Num contexto cada vez mais premente de alteração de comportamentos, de modo a garantir a sustentabilidade do nosso Planeta, o grande desafio passa por conseguir conciliar futuramente o crescimento económico da região e de Portugal, em todas as vertentes que o mesmo implica, com atitudes individuais e coletivas mais respeitadoras do Ambiente.
Por Quercus / Núcleo de Aveiro *
Como tem acontecido em anos anteriores, o Núcleo Regional de Aveiro da Quercus faz o balanço ambiental relativo ao ano de 2019, sobretudo ao nível regional, selecionando os melhores e os piores factos, e apresentando algumas perspectivas para o ano de 2020.
Os piores factos ambientais de 2019
» Expansão descontrolada de espécies exóticas:
– Apesar do Governo ter apresentado a compromisso político de aumento das áreas destinadas a espécies autóctones, travando a expansão da área de eucalipto, até à data não se verificou qualquer alteração prática no terreno. A atual monocultura do eucalipto, que se verifica em muitas áreas da nossa região, é um dos maiores fatores de risco para a propagação e elevada extensão dos incêndios. A negligência e inação das entidades públicas não só agravam as condições que facilitam a propagação dos fogos como também provocam elevados prejuízos no futuro, com a degradação acelerada e irreversível do solo e a expansão descontrolada de espécies infestantes.
É preocupante a expansão descontrolada de algumas espécies exóticas, como a acácia e a erva-das-pampas na região. É urgente monitorizar e controlar este problema, dado que sem uma ação concertada contra a propagação descontrolada destas plantas invasoras, os custos ambientais e económicos serão enormes e os danos irreversíveis. Caso o controlo destas espécies invasoras não se iniciar, as intervenções para controlar esta espécie irão tornar-se mais complexas e muito onerosas.
Podas abusivas e destruidoras
Em 2019 continuaram-se a executar podas abusivas a centenas de árvores um pouco por todo o distrito. As intervenções realizadas evidenciam uma preocupante falta de conhecimentos na área da arboricultura. Seria de esperar, de alguns municípios da região, pelo conjunto dos seus valores paisagísticos, maior competência na gestão dos seus espaços verdes.
» Descargas poluentes nos rios e ribeiras:
– Os cursos de água continuam a registar elevadas concentrações de nutrientes e cargas orgânicas, associadas sobretudo a más práticas agrícolas com uso excessivo de fertilizantes e a descargas poluentes com origem urbana e industrial.
A Quercus Aveiro considera inaceitável que se verifiquem situações de incumprimento sistemático de diversas entidades e empresas da região. A fiscalização continua a ser insuficiente e a aplicação de sanções e suspensão ou cancelamento de licenças de descarga, sempre que se verificam situações de incumprimento sistemático, continua a ficar aquém do esperado.
A inexistência de saneamento básico em diversos pontos do distrito põe em causa a saúde pública e o ambiente. É urgente investir na expansão da rede de saneamento e de abastecimento de água.
Com a iniciativa Guarda-Rios, a Quercus Aveiro alertou para as ameaças que atingem os rios e ribeiras da região, apelando a todos os cidadãos da região que visitem regularmente os seus rios e ribeiras para verificar o estado de saúde dos ecossistemas.
» Abate indiscriminado de galeria ripícola no rio Vouga:
– A Quercus Aveiro denunciou e pediu explicações a um conjunto de entidades competentes relativamente ao abate indiscriminado da galeria ripícola na margem direita do rio Vouga no concelho de Albergaria-A-Velha.
Já não é a primeira vez que esta situação acontece. E em 2019, mais uma vez, repetiu-se a ação de destruição da já escassa galeria ripícola que nestes últimos anos, após o atentado anteriormente realizado, foi conseguindo recuperar.
