Exploração sexual, flagelo indesculpável e a combater

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Imagem Agência Reuters.

É preciso desmistificar conceitos e simplismos, e acusar o que está verdadeiramente em causa, não o apoio à mulher e o combate às causas e consequências da prostituição, mas sim o apoio ao lenocínio.

Filipe Guerra *

Sob pretextos tão pretensamente bondosos como a “agenda libertária”, os “direitos laborais”, o “direito ao corpo” ou a “higiene pública” e utilizando ditos falsos como “a profissão mais velha do mundo”, diversos sectores políticos e sociais têm-se apresentado a terreiro defendendo a legalização da prostituição. Tristemente, em 2018, urge desmontar esta argumentação.

Um primeiro aspecto que cumpre desde logo desmentir é que a prostituição seja crime, que não o é, pois não existe qualquer moldura para tal. O que é crime, à luz do art.169 do Código Penal é o lenocínio de “quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição”. Ou seja, os defensores da “legalização da prostituição”, em substância, o que defendem é a legalização do lenocínio.

No léxico e semântica dos defensores de tal “liberdade”, expressões como “trabalhadoras do sexo” ou “indústria do sexo” e similares, visam, sumariamente, dois objectivos: primeiro, o enquadramento de tal “indústria” como uma vulgar actividade comercial(libertando-a da carga desumana e exploratória), e um segundo objectivo bidireccional de encobrimento da situação económico-social(causas e consequências) da mulher prostituída e desculpabilização do criminoso praticante de lenocínio que assim se apresenta como um “empresário”.

Observando países como a Alemanha ou a Holanda onde a “prostituição foi legalizada”, e onde nunca fica claro se houve algum objetivo de combate à prostituição ou se apenas se pretendeu o seu enquadramento, regista-se que não só não se combateu coisa nenhuma(o tráfico de pessoas para exploração prosseguiu e reforçado), como mecanismos de protecção social como a segurança social não tiveram qualquer adesão(relatório “Sexkauf”, revista Der Spiegel). Além dos aspectos grotescos associados aos ‘direitos e deveres’ a que as “trabalhadoras do sexo” se sujeitaram e ao seu desejo de sair rapidamente da actividade.

Outra linha argumentativa dos seus defensores é da separação da prostituição forçada da venda de sexo por prazer.

Ora, esta banalização e culpabilização da mulher prostituída, ilude e encobre que são as mulheres de condições sociais mais baixas, em desespero, que caem neste flagelo, bem como que a maior parte assume pretender dela sair assim que possível. E não, não há “prostituição de luxo”, apenas clientes ricos.

É preciso desmistificar conceitos e simplismos, e acusar o que está verdadeiramente em causa, não o apoio à mulher e o combate às causas e consequências da prostituição, mas sim o apoio ao lenocínio.

A liberalização do corpo e do ser, a banalização da exploração sexual, o encobrimento das redes de tráfico humano e branqueamento de capitais, com argumentos envoltos na sacralização da liberdade individual(escondendo a sua complexidade numa sociedade marcada por injustiças e desigualdades sociais), arrepiam o progresso e o património de luta de sucessivas gerações de mulheres e homens pela sua libertação.

* Jurista, eleito do PCP na Assembleia Municipal de Aveiro.