Investimentos na rede de gás fóssil em Portugal

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Infraestruturas de gás.

A utilização da rede de gás doméstica para distribuição de gás fóssil irá manter os consumidores dependentes de um recurso que vem do exterior e com oscilações de preço sobre as quais o país não tem controle.

Por Francisco Ferreira *

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Terminou a a consulta pública promovida pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) sobre o Plano de Desenvolvimento e Investimento nas Redes de Distribuição de Gás (PDIRD-G) para o período 2025-2029. Este plano prevê investimentos da ordem dos 395 milhões de euros no reforço e expansão do abastecimento de gás fóssil responsável por emissões de gases com efeito de estufa, as quais o país não está a conseguir reduzir ao ritmo necessário para cumprir os objetivos climáticos nacionais e com que se comprometeu internacionalmente. No entender da ZERO, estes investimentos colocam mesmo em causa o cumprimento das ambições climáticas do país constantes no Plano Nacional de Energia e Clima e na Lei de Bases do Clima de redução das emissões em pelo menos 55% face a 2005, e também o objetivo de neutralidade climática em 2045 ou antes, correndo o sério risco de se tornarem investimentos irrecuperáveis.

Ademais, numa altura em que por razões de segurança é crucial diminuir a dependência energética do exterior, e em que a prioridade deve ser a eletrificação dos consumos domésticos, e não o investimento no aumento do consumo de metano poluente e importado, este plano é anacrónico. Inclusive, chega mesmo a prever, no cenário de menor procura, que em 2040 o consumo de gás fóssil se mantenha praticamente inalterado face ao presente – com este cenário, a ZERO pergunta: onde está a descarbonização?

A ZERO recorda que a diretiva europeia relativa ao desempenho energético dos edifícios (EPBD) propõe a eliminação progressiva das caldeiras independentes alimentadas a combustíveis fósseis até 2040 e, como primeiro passo, a partir de 2025 não devem ser concedidos incentivos financeiros para a instalação desses equipamentos. É absurdo investir em redes de gás para alimentar equipamentos domésticos que vão deixar de ser utilizados a prazo e cuja substituição deveria ser promovida de forma muito mais ativa por parte das autoridades nacionais junto dos consumidores domésticos e indústrias.

No entender da ZERO, os únicos investimentos necessários na infraestrutura de transporte e de distribuição de gás deverão ser dedicados à boa utilização e manutenção da infraestrutura atual e à injeção de biometano na rede quando a sua produção se encontra em locais próximos da atual rede, o que não parece ser o caso.

O aproveitamento de biometano junto a infraestruturas que o produzem na vizinhança das atuais redes de distribuição de gás não justifica o investimento preconizado na expansão da rede residencial por uma razão fundamental: o biometano deve ser prioritariamente utilizado nos processos industriais sem outra alternativa e no edificado doméstico existente com consumos de difícil ou impossível eletrificação, pelo que a expansão da rede a construção residencial nova é contraproducente.

A ZERO alerta que a utilização da rede de gás doméstica para distribuição de gás fóssil irá manter os consumidores dependentes de um recurso que vem do exterior e com oscilações de preço sobre as quais o país não tem controle. Apesar de não caber às empresas de transporte e distribuição de gás promover a eletrificação, cabe à ZERO observar que os montantes gastos em nova infraestrutura de gás, que em boa parte pagos pelos contribuintes, poderiam ser usados, com vantagem, para apoiar a compra de bombas de calor e substituição de equipamentos a gás por outros equipamentos elétricos sempre que o biometano não seja alternativa e a eletrificação seja viável.

  • A ZERO opõe-se à utilização de hidrogénio verde na rede de gás, tal como é entendimento dos autores deste PDIRD-G, seja para mistura de 20% com metano fóssil seja sob a forma de 100% hidrogénio, pelas seguintes razões:
  • Mistura de 20% hidrogénio com gás fóssil é uma abordagem de descarbonização enganadora, uma vez que a redução de emissões é de apenas 6% (porque a densidade energética do hidrogénio é cerca de um terço da do gás fóssil), sendo a eletrificação direta muito mais eficiente;
  • O uso de hidrogénio para aquecimento é um processo ineficiente, consumindo cerca de 5,5 vezes mais eletricidade do que usar a mesma eletricidade diretamente numa bomba de calor;
  • O hidrogénio verde é um recurso de baixas emissões escasso que deverá ser utilizado na descarbonização da indústria, da aviação e do transporte marítimo, onde não existe outra alternativa.

Assim, a ZERO considera que os projetos apresentados com incorporação de hidrogénio são desnecessários e sem futuro. Nesta lista estão incluídos os projetos Retrofit Project: Long Term Dercabonization Plan e H2GVillage da Floene e o SMART Hydrogen Adaptation proposto pela SONORGÁS.

Em suma, Portugal não deve promover a expansão da rede de gás fóssil, mas sim encarar a eficiência energética como um dos pilares essenciais do processo para promover a descarbonização, sendo que a eletrificação do edificado e de parte dos processos industriais que hoje consomem gás fóssil, bem como a produção de eletricidade a partir de energias renováveis, são prioritárias e fundamentais para caminharmos rumo a uma economia justa e livre de combustíveis fósseis.

* Presidente da ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável.

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