Quantas mais toneladas de solo arável terão que ser erodidas para o leito do rio e quantos mais euros terão que ser gastos na recuperação dessas mesmas margens – muito provavelmente com emparedamento rochoso como tem vindo a ser feito um pouco mais a montante na margem do Vouga na freguesia de Eixo/Eirol, para evitar a erosão que as agora árvores cortadas tão bem evitavam?
» Sobreexploração dos recursos e captura ilegal na Ria de Aveiro:
– Os bivalves, capturados nas zonas proibidas da Ria de Aveiro, são comercializados ilegalmente e constituem um grave risco para a saúde pública. A captura por meio de métodos ilegais, que utilizam artes de arrasto pelo fundo ou redes rebocadas similares que operam em contacto com o fundo, destroem o ecossistema e a vida estuarina na Ria de Aveiro. Além disso, a apanha selvagem de casulo, uma espécie de verme utilizado como isco para a pesca, está a pôr em risco a existência de mais de duas centenas de espécies. Quando os apanhadores revolvem o fundo da ria onde há muitas espécies essenciais para o ecossistema que acabam por morrer.
» Fiscalização insuficiente:
– A articulação entre a Quercus e as entidades públicas tem sido muito importante para a identificação e acompanhamento dos crimes ambientais no distrito. No entanto, nos últimos meses, diversas denúncias ficaram sem resposta e não desencadearam qualquer procedimento legal. É urgente responsabilizar os responsáveis políticos e dotar estes serviços de meios humanos e materiais necessários para o cumprimento efetivo da missão e dos objetivos definidos.
Os melhores factos ambientais de 2019
– O Projeto Cabeço Santo continuou em 2019 a contribuir ativamente para a recuperação ecológica e paisagística de uma mancha florestal no concelho de Águeda, conseguindo aumentar a extensão da área à sua guarda. Este é um projeto único em Portugal, com uma área de intervenção de mais de 180 hectares.
Foram promovidas duas dezenas ações de voluntariado. As iniciativas contaram com cerca de 300 participações e mais de uma centena de visitantes. Durante o ano, dinamizaram-se ações de divulgação em diversos eventos nacionais, assim como diversas iniciativas de carácter pedagógico e educativo em instituições de ensino da região, no âmbito da iniciativa “Escolas Amigas do Cabeço Santo”. Durante os meses de agosto e setembro, a equipa técnica realizou diversas ações de vigilância noturna para detetar comportamentos de risco ou criminosos em zonas críticas. Foram semeadas e plantadas milhares de árvores autóctones e cortadas, arrancadas e descascadas milhares de acácias.
A empresa “A Bolseira SA” apoiou diversas ações e a ativista Constanze Flamme promoveu a concessão de donativos individuais no âmbito de um evento artístico realizado no Porto. Uma tonelada de celtonita oferecida pela Zeocel ainda no final de 2018 foi gasta nas plantações do Inverno. A IPSS “Os Pioneiros” ofereceu algumas das refeições para as jornadas voluntárias. A Critec deu algum apoio material e um donativo. A Associação Empresarial de Águeda disponibilizou-se para mediar o contacto com empresas locais.
Este ano trouxe também novos desafios. A necessidade de um novo enquadramento associativo constitui-se com uma oportunidade de refundar o projeto, criando-se uma associação local para a gestão da recuperação ecológica e paisagística do Cabeço Santo: a “Associação Cabeço Santo – Recuperação ecológica e paisagística”.
» ADRA lança nova campanha para ajudar a recuperar a floresta da região:
– A AdRA – Águas da Região de Aveiro, S.A., encontra-se a promover uma campanha em que, por cada 500 adesões dos seus clientes à fatura digital, doa 100 árvores para ajudar a Quercus Aveiro a recuperar a floresta da região.
Com esta campanha, para além de se associar e agregar a região em redor de uma causa que diz respeito a toda a sociedade, a AdRA pretende envolver os seus colaboradores em diversas ações de plantação em áreas do Cabeço Santo, em Águeda.
