“Coisa do arco-da-velha”

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Universidade de Aveiro.

A afirmação saiu-me espontânea, sem hesitação. Mas devo confessar que, naquele momento, não fazia a mínima ideia como iria cumprir a promessa.

Por Brasilino Godinho *

Passavam-se dezenas de anos sem me recordar continuamente. Só acontecia a recordação quando “o rei fazia anos” – o que raramente sucedia. Talvez até porque, não havendo monarquia em Portugal, os reis sobrevivem noutras paragens; embora, por fatalidade, vivamos num reino de bicharada que nem sequer se recomendaria ao menino Jesus se ele renascesse no sítio de Belém, em Lisboa, onde está erguida uma linda, famosa Torre.

Porém, a partir de Dezembro de 2012 (data da minha Licenciatura) e, com mais insistência, a seguir a 05 de Julho de 2017 (em que obtive o Doutoramento), lembro-me com frequência da “Coisa do arco-da-velha”. O que decorre de nessas épocas ter havido uma grande projecção mediática sobre os êxitos universitários do cidadão octogenário Brasilino Godinho e isso estar correlacionado com a referida “Coisa”.

Recordo como se tivesse sido ontem. Ela reporta ao dia 30 de Maio de 1954. Ocorreu em Pedrógão Grande, na sala de jantar da “Pensão Cara Fina”; ao tempo, a melhor pensão da vila, gerida pela mãe viúva e filha. Nela estava hospedado. Por aquela altura vinha trabalhando como desenhador no gabinete técnico da empresa luso-suíça que construía a Barragem do Cabril. Na parte da manhã havia-me despedido da firma, pois que daí a dias embarcaria em Lisboa, por via marítima, para a cidade de Ponta Delgada, a fim de exercer funções de desenhador de 3.ª classe na Direcção de Urbanização dos Açores.

Momentos antes tendo bem almoçado e arrumado a trouxa, chegara o momento de agradecer o tratamento dispensado pelas senhoras e fazer as despedidas. Então acontece a imprevista “Coisa do arco-da-velha”. Não me lembro a que propósito e em que termos fui interpelado, mas tenho nítida imagem da perplexidade das senhoras e a certeza de que, a terminar, lhes disse com voz firme: “Ainda um dia vão ouvir falar de mim !”

A afirmação saiu-me espontânea, sem hesitação. Mas devo confessar que, naquele momento, não fazia a mínima ideia como iria cumprir a promessa.

Em tempo bastante tardio, Dezembro de 2012 e meses seguintes, ela foi espectacularmente cumprida quando alcancei a Licenciatura e devido às divulgações que do facto foram transmitidas pelas televisões, rádios, blogues e jornais. Ignoro se então as senhoras ainda seriam vivas e constatado que cumprira a promessa.

Quando na diária prática higiene mental me debruço com mais profundidade em mim próprio, por vezes, regozijo-me por ter conseguido cumprir promessas que se foram entranhando no meu ego. Se desses cumprimentos sobressai algum mérito pelo esforço pessoal que me concedi, também é de ponderar que êxito bastante alcançado a crédito do imprevisto factor sorte.

Mas sem olvidar que na pessoa de Brasilino Godinho se consumou a máxima de José Ortega y Gasset : “Yo soy yo y mi circunstancia y si no la salvo a ella no me salvó yo”. E vivendo nesta sublime compenetração, mui íntima e plenamente mantida, levam prosseguidos noventa anos de existência de Brasilino Godinho.

Digo, reiterando: Bendita a hora em que na adolescência me embrenhei no estudo da Filosofia e tomei contacto com as obras dos filósofos José Ortega y Gasset, Miguel de Unamuno e Bertrand Russel, sem menosprezo por tantos outros que me são muito caros e que me facultaram a formação do intelecto e da personalidade.

* Doutorado em Estudos Culturais, autor. https://www.facebook.com/brasilino.godinho

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