Corrigir trajetórias para voltar a acreditar no futuro da floresta em Portugal

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Proteção florestal.
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Uma das principais questões que se deve colocar aos decisores, públicos e privados é saber quais as expectativas relativamente ao futuro da floresta em Portugal, quais os domínios essenciais para corrigir trajetórias e se está a ser tudo feito para cumprir os desígnios pretendidos.

Por Miguel Freitas *

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Em todas as situações em que questionei plateias de dirigentes de organizações, proprietários e técnicos, o pessimismo prevalece, esmagadoramente, sobre as expectativas futuras, sendo este um sinal de grande preocupação para um sector que precisa de se mobilizar para investir e cuidar de territórios florestais. Quem não tem confiança não investe. Mesmo os mais jovens se encontram reticentes face aos cenários que o tempo permite vislumbrar.

Há cinco elementos que definem as trajetórias do sector e condicionam o futuro da floresta em Portugal:

1 – A falta de rentabilidade crónica do investimento florestal;
2 – O risco crescente para quem investe;
3 – A incapacidade para gerar economias de escala;
4 – A resistência estrutural à inovação;
5 – A imprevisibilidade e o tempo das políticas públicas.

Desde logo é preciso corrigir as fragilidades da informação florestal e compatibilizar critérios entre instrumentos estatísticos de ocupação do solo. As contas de cultura apenas se conseguem sustentar com informação de recolha não validada e transpondo informação macro para abordagens micro. A certificação constitui o instrumento por excelência para validação de produtividades e identificação de valores associados à venda de diversos materiais lenhosos extraídos da floresta. A rastreabilidade tem de cumprir a sua função. Sem isso a certificação não estará a proporcionar o devido valor acrescentado.

Mesmo com fragilidades de informação, a análise às contas de cultura mostra que os sistemas agroflorestais, intensivos ou extensivos, caraterizam-se a partir dos três “R”: Rentabilidade baixa, Risco elevado e Retorno lento do capital investido. Para vislumbrar um melhor futuro da floresta é, por isso, importante apelar a uma gestão técnica cada vez mais exigente, que permita equacionar múltiplos aproveitamentos intermédios e ter em conta o conjunto dos serviços do ecossistema e as diversas formas de o remunerar nos mercados de bens transacionáveis e nos mercados de bens públicos.

Esta exigência técnica aplica-se também à gestão das espécies de crescimento lento. Ao contrário do que parece, elas requerem ainda melhor planeamento e maior acompanhamento para se obterem rendimentos intermédios que justifiquem diversificar operações florestais.

Neste sentido, o Programa de Transformação de Paisagem, anunciando a possibilidade de remuneração de serviços de ecossistemas, de longo prazo, poderá ser uma alavanca para dar suporte a uma melhor gestão das áreas florestais. Também, a recente regulamentação nacional dos mercados de carbono e a produção do “Guia para o desenvolvimento dos pagamentos públicos e privados dos serviços dos ecossistemas florestais” são pistas interessantes a percorrer. Com os pés assentes na terra, procurando perceber virtualidades e limitações de cada um dos instrumentos e a sua adaptação concreta aos modelos de silvicultura.

O investimento florestal acarreta cada vez maior risco, sendo essencial preconizar novas estratégias de produção, atualizando modelos de silvicultura multifuncionais e procurando as melhores consociações dentro das áreas florestais e entre áreas de floresta-agricultura.

As AIGP – Áreas Integradas de Gestão da Paisagem, prevendo intervir em 140 mil hectares, proclamam esse princípio de complementaridade, que deveria ser alargado a todos os programas de incentivo ao investimento, nomeadamente o PEPAC – Plano Estratégico da Política Agrícola Comum. É razoável admitir que organizações florestais (ZIF – Zonas de Intervenção Florestal, Baldios, EGF – Entidades de Gestão Florestal, UGF – Unidades de Gestão Florestal…) possam ser elegíveis a projetos agrícolas quando incluídos num modelo integrado de Planos de Gestão Florestal.

É certo que uma das soluções é a mutualização de riscos e de proveitos, que deve estar associada a uma gestão agregada das áreas florestais. Essa mutualização faz-se através de contratos entre as organizações e os proprietários, que podem ir desde soluções de gestão própria até situações de contratos de comodato (empréstimo por tempo determinado). Mas faz-se, também, com acordos de parceria entre as organizações de produtores e as indústrias florestais. Os fundos de investimento e as contas poupança podem desempenhar um papel importante na redução e mutualização dos riscos e na entrada de novos parceiros. As empresas seguradoras deverão saber interpretar estes novos movimentos e ter carteiras integradas de seguros agrícolas-florestais.

As economias de escala obtêm-se através da gestão agregada, formal ou informal, sendo importante reconhecer, desde logo, a existência de mais de duas centenas de Zonas de Intervenção Florestal que gerem mais de 2 milhões de hectares e os Baldios que ocupam 400 mil hectares de áreas em regime florestal. Estes são os agentes de mudança com que se pode contar. É certo que algumas das ZIF estão muito perto da desativação e as áreas baldias sofreram um longo período de degradação, pelo recuo dos serviços públicos no acompanhamento, na gestão, no investimento e no apoio técnico e operacional.

O Programa de Agrupamento de Baldios permitiu abrir uma via para a retoma da confiança, através da celebração de contratos-programa com a FORESTIS e a BALADI – com o objetivo de ter uma gestão agregada, para reforçar a capacitação técnica e consolidar instrumentos de planeamento, ordenamento e gestão florestal e de projetar um novo paradigma institucional em meio rural. Este programa esteve recentemente em atualização.

Mas, na verdade, falta um instrumento de apoio à gestão ativa da floresta, que permita dar escala às intervenções, nomeadamente nas ZIF de minifúndio, com financiamento no âmbito do Fundo Ambiental, com uma ajuda financeira convencionada (ajuda forfetária) de médio prazo (10 anos), única forma de cumprir os objetivos traçados no Programa Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, nomeadamente ao nível da gestão de combustíveis. É importante para o futuro da floresta que tal aconteça independentemente da espécie em presença e tendo em conta, essencialmente, a geração de valor público.

A inovação institucional é um elemento-chave para inverter algumas das tendências pesadas das áreas rurais – alterações climáticas, desvitalização demográfica, abandono da terra, polarização e intensificação agrícola e florestal, sendo crucial um novo conceito de gestão do território rural. Mas o domínio da inovação tecnológica dos processos está, também, a sofrer uma revolução a que o sector florestal português não pode ser alheio. Novos instrumentos de planeamento, novos equipamentos operacionais, em que a transformação digital e, em particular, a inteligência artificial, tudo vai mudar. O trabalho desenvolvido pelo Colab ForestWise é assinalável, devendo constituir-se como referencial para o ecossistema de inovação florestal nacional.

Para o fim deixamos a intervenção das políticas públicas. Há muito que percebemos que na política florestal a arquitetura normativa prevalece face à engenharia dos processos. Promovem-se programas cheios de boas intenções e parcos resultados. As razões desta dissonância entre o que se quer fazer e o que realmente se consegue fazer tem a ver com a difícil contagem do tempo para passar à ação e a imprevisibilidade das políticas no tempo-cronológico dos programas. O tempo é o elemento crucial para dar assertividade e credibilidade às políticas públicas. E onde quase sempre se falha.

* Professor na Universidade do Algarve e consultor na área de políticas públicas de desenvolvimento regional, ambiente, agricultura e florestas. Anteriormente, desempenhou vários cargos públicos, incluindo, entre outros, o de Secretário Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural. Artigo publicado originalmente em Florestas.pt.

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