Um quizz Media Veritas vai testar o que sabemos sobre redes sociais e mentiras online. Além de prémios interessantes, este jogo atribui um certificado aos participantes. Quem passar neste desafio pode ajudar a parar as fake news.
Por Associação Portuguesa de Imprensa, através do programa Media Veritas
Todos os dias fazemos estas coisas: pomos “gostos”, partilhamos fotografias, videos e links, comentamos o que vemos. Mas há uma pergunta que não fazemos tanto quanto devíamos: devo, ou não, partilhar?
O gesto é quase automático. Partilhamos nas redes sociais o que nos agrada, ou desagrada muito, o que nos emociona, o que nos revolta, o que nos comove ou indigna. Queremos que as outras pessoas saibam que não somos indiferentes.
Este nosso gesto, natural, justificável quase sempre, é a grande arma ao serviço daqueles que nos querem manipular.
A partilha online é o objectivo final de cada campanha de fake news, ou de desinformação, que é criada para nos enganar.
Por isso, está nas nossas mãos, literalmente, ajudar a controlar a invasão de mentiras online. Nas nossas mãos, e na nossa cabeça… Daí a pergunta: devo partilhar isto, ou não?
As fake news são um problema nosso
Saber o que é verdade ou mentira é um problema do nosso tempo. As mentiras online são um problema que afecta as nossa democracias, a qualidade da nossa vida quotidiana, a forma como pensamos. Mas o que gostava de vos sugerir é que este é um problema nosso, e que temos como o resolver.
Não é, como chegámos a pensar, só um problema da geopolítica, inventado pela propaganda russa e copiado por outros serviços de inteligência para desencadear conflitos nos seus tabuleiros de xadrez diplomático.
Não é, também, apenas um problema causado pela forma como as plataformas online criaram um segredo comercial que tem a chave em cada uma das nossas cabeças, nem sequer dos seus algoritmos que prevêem os nossos gostos e os nossos cliques, e são hoje o negócio mais incrível alguma vez criado.
A desinformação também não é só o resultado de estados fracos, políticas erráticas e falta de regulação.
Todas essas explicações podem estar certas, e há provas da sua relevância. Mas o que este quizz Media Veritas vos propõe é uma solução um pouco menos ambiciosa de lidarmos com a desinformação, e que não dependa de uma mudança profunda em Silicon Valley, nem nos governos.
Sites ganham dinheiro com mentiras
Em Portugal não faltam exemplos de sites que criam mentiras para as pôr a circular nas redes sociais. Por isso precisamos de testar o que sabemos sobre as redes sociais.
Há negócios muito rentáveis, em páginas feitas no Canadá, que se dedicam a espalhar desinformação em português e, por isso, só em publicidade, facturam mais de 10 mil euros mensais.
Há também redes europeias de discurso de ódio, criadas para influenciar resultados eleitorais, dar voz ao populismo racista e anti-refugiados, que se organizava em torno de canais videos da Holanda, políticos de extrema-direita da Áustria, da França, da Itália e da Alemanha, e depois usava uma rede de contas falsas em todos os outros países para espalhar mentiras sobre ataques inventados a igrejas por refugiados, violações, assaltos.
Quando se passa muito tempo a ler este tipo de mensagens nas redes sociais percebemos um pouco melhor o que se passa à nossa volta: as bolhas informativas em que vivemos, a polarização política, o sentimento de medo e incredulidade que ouvimos nos transportes públicos, os resultados surpreendentes de certas eleições, a corrida aos supermercados no início da pandemia.
Mas percebemos também que o êxito da desinformação depende sempre de nós, pessoas concretas, e da capacidade que temos de lhe resistir, desconfiando, sendo cépticos, sabendo informar-nos.
Esta é a parte optimista: Se a desinformação é o nosso problema, somos nós que a temos de combater.
Da forma como gerimos a nossa intimidade, e procuramos informação para formar convicções sem nos tornamos dependentes de uma comunidade a que chamamos, e bem, de “virtual”.
Se estivéssemos a responder verdadeiro ou falso num quiz, muitos erraríamos as perguntas mais óbvias: o meu feed de notícias do Facebook é igual aos outros? Ou: os seis milhões de portugueses no Facebook existem mesmo?
Entre as nossas maiores qualidades estão a curiosidade e o cepticismo. Se formos cépticos e curiosos não vamos acreditar nas mensagens de voz no WhatsApp, que eu ouvi nos primeiros dias da pandemia de Covid 19, relatando que os supermercados iriam fechar todos dali a dois dias e que devíamos esvaziar as prateleiras todas enquanto é tempo. Da mesma forma, não devemos acreditar numa senhora que usa uma foto bonita no Facebook e se chama “Maria Silva”, só porque temos centenas de amigos em comum com ela, mas nunca a vimos mais gorda.
Como evitar a manipulação ?
Há perguntas simples que nos ajudam a distinguir uma notícia de uma mentira:
“Isto é verdadeiro ou é falso?”
“Nunca ouvi falar deste site ou da pessoa que publica esta história… Devo acreditar mesmo assim?”
“Nenhum jornal deu esta notícia assim, porque será?”
“O endereço (URL) e o formato da notícia são estranhos, não são?”
“Há tantos erros na escrita, será que isto é uma tradução automática?”
“Não há citações de nenhuma pessoa, porquê?”
“Porque aparece esta mensagem ‘Clica aqui e vais ver uma coisa extraordinária’?”
“As imagens são estranhas e parecem fabricadas, não parecem?”
Não clicar em links de sites de que nunca ouvimos falar, sobretudo quando a história que nos querem passar é também ela estranha, é a nossa primeira defesa.
