa semana de surpresas, descobertas, gestos e, sobretudo, muitas emoções, há que dar tempo para assimilar tudo o que aconteceu. Mas pode-se já alinhavar algumas reflexões, notas conclusivas e, igualmente, interrogações, sob a forma de palavras-chave.
Um marco
A JMJ é um acontecimento histórico. Pelos jovens que reuniu, de tantas geografias, culturas e experiências de Igreja. Mas sobretudo porque foi afirmação da vontade de uma sociedade mais solidária e justa e uma vida com mais sentido também espiritual.
Os jovens
São uma categoria que alberga grande diversidade, mas compareceram e deram sinais que renovam a esperança no futuro. Mais do que “jovens do Papa”, foram incentivados a ser “coreógrafos da dança da [sua] vida” e a surfar a “onda do amor” (não platónico nem intimista).
Acolhimento e organização
O país e a Igreja mostraram ser capazes de colaborar entre si e de organizar uma iniciativa à escala global, que é complexa e arriscada, com qualidade, funcionalidade e hospitalidade. Foi uma “sementeira” da qual se podem esperar bons frutos.
Francisco
Proximidade, pedagogia e profetismo. Por muito que faça remoer os que gostariam de passar rapidamente ao papa seguinte, este Papa está aí para centrar a Igreja nos desafios do Evangelho, atenta ao sofrimento de cada pessoa, das sociedades e do planeta.
Igreja portuguesa
Mobilizou-se e foi eficiente e eficaz. Mas isso não basta. Será capaz de acolher esta experiência e a energia que a caraterizou e transformar em linhas de ação os desafios e apelos lançados pelo Papa?
Abusos na Igreja
O Papa veio fazer o que os bispos em geral não fizeram: ir pessoalmente ao encontro das vítimas, escutá-las e pedir perdão, sem ficar por múltiplos pedidos de perdão, fáceis e impessoais. Fê-lo logo, mal chegou, no primeiro dia. E mostrou que, afinal, o tema tinha cabimento na JMJ.
“Todos, todos, todos”
É talvez a mensagem papal de maior alcance prático para a Igreja universal e portuguesa: ter portas sempre abertas a todas e a todos sem discriminar ou condenar ninguém; e não basta ficar à espera que apareçam; é necessário ir ao encontro.
Do medo ao sonho
“Não tenham medo”, não fiquem parados ou presos aos ecrãs, sejam insubmissos; sejam “produtores de sonhos”; levantem-se, sejam peregrinos e testemunhas do amor – foram os apelos mais insistentes do Papa Francisco.
Emoções
Foi uma das palavras que mais se ouviram, quer dos participantes quer dos circunstantes à espera de oportunidade para saudar o Papa. Será também dos maiores riscos desta Jornada: ficar por uma grande emoção, que se desvanece na espuma dos dias.
E agora?
Apesar da vontade confessada por tantos de que a experiência da JMJ não acabe com o seu termo, a continuidade não virá por milagre, sem trabalho árduo, sem mudanças profundas na cultura da Igreja. E Francisco deixou meia dúzia de chaves potentes para abrir essas portas.
* Editorial do jornal online Sete Margens.
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