Podemos até ter dezenas de milhares de vagas a mais nas faculdades de medicina que o problema da falta de médicos não se resolveria. Simplesmente porque o problema não reside nas faculdades, mas sim nos hospitais e centros de saúde que deveriam ser alvo de mais condições para formar adequadamente os médicos internos.
Por Carlos Cortes *
(sobre as novas faculdades de medicina e sobre as vagas para medicina)
Tem sido profusamente debatida em Portugal a associação entre a falta de médicos nos hospitais e centros de saúde e o numerus clausus para medicina (número de vagas para estudantes dos cursos de medicina).
Este tem sido um debate de uma má fé e desconhecimento confrangedores (já não digo invulgar porque estas posturas estão infelizmente a enraizar-se).
Para ser claro e entendível sobre esta matéria:
A FALTA DE MÉDICOS ESPECIALISTAS NÄO SE RESOLVE COM MAIS VAGAS NAS FACULDADES DE MEDICINA OU COM MAIS FACULDADES DE MEDICINA.
Quem diz o contrário mente descaradamente ou é envolto numa profunda ignorância.
Lamento mas não consigo encontrar nenhuma outra qualificação suavizada. Acontece com a Ministra da Saúde e com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Marta Temido e Manuel Heitor).
De uma vez por todos é importante perceber-se que os hospitais e centros de saúde têm a capacidade para aceitarem anualmente mais de 1800 diplomados em medicina. É aqui que reside o problema e é aqui que o Ministério da Saúde deveria investir, deveria encontrar mecanismos para formar especialistas com a qualidade exigível.
Para o acesso às especialidades, há anualmente uns 2200 a 2400 candidatos. Há por isso mais candidatos do que vagas para especialidades disponíveis. Ficam centenas de diplomados em medicina de fora.
MAS O MINISTÉRIO DO ENSINO SUPERIOR CONTINUA A INSISTIR QUE O PROBLEMA SE RESOLVE COM MAIS ESTUDANTES DE MEDICINA: DESONESTIDADE FLAGRANTE.
Podemos até ter dezenas de milhares de vagas a mais nas faculdades de medicina que o problema da falta de médicos não se resolveria. Simplesmente porque o problema não reside nas faculdades, mas sim nos hospitais e centros de saúde que deveriam ser alvo de mais condições para formar adequadamente os médicos internos (médicos em formação de especialidade).
O desprezo que tem sido dado às condições de formação nas faculdades (excesso de alunos) e ao parco investimento diz muito sobre as reais preocupações do Ministério.
Cansa, ano após ano, ver a mesma impostura, a mesma mentira da boca dos governantes e cansa vê-los investir tão pouco na formação médica. Não é disso que o país precisa.
E revolta ver quem tudo aposta na desqualificação do trabalho médico fingindo fazer exatamente o oposto.
* Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (texto originalmente partilhado pelo Facebook do autor).