Numa altura em que pode já estar em preparação a orgânica do novo Governo, é com muita preocupação que a ZERO vê a possibilidade da tutela das florestas voltar ao Ministério da Agricultura, naquilo que se antevê como um enorme retrocesso na evolução das políticas públicas nesta área, com o argumento de recuperação da importância política de um Ministério que, como se evidenciou pela enorme contestação nos últimos tempos, dispensa a floresta para merecer peso político.
Por Francisco Ferreira *
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Para além de não virem a ser consideradas as expectativas societais em relação à floresta na decisão a tomar, a inserção das florestas na agricultura “condenaria” o setor à situação histórica de sempre, ou seja, ao dificultar a execução das verbas das intervenções florestais para depois as encaminhar para outros setores com mais influência, como já se pode verificar no atual PEPAC – Plano Estratégico da PAC 2023-2027.
Seria também um contexto em que o próprio Fundo Ambiental – um instrumento de financiamento importante do setor florestal que financia, por exemplo, o Programa Sapadores Florestais – poderia diminuir acentuadamente o apoio da floresta, ainda para mais antecipando-se que haverá uma redução drástica de verbas públicas para investimento nesta área, sobretudo após 2026, com a conclusão do Programa de Recuperação e Resiliência, o qual está a investir 615 milhões de euros.
Para além disso, o que interessa mais à sociedade portuguesa é que o Programa de Transformação da Paisagem possa estar em causa após a conclusão do PRR e com ele todo o trabalho já realizado nas políticas dirigidas aos territórios vulneráveis aos incêndios, designadamente no desenvolvimento dos Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem, na criação de Áreas Integradas de Gestão da Paisagem ou na implementação dos Condomínios de Aldeia.
Sem o financiamento do Fundo Ambiental, também a remuneração de serviços de ecossistemas pode estar em causa e será mais difícil diversificar a floresta, alicerçando investimento em espécies autóctones.
Acresce que um fragilizado Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, a braços com dificuldades de gestão e com recursos humanos insuficientes para fazer face às atribuições legais que lhe estão cometidas, ficaria com mais uma tarefa nada fácil que seria a de voltar a ter que lidar com uma dupla tutela em que os respetivos titulares nem sempre têm objetivos convergentes.
Importa também salientar que a política florestal implementada após os incêndios de 2017 é muito distinta da que existia quando a tutela da floresta se encontrava no Ministério da Agricultura, pelo que não se compreende muito bem o que se ganharia em matéria de gestão integrada de fogos rurais com esta mudança de Ministério.
Para a ZERO, pela primeira vez na nossa história recente, encontram-se em desenvolvimento respostas estruturadas que tentam mudar a paisagem, financiar os territórios que têm historicamente sido excluídos do financiamento público e criar uma nova economia dos territórios de baixa densidade, quebrando o ciclo de desinvestimento e gestão insuficiente dos territórios de floresta associados à pequena propriedade.
No entanto, e ainda que as dinâmicas recentes apontem no caminho correto, as ameaças de instabilidade e imprevisibilidade das políticas públicas em períodos de tempo superiores aos das legislaturas são incompatíveis com investimentos públicos e privados de longo prazo – e de larga escala – que apostem numa floresta multifuncional, biodiversa e resiliente.
Neste sentido, a ZERO apela ao futuro Primeiro-Ministro que mantenha a importância política da floresta, com a tutela direta do Sistema de Gestão Integrada dos Fogos Rurais, uma forte articulação interministerial e que mantenha a tutela das florestas na esfera do membro do Governo que ficará com a tutela do Ambiente, não cedendo a eventuais tentativas de criação de instabilidade num setor que necessita de ser acarinhado pelo próximo Governo de Portugal.
* Presidente da direção ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável.
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