Captura da Administração Pública pelo Ciclo Político

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Reunião informal do Governo (foto partilhada na rede social X - conta República Portuguesa).

A cada mudança de governo, assiste-se a um fenómeno previsível, mas profundamente nocivo para a gestão do estado: a substituição massiva de administrações de entidades públicas. Esta prática, que se tornou quase uma tradição PS e PSD, traduz-se na exoneração de conselhos de administração, muitas vezes sem uma justificação baseada na competência ou no interesse público, mas apenas por uma lógica de alinhamento partidário.

Por Diogo Fernandes Sousa *

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O impacto desta constante rotatividade na administração pública é vasto e pernicioso, refletindo-se em custos elevados para o erário público, instabilidade na gestão e nomeações que nem sempre correspondem aos critérios técnicos exigidos para os cargos.

A exoneração dos administradores anteriores, muitas vezes com contratos de longa duração e cláusulas indemnizatórias, implica encargos para os cofres do estado. Indemnizações são pagas a gestores afastados sem qualquer avaliação objetiva do seu desempenho, unicamente porque a nova equipa governativa pretende colocar “os seus” nos lugares-chave.

Esta prática gera não apenas um desperdício de recursos públicos, mas também um clima de instabilidade dentro das instituições, onde a continuidade de projetos e estratégias é frequentemente interrompida por mudanças abruptas e ilógicas.

Para além do impacto financeiro direto da exoneração, a constante substituição de quadros superiores das entidades públicas enfraquece a qualidade da administração pública e compromete a eficiência dos serviços prestados.

O estado necessita de uma estrutura profissionalizada, baseada no mérito e na experiência, e não de um sistema onde a rotação dos cargos depende de lógicas partidárias.

Existem inclusive casos recentes onde os novos administradores, nomeados pelos ministros da tutela, não possuem sequer as qualificações técnicas adequadas para as funções que vão desempenhar, o que compromete a qualidade da gestão e agrava os problemas estruturais das instituições públicas.

A nomeação de gestores sem a devida competência prejudica o funcionamento das entidades públicas e mina a confiança dos cidadãos. O nepotismo e o favoritismo político na atribuição de cargos geram uma perceção de impunidade e descredibilizam a administração pública.

Quando os critérios de seleção não são pautados pelo mérito, as instituições perdem capacidade de resposta, eficiência e, sobretudo, a independência necessária para desempenharem as suas funções ao serviço do interesse público.

Para combater este problema, é essencial implementar mecanismos que garantam que as nomeações para cargos de topo na administração pública sejam feitas com base em critérios rigorosos de competência e experiência. Deve ser aplicado o existente sistema de recrutamento, que envolve concursos públicos exigentes e avaliações independentes, impedindo que a rotação política por nomeação e interesse puramente partidário continue a interferir na gestão pública, até porque cargos puramente na base de confiança política é o mesmo que se afirmar cargos criados para interesses privados.

Além disso, deveria existir uma maior revisão do regime de exonerações, com a introdução de critérios objetivos que condicionem a destituição de administradores. Não se pode aceitar que profissionais sejam afastados apenas para dar lugar a quadros alinhados com o partido no poder.

A captura da administração pública pelo ciclo político não pode continuar a ser vista como uma inevitabilidade. O estado deve ser gerido com responsabilidade, garantindo que os seus quadros dirigentes são escolhidos com base no mérito e que as exonerações não representam um encargo desnecessário para os contribuintes.

* Escritor do Livro “Rumo da Nação: Reflexões sobre a Portugalidade”. Professor do Instituto Politécnico Jean Piaget do Norte.

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