Se clicarmos estamos a financiar esse site com dinheiro real, de publicidade. E estamos a dar-lhe pontos no algoritmo da rede, o que fará com que esse link seja mostrado a mais e mais pessoas.
Pior, se clicamos nesse tipo de sites, o algoritmo da rede vai prever que clicaremos em todos os links do género que nos aparecem à frente. E isso é o ciclo vicioso que explica o problema. Ficamos, rapidamente presos numa bolha.
Façam uma experiência para testar se isto é verdadeiro: experimentem, durante umas semanas, apenas abrir links, no vosso feed, de um tema específico (pode ser futebol, por exemplo). Ao fim de poucos dias, o vosso feed vai apresentar-vos cada vez mais notícias dessa área. No fim, o vosso mundo informativo vai encolher.
E isso tem um efeito: Em pouco tempo, a nossa cabeça depende daquelas mensagens. A informação que consumimos molda a forma como vemos o mundo. E nunca se esqueçam: nós somos consumidores e há quem defina estratégias para nos manter interessados em consumir…
O que podemos fazer ?
Somos nós que alimentamos a rede da desinformação. Assim, despreocupadamente, quase sempre com boas intenções. As fake news têm um objectivo final, depois de serem inventadas por obscuros interesses políticos e económicos, e de serem postas no nosso feed por bots, skinheads ou agências de propaganda.
O objectivo final de toda essa rede é que nós as partilhemos, emprestando a nossa credibilidade de amigos, filhos, pais, tios, irmãos, a toda a gente que as vê quando partilhamos mentiras.
Com isso estamos, inconscientemente, a criar uma distopia. Uma comunidade em que não partilhamos o básico: penses o que pensares sobre um assunto qualquer (Covid, educação, saúde, personalidades, a guerra na Síria), há uma condição para discutirmos uns com os outros, falarmos, discordarmos ou concordarmos. Todos temos de estar informados.
Mas todos sabemos que a boa informação é cara, escassa, e os jornais e as televisões também podem errar.
É verdade. O jornalismo vive hoje uma crise. É um paradoxo. Nunca tivemos tanta informação disponível e nunca foi tão fácil encontrar documentos, explicações e factos. Mas estaremos mais informados? Os estudos demonstram que não. É que a informação é apenas mais um bem que temos ao nosso dispor, para consumir online, em competição com todos os outros que o nosso tempo limitado nos obriga a escolher (música, filmes, séries, jogos, chats, fotos).
A informação não pode competir pelo nosso tempo com as mesmas armas que o divertimento e o entretenimento usam para nos convencer. Porém, as redes sociais, que são um negócio publicitário, não hierarquizam a importância social das coisas. Dão-nos aquilo que sabem que nos vai interessar. É por isso que o jornalismo só pode perder a guerra se pensar que vai oferecer notícias bombásticas que nos vão seduzir, como as receitas de um chef, ou a nova temporada da Guerra dos Tronos.
O jornalismo de que precisamos é muitas vezes chato, explicativo, longo demais para lermos num telemóvel enquanto o semáforo está vermelho.
E esse jornalismo demora tempo, tem regras e nem sempre se torna “viral” na voragem das tabelas que medem o alcance online. Por isso, hoje, infelizmente, muitas redacções preferem apostar no que dá cliques, para tentar com isso competir pela nossa atenção limitada.
Mas pensem assim: isto só pode piorar se dermos aos algoritmos das plataformas a tarefa de nos informar com critérios que não conhecemos e objectivos pouco altruístas (os algoritmos querem ter-nos sempre ligados, não querem que ganhemos o Prémio Nobel da Sabedoria).
Por isso, desistir do jornalismo não pode ser uma opção se queremos estar informados. Pelo contrário. Temos de saber exigir dos jornais, revistas, rádios e TVs que temos um regresso ao lema velho: tornem interessante aquilo que é relevante.
Para sermos livres, dentro e fora das redes (que vieram para ficar, estas e as outras que ainda não foram inventadas) temos de perceber que o problema é nosso. Sendo cépticos e não partilhando fake news, claro. Mas também exigindo um jornalismo mais sério e profundo, com mais trabalho e menos clickbait, com factos verificados e relevância. Esse jornalismo só pode existir se muitos quiserem pagar, seja assinando publicações, comprando nos quiosques, doando em campanhas de crowdfunding.
Os riscos que corremos se tudo ficar como está são evidentes. A cada dia que passa mais gente acredita que a Terra é plana, mais políticos que garantem que o Covid se cura com injecções de lixívia são eleitos, mais massacres acontecem a povos como os Rohingya, mais racismo e desigualdades teremos nas nossas vidas.
A dopamina que nos satisfaz com os likes nas nossas fotos, ou os elogios que nos fazem nas redes, não é nada comparada com a gratificação que devemos a nós próprios de não sermos cúmplices ou indiferentes perante a destruição do nosso bem comum mais importante: sermos livres, numa comunidade melhor.
O quizz Media Veritas quer ajudar-nos a perceber se somos fortes ou fracos neste jogo da verdade e da mentira. E quer ajudar-nos a parar as fake news.
– certificado aos participantes
Quem sabe o que é um bot? Quem sabe identificar uma mentira famosa? Para os melhores resultados há prémios interessantes. Há também um certificado atribuído aos participantes.
Mas o que este jogo Media Veritas promete é ainda mais importante. Passar neste desafio ajuda-nos a perceber se estamos, ou não, preparados para sermos livres e responsáveis num mundo cada vez mais dominado pela inteligência artificial.
E para começarmos o desafio do quizz: há uma pergunta simples que devemos fazer de cada vez que navegamos em redes sociais ou encontramos um link qualquer que nos interpela numa pesquisa do Google. Essa pergunta é o mais importante travão que podemos, agora, usar para parar a desinformação. Devo ou não partilhar esta história?