Quando os dirigentes políticos se reúnem para a segunda conferência no Parlamento Europeu sobre como ir para além do crescimento “beyond growth”, nós, os signatários enquanto académicos e organizações da sociedade civil, vemos as crises geopolíticas como uma oportunidade para nos afastarmos do crescimento competitivo prejudicial do ponto de vista ambiental e social e, em alternativa, embarcarmos na cooperação pelo bem-estar.
Por Timothée Parrique, Kate Raworth e Vincent Liegey *
Não existem bases empíricas de que seja possível dissociar, de forma global e suficiente, o crescimento económico das pressões ambientais. A procura do crescimento económico sem fim pelos países mais ricos é um problema, pois ou reduz ou anula os ganhos das políticas ambientais. O atual caos climático e a complexa rede de vida da qual a possa sociedade depende é uma ameaça existencial à paz, à água, à segurança alimentar e à democracia.
Avançar para uma economia pós-crescimento não é apenas para sobreviver, mas também para garantir a prosperidade. Isto apela a uma diminuição da produção e consumo de forma democraticamente planeada e equitativa, um processo muitas vezes referido como decrescimento, nos países que excedam os limites dos seus recursos ecológicos. Este é o projeto da Europa para a paz global, pois o seu atual crescimento económico está a ser a causa de conflitos quer na, quer além da Europa.
No contexto das nações de elevado rendimento, pegadas ecológicas mais baixas não significam piores condições de vida. Políticas de suficiência focadas na frugalidade, redução no uso de recursos, e redução no tempo de trabalho podem aumentar significativamente o bem-estar e diminuir as pressões ambientais, criando a possibilidade de uma prosperidade sustentável sem crescimento.
De forma a assegurar a maior qualidade de vida com a menor pegada ambiental, temos de alterar completamente os objetivos e regras do jogo económico. Numa economia do pós-crescimento, o foco atual no crescimento quantitativo será substituído pelo objetivo de prosperar numa economia regenerativa e distributiva, que garanta bem-estar qualitativo ao ir ao encontro das necessidades de todos dentro dos limites planetários – como descrito na estratégia da Economia Donut.
Os mercados não estão bem equipados para tomar as decisões cruciais na nossa sociedade. Para a economia servir as pessoas, em vez do inverso, as pessoas têm de reconquistar o controle sobre a economia. Para mudar as regras do jogo precisamos de aprender com iniciativas que já existem. Por exemplo, exponenciar o modelo das cooperativas sem fins lucrativos por toda a UE.
À luz destes desafios e de oportunidades estimulantes, apelamos à União Europeia, às suas Instituições e aos Estados-Membros que implementem:
Instituições europeias Pós-crescimento: constituir estruturas permanentes na Comissão, no Conselho, no Parlamento e nos Estados-Membros para aferir as estratégias e caminhos de pós-crescimento.
Um Pacto Ecológico Europeu para além do crescimento: desenhar um novo programa bandeira moldado numa abordagem de mudança sistémica que aspira a criar um futuro próspero dentro dos limites planetários, com o decrescimento e a necessária fase de transição rumo ao destino do pós-crescimento.
Políticas além do crescimento baseadas em quatro princípios:
- Biocapacidade: eliminação progressiva do uso de combustíveis fósseis, limites à extração de materiais e medidas de restauro e proteção da natureza para solos resilientes e saudáveis, florestas, oceanos e outros ecossistemas. Por exemplo, um Tratado de Não Proliferação de Combustíveis fósseis, um Ato sobre a Justiça e a Resiliência dos Recursos, incluindo um objetivo obrigatório de redução da pegada material e a restauração da natureza baseadas na área real;
- Equidade: instrumentos fiscais que fomentem uma sociedade mais equitativa, erradicando os extremos de rendimento e riqueza, bem como os super-lucros. Por exemplo, um imposto do carbono sobre a riqueza, quer rendimentos mínimos, quer máximos;
- Bem-Estar para todos: assegurar o acesso às infraestruturas essenciais, através de um estado social sensível do ponto de vista ecológico. Por exemplo, Serviços Básicos Universais (direito humano à saúde, ao transporte, ao cuidado, à habitação, à educação, à igualdade de género, à proteção social, etc.), garantias de emprego, controlo de preços para bens e serviços essenciais;
- Democracia ativa: assembleias de cidadãos com mandatos para formular estratégias de suficiência aceitáveis e fortalecer políticas baseadas nos limites ecológicos, na equidade e no bem-estar para todos, com um papel forte para os sindicatos. Por exemplo, fóruns sobre necessidades locais, convenções climáticas, orçamentos participativos.
Já passaram cinco anos desde a primeira conferência “post-growth”. No seio da sociedade civil e da academia, ideias críticas do crescimento têm vindo a tornar-se mais fortes. Os detalhes destas ideias serão agora discutidos no Parlamento Europeu e com a Comissão Europeia. O conhecimento científico e as perspetivas políticas estão disponíveis para tornar as ideias de decrescimento ou pós-crescimento, uma realidade. As crises que enfrentamos são também oportunidades para criar um novo sistema que possa assegurar o bem-estar para todos, ao mesmo tempo que permite uma vida democrática próspera e um modo de vida mais suave, mas mais agradável.
* Friends of the Earth | European Environmental Bureau | European Youth Forum | Wellbeing Economy Alliance (Cerca de 400 organizações e personalidades apelam à mudança para um modelo económico sustentável através da carta aberta divulgada associação ambientalista Zero, dia em que arranca a conferência “Beyond Growth”, promovida pelo Parlamento Europeu).
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