Florestas: Biodiversidade, multifuncionalidade, produção sustentável e resiliência aos incêndios

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Floresta.
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O planeamento integrado da paisagem, com compartimentação em parcelas florestais que permitam obter uma produção anual constante e que considerem a introdução de novas espécies nas parcelas em final de ciclo, contribui para uma floresta mais diversa, sustentável e resiliente.

Por Cristina Alegria *

A floresta em Portugal Continental representa cerca de 36% da ocupação do solo do território nacional, sendo as florestas mais abundantes as de eucalipto (26%), de sobreiro (23%), de pinheiro-bravo (23%), e de azinheira (11%), segundo o sexto Inventário Florestal, do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (2019). A madeira proveniente das florestas de pinheiro-bravo e de eucalipto são a principal fonte de matéria-prima para as indústrias nacionais desta fileira.

Estas florestas têm ciclos de produção longos. Por exemplo, o corte final na floresta de pinheiro-bravo pode ocorrer a partir dos 35 anos, enquanto no eucaliptal são realizados três cortes finais de rotações de 10-14 anos, ou seja, ao longo de pelo menos 30 anos.

Face aos longos ciclos de corte e na medida em que os cenários futuros de alterações climáticas preveem consequências na perda do potencial produtivo destas espécies, é crucial que o planeamento da sua arborização seja adequado. Acresce ainda que, nas últimas décadas, os incêndios florestais têm sido um fator de grande impacto ecológico e socioeconómico; num futuro contexto de alterações climáticas, prevê-se a intensificação em frequência e severidade deste evento.

O planeamento integrado da paisagem deve conciliar as visões social, económica e ambiental das florestas, promovendo valor para quem as gere, emprego para as comunidades e serviços do ecossistema que beneficiam toda a sociedade.

Para responder aos desafios das alterações climáticas e do perigo de incêndio é imperioso realizar um planeamento integrado da paisagem, incorporando não só as dimensões ambientais e económicas do problema, mas também a dimensão social associada.

É isto que se pretende com a aplicação de um método de regularização da produção, que permite compartimentar a paisagem em parcelas de gestão para que se obtenha uma produção anual, constante, e à perpetuidade. E à medida que novas jovens florestas regeneram, podem ser incorporadas na fileira de produção.

Este trabalho permite iniciar o processo de reconversão das parcelas de gestão que vão sendo abatidas, através da arborização com outras espécies, sem que se afete a regularização da produção pré-estabelecida. A introdução de novas espécies permite melhorar a biodiversidade da paisagem, incorporar multifuncionalidade nos espaços florestais e aumentar a sua resiliência aos incêndios florestais (Navalho et al., 2017).

Planeamento integrado da paisagem: um caso de estudo no centro de Portugal

Apresenta-se aqui, como caso de estudo, a abordagem realizada na Freguesia de Sarnadas de S. Simão, no centro de Portugal, com 3100 hectares e uma vasta área de Reserva Ecológica Natural (REN) (59% dos 1822 hectares).

Para o efeito foi considerada a aplicação efetiva das recomendações e metas constantes nos planos sectoriais para a floresta (de nível nacional, regional e municipal), incluindo o Plano Regional de Ordenamento Florestal do Centro Litoral (ICNF, 2019), a atualização da Estratégia Nacional para as Florestas (Diário da República nº 24/2015), as Normas Técnicas de Elaboração e Planos de Gestão Florestal, da antiga Autoridade Florestal Nacional (AFN, 2009) e o Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios, (AFN, 2012).

Em 2007, a paisagem era dominada por floresta de pinheiro-bravo (dos 1817 hectares, 59% estavam ocupados pela espécie), com povoamentos maduros a sul e povoamentos jovens de regeneração pós-fogo a norte.

Foram produzidos os mapas de aptidão para 21 espécies florestais recomendadas para esta freguesia, dos quais se obteve um mapa final identificando seis zonas de aptidão regular e superior para as espécies que serviram de base para a conversão de espécies. O mapa de zonagem multifuncional identificou as áreas dedicadas à função de proteção.

Tendo por base o potencial produtivo da freguesia para o pinheiro-bravo, a zona sul, com pinhal maduro, foi organizada em 50 parcelas de gestão, enquanto a zona norte, com pinhal jovem, foi organizada em 21 parcelas de gestão. Foi considerado um ciclo de produção de 50 anos (abate aos 45 anos mais 5 anos para assegurar a regeneração natural).

O processo de regularização da produção ao longo de 50 anos inicia-se nas parcelas de gestão de pinhal mais velho para os mais novos. Assim, a parcela de gestão 16 será a primeira a ser abatida – com uma área de 20 hectares, 18 deles em área de proteção e, portanto, onde se realizará a conversão da espécie.

No ano seguinte outra parcela de gestão irá a corte, sendo avaliada a área de proteção para conversão da espécie, e assim sucessivamente até ao término do ciclo de 50 anos. Na zona norte, ao fim de 30 anos, pode iniciar-se a exploração do pinhal, compensando as perdas por conversão da espécie na zona sul.

Ao fim do ciclo de 50 anos (o primeiro ciclo compreende-se entre 2015–2064), a área de pinhal ficará com um total de 836 hectares (549 hectares na zona sul e 287 hectares na zona norte).

Durante este primeiro ciclo de regulação da produção da floresta de pinheiro-bravo, a dimensão do pinhal na área de proteção convertida será de 983 hectares (670 hectares na zona sul e 313 hectares na zona norte). Passará a ter principalmente c sobreiro (237 hectares), castanheiro (236 hectares), carvalhos (135 hectares), azinheira (99 hectares) e pinheiro-manso (78 hectares), entre outras.

Do processo resultou uma paisagem com uma estrutura mais fragmentada – com manchas florestais não contíguas, com perímetros irregulares, de área menor que 30 hectares, e em diferentes estágios de sucessão) – onde foram introduzidas 16 espécies de menor inflamabilidade do que o pinheiro-bravo (por exemplo, folhosas caducifólias). Além de uma melhor biodiversidade, maior resiliência aos incêndios e multifuncionalidade dos espaços florestais, obtém-se um fluxo de produção, anual, constante, e à perpetuidade, que proporcionará rendimentos para suportar a atividade económica e o emprego florestal.

* Professora Coordenadora com Agregação do Instituto Politécnico de Castelo Branco na Escola Superior Agrária (IPCB-ESA) e investigadora no Centro de Estudos de Recursos Naturais, Ambiente e Sociedade do IPCB (CERNAS-IPCB). Doutorada em Engenharia Florestal (2004), pela Universidade de Lisboa, Instituto Superior de Agronomia, desenvolve a sua atividade de investigação e de ensino nas áreas do Inventário florestal e modelação do crescimento e produção florestal; Planeamento, ordenamento e gestão florestal sustentável; e Deteção remota – processamento de imagem digital. Artigo publicado originalmente no site Florestas.pt.

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