Corpos de crença e esperança na arquitetura – a obra de Lopes da Costa

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Capa.

Ao visitarmos as casas aqui publicadas e projectadas pelo Atelier d’Arquitectura Lopes da Costa, registamos um sentimento onde a crença e a esperança na arquitectura são valores instrumentais e essenciais a todos, sobretudo, aos que as habitam. Acolhem-nos experienciadas e recheadas de vida, materializando e evocando a ideia de que a casa é o museu do corpo e da alma de quem a eterniza, metáfora inspirada e ilustrada nos escritos de Marcel Proust.

Por João Paulo Rapagão *

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Atravessamos, hoje, um tempo lato de universalidade e transversalidade culturais. Uma casa pode ser quase tudo ou quase nada. Entre o Palais de Versailles de Louis Le Vau e de Jules Hardouin-Mansart, com os seus 2300 quartos e o Cabanon de Le Corbusier, com uma planta de 3,66 por 3,66 metros e uma secção de 2,26 metros de altura, as possibilidades são infinitas.

Iniciamos esta análise e síntese crítica, com os temas de marginalidade e singularidade. José António Lopes da Costa, com a colaboração de Tiago Meireles desde 1988, exerce em S. João de Ovar. Concebe habitares para lugares em acelerada urbanização e transformação social e cultural, em paisagens com matrizes simultaneamente rurais e industriais como Anadia, Aveiro, Esmoriz, Ílhavo, Murtosa, Oliveira de Azeméis, Ovar, Santa Maria da Feira, São João da Madeira ou Leça do Balio. As suas casas povoam territórios onde persistem, ainda, as marcas civilizacionais e imateriais inventariadas por Orlando Ribeiro, investigadas por Jorge Gaspar e acutilantemente denunciadas e estudadas na actualidade por Álvaro Domingues.

Lopes da Costa manipula eficazmente estas permanências de cariz vernacular e popular, nomeadamente de parcelamento e relacionamento de vizinhança, ao acomodar, modelar e hierarquizar os volumes que produz. Os seus projectos e obras contrariam, assim, a progressiva perda dos valores ancestrais e tradicionais, em lugares aproximados pela mobilidade e acessibilidade e, por isso, cada vez mais apetecíveis e afáveis para viver.

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As casas desenhadas e projectadas entre 2002 e 2019, evidenciam coerentemente um percurso assente na dimensão do lugar, para além de uma interpretação e acomodação perspicazes às geografias do mesmo. Esta condição territorial é também espacial e material, quando concilia temas regionais e locais, com modernidade ou contemporaneidade, produto da sua constante inquietação e ambição em saber e querer estar actualizado. Aliando a sua maturidade à sua jovialidade disciplinar, Lopes da Costa mantém um upgrade intelectual e cultural permanente, pessoal e profissionalmente imprescindível.

À marginalidade exposta, junta-se a singularidade de uma constância e resiliência obstinadas, onde cada encomenda se prolonga para além dos acabamentos coerentemente desenhados e integrados no todo, legitimando-se na sua autenticidade e vitalidade futuras. O seu desenho rejeita a exuberância ou a arrogância de autor e essa é, muito provavelmente, a sua assinatura. Aproxima-se assim do sucesso das operações e realizações únicas quando, idealmente, ao desenhar e projectar para habitar, começa do zero, criando uma cumplicidade com o dono de obra que impressiona e emociona. Durante as visitas, por isso, os clientes que nos acolhem são, agora, amigos de Lopes da Costa.

Uma casa pensada e desenhada por José António Lopes da Costa é um corpo. É um lugar guardado e consagrado, um templo onde os limites são a capacidade de respirar e experienciar de quem o habita. É, por isso, como refere Ettore Sottsass, um vazio interior, um lugar de comunhão e celebração de diferentes ritos.

* Arquiteto. Resumo do texto de apresentação do livro “Casas · Houses, Atelier d’Arquitectura J. A. Lopes da Costa”, editado pela Caleidoscópio. A publicação reúne 17 das obras de habitação mais significativas realizadas pelo Atelier d’Arquitectura J. A. Lopes da Costa nos últimos 15 anos. O evento terá lugar no próximo dia 7 de Dezembro, pelas 18h, no Auditório Maria Cecília Oliveira, na Escola Dr. José Macedo Fragateiro, em Ovar.

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