A oficina de cerâmica que funciona na “olaria do Alto de Saboga” vai encerrar no final do corrente ano.
Vitor Amaral *
Uma das atividades mais prósperas de Ovar desde final do Séc. XIX até meados do Séc. XX foi a olaria. Há registo de mais de vinte olarias na primeira década do último século; No entanto, há cerca de 30 anos que esta nobre atividade, que também tinha uma grande componente de arte, foi totalmente extinta.
Porém, o nosso município sempre reconheceu a importância que esta atividade teve, especialmente na cidade de Ovar, ao ponto de atribuir o seu nome a um largo, que é o atual Largo da Olaria, onde se localizavam várias daquela mais de duas dezenas de olarias.
Que tenhamos conhecimento, em Ovar restam apenas dois imóveis que serviram de olarias. Uma delas era conhecida como “olaria do Regalado”, em S. Miguel e a outra, no Alto de Saboga, foi conhecida como “olaria do Estarreja”, por pertencer ao oleiro Sr. Evaristo Estarreja, mas era conhecida sobretudo como “olaria do Alto de Saboga”.
A primeira, com forno de maior dimensão e com uma produção que não se ficava apenas pelo fabrico de vasos, cântaros e outros artefactos de barro, foi também muito conhecida pelo fabrico do designado “tijolo burro”, pertenceu e ainda pertence à Família Regalado, tendo sido o Sr. António Maria Regalado um dos últimos oleiros da cidade.
A segunda, apesar de ser de menor dimensão em todos os aspetos, continuou a ser objeto de visita, graças ao facto de ali ter passado a funcionar uma oficina de cerâmica, de peças decorativas, que ainda se mantém aberta e que, por isso, proporciona o contacto direto com o primitivo forno a lenha, que se mantém intacto, tal como era há cem anos, e o poço onde se amassava o barro, pisado a pés, como se pisavam e ainda pisam em alguns casos as uvas nos lagares.
A entrada neste espaço faz-nos recuar no tempo e a uma época que, apesar da maior parte dos vareiros atuais não a ter vivido, traz a recordação da prosperidade duma indústria que muito projetou Ovar.
Tivemos conhecimento que a oficina de cerâmica que funciona na “olaria do Alto de Saboga” vai encerrar no final do corrente ano, por iniciativa das atuais proprietárias do imóvel. Se o encerramento ao público deste espaço é uma mera questão de direito privado a que a autarquia está e se deve manter alheia, já o destino a dar àquele imóvel é de interesse público e daí que se traga este assunto a uma reunião de Câmara.
Assim, pretendemos saber do executivo em permanência o seguinte:
1. Se reconhece que a olaria foi uma atividade marcante para o nosso município e especialmente para a cidade de Ovar até meados da segunda metade do Séc. XX, pese o facto (que se assinala de forma positiva) de estar patente na Escola de Artes e Ofícios uma exposição sobre o tema promovida pela Câmara;
2. Se tem inventariado os imóveis existentes na atualidade onde funcionaram algumas dessas olarias;
3. Se considera de relevante interesse cultural para o município que, no caso concreto das olarias, se acautele a salvaguarda, a conservação e a valorização de algum desses imóveis, como forma de manter acesa na memória das gerações vindouras o que de mais relevante marcou a nossa cidade e o nosso município;
4. Em caso afirmativo, se pondera colocar em discussão pública a possibilidade de vir a classificar esses imóveis ou algum deles, como sendo de interesse municipal, sabendo-se que, apesar de não ser consensual, a “classificação de bens culturais como de interesse municipal incumbe aos municípios, embora careça de prévio parecer” dos competentes serviços do Estado;
5. Se entrou nos serviços da Câmara algum projeto de demolição da designada “Olaria do Alto de Saboga” e, consequentemente, de construção de novo ou novos edifícios naquele local;
6. Em caso afirmativo, se pensa salvaguardar um possível interesse municipal daquele imóvel, sem prejuízo de ajustar a este o interesse particular dos seus legítimos proprietários.”
* Vereador do PS na Câmara de Ovar, requerimento apresentado na reunião de 5 de julho de 2018.