Os alunos portugueses cada vez escrevem pior e leem menos – diz-se por aí -, mas nós não concordamos! Também se diz que os responsáveis são os telemóveis, os computadores, as redes sociais. E nós voltamos a não concordar!
Por Susana Senos e Madalena Teixeira *
A nosso ver, nunca se escreveu nem leu tanto como agora e os responsáveis poderão ser, efetivamente, os telemóveis, os computadores, as redes sociais. A necessidade de contactar “o outro” parece ser a causa de, em Portugal, em 2021, haver cerca de 14 milhões de assinantes/equipamentos móveis (https://www.pordata.pt/Portugal/Assinantes+++equipamentos+de+utilizadores+do+servi%C3%A7o+m%C3%B3vel-1180 , acedido no dia 4 de janeiro de 2023) que serão utilizados não só, mas também, por crianças em idade escolar e jovens para lerem e escreverem mensagens, para lerem e escreverem (as suas) “histórias”, quer com familiares, quer com amigos, sejam eles portugueses ou estrangeiros. Resumindo, a escrita e a consequente leitura também existem fora da sala de aula.
Segundo o Instituto de Avaliação Educativa (cf. https://iave.pt/relatorios/, acedido no dia 8 de fevereiro de 2023), alunos do básico ao secundário têm obtido resultados que evidenciam fragilidades no domínio da língua portuguesa, em particular no que refere à expressão escrita. Então, o que é que está a falhar? Será que não gostam de escrever em contexto escolar? Será que não gostam de escrever, porque os temas sobre os quais têm de escrever lhes são desinteressantes? Será que “estas classificações” são o resultado da prática da escrita (apenas) para avaliação?
Se o digital é cativante, com os assuntos que destaca/releva/aborda/propicia/fomenta, se comunicar por escrito com “o outro” é interessante, por que não utilizar o digital a favor da aprendizagem e da prática dos processos de leitura e escrita? Sair da sala de aula, comunicar com outros alunos sobre temas motivantes, que são vivenciados e partilhados no dia a dia? Com efeito, as tarefas apresentadas em contexto escolar são muitas vezes “artificiais” e sem um público autêntico, estando a desmotivação para a leitura e a escrita muitas vezes associadas a estes fatores.
Cientes desta realidade, investigadores de diferentes universidades – Aveiro (UAVR – Portugal), Autonoma de Barcelona (UAB – Espanha), Dublin City (DCU – Irlanda), Stavanger (UIS – Noruega) e Twente (UT – Países Baixos), no âmbito do Consórcio Europeu de Universidades Inovadoras (ECIU), juntaram-se e construíram o projeto internacional AI Literacy Network in Primary School – AILIT -, financiado pela União Europeia (KA220-SCH-C4A7756B), com o propósito de combinar de forma eficiente a aprendizagem da escrita e o desenvolvimento de competências de literacia.
Assim, investigadores e professores de escolas parceiras, dos 1.º e 2.º Ciclo do Ensino Básico, pretendem promover a motivação dos alunos para a escrita através do desenvolvimento de uma plataforma digital, com recurso à Inteligência Artificial. A plataforma AILIT permitirá aos alunos escreverem textos na sua língua materna e verem os seus textos traduzidos e partilhados com colegas de diferentes escolas e países. Mecanismos de inteligência artificial permitirão que os alunos recebam textos adequados aos seus interesses, permitindo não só que leiam, mas que também comentem e editem textos recebidos, originalmente escritos por crianças de outra parte do mundo. Acreditamos que desta forma os alunos se sintam mais motivados não só para a leitura e escrita, mas também para descobrir outras realidades socioculturais, promovendo discussões interculturais.
O professor, figura central neste processo, uma vez que tem de garantir que os textos estão prontos a ser partilhados, verá também o seu trabalho a ser apoiado, nomeadamente através de relatórios de avaliação gerados pela plataforma. Além disso, as diferentes equipas estão a desenvolver materiais de apoio pedagógico, para o desenvolvimento da escrita, que podem ser usados autonomamente por alunos e também por professores.
Afinal os telemóveis, os computadores e as plataformas digitais não precisam de ser figuras inimigas da escrita nem da aprendizagem! Pelo contrário, se exploradas adequadamente, são potenciais ferramentas de trabalho dos professores e dos alunos.
* Docentes / investigadoras do Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF) da Universidade de Aveiro. Artigo publicado originalmente no site UA.pt.
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