Energias renováveis offshore: É preciso acautelar questões ambientais e sociais

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Energia eólica offshore.

As organizações não governamentais de ambiente identificam três áreas particularmente problemáticas que devem ser repensadas por não estarem a acautelar questões ambientais e sociais.

Por ZERO, ANP|WWF, SPEA e Sciaena *

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Terminou a consulta pública sobre o Plano de Afetação de Energias Renováveis e o Relatório da Avaliação Ambiental Estratégica que o acompanha, na qual a ZERO, a ANP|WWF, a SPEA e a Sciaena participaram. Estas organizações denunciam a persistente primazia dos aspetos económicos sobre a proteção da biodiversidade e não a inclusão da sociedade civil, alertando para a necessidade de repensar a espacialização das áreas para implantação de projetos de energias renováveis offshore à luz dos potenciais impactes ambientais e sociais negativos e crescente degradação do meio marinho.

É fundamental excluir ou redesenhar todas as áreas que afetem as grandes rotas migratórias de aves e mamíferos marinhos, bem como de outras áreas identificadas por mapeamento de sensibilidade de aves marinhas entretanto efetuado[1], evitando ainda a sobreposição com áreas classificadas ou a classificar, mesmo que com a justificação de potenciar os recursos marinhos pela exclusão da pesca.

As organizações não governamentais de ambiente identificam três áreas particularmente problemáticas que devem ser repensadas por não estarem a acautelar questões ambientais e sociais.

Em primeiro lugar a área da Ericeira, por estar encaixada entre duas Zonas de Proteção Especial (Ilhas Berlengas e Cabo Raso), e potencialmente sobreposta a uma zona proposta para classificação como Área Marinha protegida de Interesse Comunitário. Grave é também a proximidade da área Ericeira à maior colónia de aves marinhas pelágicas do território Continental Português – a de cagarras Calonectris borealis, no arquipélago das Berlengas – sobrepondo-se inclusive aos seus territórios de alimentação.

Por outro lado, as duas áreas de Viana do Castelo (Norte e Sul), suscitam igual preocupação devido à sobreposição com as áreas de maior sensibilidade para as aves marinhas, devido à sua excessiva proximidade à costa (cerca de 7 milhas náuticas) e sobreposição a zonas de pesca importantes para as comunidades locais. Mais ainda, não são acautelados impactos transfronteiriços, pois a área “Viana Norte” encontra-se praticamente na sequência uma área proposta para desenvolvimento de energia eólica offshore localizada na Zona Económica Exclusiva (ZEE) de Espanha, adjacente à fronteira. Tal como estão propostas, e atendendo aos previsíveis impactes cumulativos, as áreas de Viana do Castelo potenciam um afunilamento do corredor migratório do Atlântico Este, aumentando o risco de colisão para as aves marinhas.

Por outro lado, importa salientar que as preocupações ambientais são também crescentes diante da possibilidade de dragagens em estuários ecologicamente sensíveis e integrantes da Rede Natura 2000, como é o caso do Sado e da Ria de Aveiro, para ampliar a capacidade de carga destinada à infraestrutura portuária vinculada à expansão da energia eólica offshore. Neste quadro, é crucial avaliar alternativas possíveis, como os investimentos na construção de ligações ferroviárias entre portos e as instalações industriais que suportarão todo o processo. A transparência é a palavra de ordem e, se efetivamente não há alternativa, é necessário esclarecer e justificar.

Pese embora fique claro que persistem incertezas e lacunas de conhecimento em relação aos impactes ambientais para os ecossistemas marinhos, habitats e espécies protegidas, falhou-se, novamente, em incluir as Organizações Não Governamentais de Ambiente (ONGA) e outros atores-chave com conhecimento científico relevante no processo de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE). Este envolvimento não só seria necessário do ponto de vista da transparência e inclusão da sociedade civil, como possibilitaria a partilha essencial de conhecimentos e boas-práticas baseados na ciência e na experiência de campo.

Ainda assim, a AAE reconhece a enorme incerteza em torno dos impactes ambientais da implantação de energia eólica offshore, o que vem confirmar e reforçar a necessidade de se avançar com a Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), planos de monitorização e mitigação eficazes e ambiciosos, garantir uma avaliação transparente dos mesmos, bem como com a definição de critérios ecológicos que alicercem os procedimentos concorrenciais que estão por vir.

Neste sentido, as ONGA aplaudem a obrigatoriedade de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) para todos os processos de licenciamento e o governo terá que ser bem claro quanto a isso, dado que, face a um contexto regulatório tão permissivo e pouco rigoroso em matéria ambiental como é o potenciado pelo Simplex e pela revisão da Diretiva de Energias Renováveis da União Europeia (RED III), não está claro de que forma estas poderão ter implicações sobre o desenvolvimento dos projetos de eólicas offshore. Relembre-se que a RED III, aprovada em novembro, considera a produção de energia renovável como “interesse público superior” e, como tal, os respetivos projetos beneficiam de um processo de avaliação simplificado no que diz respeito a uma série de obrigações ambientais constantes de diretivas específicas da União Europeia.

Mais uma vez, as ONGA apelam a que sejam tornados públicos os modelos dos contratos que serão celebrados com os promotores, que critérios de pré-qualificação serão utilizados nessa fase, e que critérios também irão guiar a seleção de propostas em leilão. A inclusão de critérios ambientais e socioeconómicos como fator preponderante na ponderação de propostas vencedoras deve ser uma parte indissociável de todas as fases subjacentes ao desenvolvimento de projetos de implantação de energias renováveis oceânicas.

Na corrida para descarbonizar os nossos sistemas energéticos, não podemos esquecer que o objetivo subjacente a esta transição energética é parar a degradação do meio ambiente, em benefício da natureza e das pessoas. Reiteramos que a resposta à crise climática é urgente, mas esta não pode ser feita à custa de agravar a crise da biodiversidade. Portugal tem a responsabilidade de proteger o mar que o define e de alinhar a sua estratégia e ambição quanto às metas climáticas com os compromissos assumidos na proteção da biodiversidade marinha, e de o fazer de forma transparente e participativa.

* ZERO – https://zero.ong/ ANP|WWF https://www.natureza-portugal.org/ SPEA https://spea.pt/ e Sciaena https://www.sciaena.org/ . Consultar artigo original aqui.

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