Descentralização, uma oportunidade perdida

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Assembleia da República.
Natalim3

O Estado Central apenas quis encontrar um prestador de serviços.

Emídio Sousa *

Foi publicada no passado dia 16 de agosto a Lei Quadro de transferência de competências para as autarquias locais, estabelecendo que as autarquias que não pretendam aceitar, transitoriamente, as novas competências se deverão pronunciar expressamente nesse sentido.

Tratar um assunto desta importância e impacto na gestão municipal e das freguesias em menos de um mês, ainda por cima nos meses de agosto/setembro, é estranho.

Depois o legislador estabelece no mesmo artigo (art.º 4º) que a transferência das novas competências será concretizada através de diplomas legais setoriais relativos às diversas áreas a descentralizar, para logo a seguir dizer que as autarquias que não pretendam a transferência no ano de 2019 terão que o deliberar expressamente até 15 de setembro.

Confusão instalada. Logo a correr a Direção Geral das Autarquias Locais emite uma circular a dizer que o que está na lei (nº2 do artº 4º) não vale.

É pena, pois parece-me que existia uma vontade genuína do Primeiro Ministro António Costa que o processo se concretizasse e que, face à disponibilidade demonstrada pelo PSD e Rui Rio, estavam reunidas condições para o concretizar.

Desde o início defendi que em matéria de Educação deveriam ser transferidas as competências do ensino básico e secundário, na Saúde as competências relativas aos cuidados primários e na área social as competências em matéria de habitação social, apoios sociais e acordos de cooperação com as IPSS ou privados.

Não vai acontecer nada disso. O Estado Central apenas quis encontrar um prestador de serviços.

Também não compreendo bem o processo legislativo. Desde 1979 que existe uma lei das atribuições e competências das Autarquias Locais, que é atualmente a Lei nº 75/2013. Não seria mais adequado rever esta lei ou fazer uma nova lei onde se incluíssem as competências que agora se pretende transferir?

Não se vislumbra a extinção de qualquer serviço ou organismo da administração central do Estado. Pelo contrário, é criada uma nova comissão de acompanhamento, de “sábios”. Certamente muito melhor remunerada que os autarcas.

Também se constata que o Estado quer transferir a responsabilidade de manutenção e conservação dos edifícios, mas não transfere a propriedade. Após mais de 10 anos sem investimento nos imóveis do Estado, imagina-se o estado em que vão ser entregues.

Lamento que o Estado Central se revele incapaz de calcular o impacto financeiro do que pretende transferir. Tenho dito repetidamente que a descentralização é a mais importante reforma do Estado. Esta descentralização não é nada disso.

* Presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira.

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