» Lançamento da iniciativa “Os Nossos Bosques”:
– O Núcleo Regional de Aveiro da Quercus lançou uma ação denominada “Os nossos Bosques”, com o objetivo de chamar atenção para as pequenas manchas de floresta autóctone que ainda existem na região e para as quais urge implementar medidas de proteção e de valorização.
A Quercus Aveiro vem, por isso, alertar para as ameaças que atingem os bosques da região e apelar às autarquias que apoiem os proprietários, promovendo o desenvolvimento de iniciativas de valorização destes ecossistemas.
A Quercus Aveiro apela a todos os cidadãos da região que localizem pequenas manchas de carvalhos, sobreiros, castanheiros, ou outras espécies autóctones, para que se possa verificar o estado de saúde destes ecossistemas e promover medidas para preservar e valorizar este património natural.
Os cidadãos podem enviar a localização dos bosques, bem como fotografias e vídeos para a [email protected], ou através da página de Facebook da Quercus Aveiro.
Recuperação das margens do Rio Vouga
Depois de efetuado o levantamento da informação científica e técnica que permitiu uma real caracterização do Sítio de Interesse Comunitário do rio Vouga, em Sever do Vouga, com vista a identificar lacunas e oportunidades de intervenção, iniciou-se a aplicação de medidas de gestão que pretendem revitalizar o rio Vouga, através de ações como a requalificação das suas margens.
Perspetivas ambientais para 2020
» Autarquias optam por alternativas aos herbicidas nos espaços públicos:
– A Campanha contra os Herbicidas em Espaços Públicos desafia as autarquias a abdicar do uso de herbicidas nos espaços públicos da sua responsabilidade e em alternativa optarem por métodos não químicos, nomeadamente a monda mecânica ou térmica. São ainda poucas as autarquias que aderiram a esta Campanha, pelo que, em 2020, a Quercus Aveiro espera que mais autarquias sigam o exemplo da autarquia de Castelo de Paiva, da União de Freguesias de Recardães e Espinhel e da Junta de Freguesia de Couto de Esteves que, na nossa região, já assumiram publicamente a mudança na prática do controlo de plantas infestantes.
» Melhoria das condições da Linha do Vouga:
– A Quercus Aveiro considera que a Linha do Vouga é uma infraestrutura com potencial para se poder tornar numa alternativa mais sustentável em termos de transporte para a região.
O investimento de 3,7 milhões de euros, feito em 2009, na supressão e automação de mais de 50 passagens de nível, como requalificação da linha, não pode ser desperdiçado.
A Quercus defende que é urgente a melhoria das condições da linha, a modernização do material circulante e a eletrificação da linha.
» Aplicação das políticas públicas na floresta da região:
– Necessidade de serem implementadas políticas públicas, promotoras da gestão sustentável da floresta e do desenvolvimento rural, equilibrando a despesa de prevenção com a despesa de combate a incêndios.
A Quercus Aveiro espera uma alteração séria das políticas públicas para a floresta, que promovam o investimento no mundo rural, defendendo a aplicação de algumas melhorias, como a diminuição das áreas ocupadas pelo eucalipto, a gestão da paisagem florestal em mosaico, a plantação de mais espécies autóctones e a aplicação de um plano nacional para o controlo ou erradicação de espécies infestantes.
Com o investimento na prevenção estar-se-á a investir no futuro e com a garantia de um maior retorno de que beneficiará toda a sociedade, travando este ciclo infernal de destruição.
» Mais e melhor investimento na sensibilização para a Conservação da Natureza:
– Face a um desinvestimento claro na área da conservação da natureza nos últimos anos por parte do estado central, é tempo de assumir os problemas de cariz ambiental e a conservação da natureza como prioritários. Mais investimento na sensibilização ambiental a desenvolver na região, seria um passo essencial para a mudança de comportamentos e atitudes e, dessa forma, constituiria uma oportunidade de informar a população para a importância da conservação da natureza.
* A Direção do Núcleo Regional de Aveiro da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza (Facebook).