As nossas crianças não !

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Hospitais (arquivo).
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Os profissionais de saúde, as pessoas mais expostas deste país, deverão deixar os seus filhos no mesmo estabelecimento de ensino para poderem estar todos ao serviço.

Por Carlos Cortes *

Carta enviada agora à Ministra da Saúde

“Exma. Ministra da Saúde,
Dr.ª Marta Temido,

Os profissionais de saúde, entre outros, estão na linha da frente do combate a esta calamidade de dimensão global. A situação de Portugal está cada vez mais delicada.

Os profissionais de saúde nunca estremeceram perante o perigo, em nenhum momento se amedrontaram e, apesar de saberem que podem ser os primeiros a ter contacto com o novo coronavirus COVID-19, assumiram plenamente o seu papel de tratar os seus doentes e de participar, desde a primeira hora, no esforço nacional.

Nunca baixaram os braços, mesmo percebendo que as autoridades deste país estavam, sobretudo na fase inicial, a ser negligentes na reação a esta pandemia. Desde a primeira hora, mesmo quando desvalorizou a ativação de medidas sérias e drásticas que teria sido ajuizado ter declarado mais cedo, foram sem hesitar para a frente de combate consciente que o país precisava agora deles, mais do que nunca.

Nunca demonstrou muita simpatia pelos profissionais de saúde. Nunca sentiram o seu apoio, nomeadamente nos momentos mais difíceis, quando mais precisaram.

Perante a coordenação desta crise que tem liderado, permitiu que os profissionais de saúde ficassem sem equipamentos de proteção, sem luvas, sem soluções alcoólicos e sem testes de diagnóstico. Nem vou enumerar o caos assistencial que estamos a passar, porque quero ter esperança que se venha a melhorar quando os procedimentos e circuitos forem aperfeiçoados.

Agora participou em medidas que felicito na sua globalidade. Uma delas, no entanto, causa-me uma profunda revolta de tão injusta e insensata que é.

“Decreto-Lei n.º 10-A/2020, artigo 10º

1 — É identificado em cada agrupamento de escolas um estabelecimento de ensino que promove o acolhimento dos filhos ou outros dependentes a cargo dos profissionais de saúde, das forças e serviços de segurança e de socorro, incluindo os bombeiros voluntários, e das forças armadas, os trabalhadores dos serviços públicos essenciais, de gestão e manutenção de infra-estruturas essenciais, bem como outros serviços essenciais, cuja mobilização para o serviço ou prontidão obste a que prestem assistência aos mesmos, na sequência da suspensão prevista no artigo anterior.”

2 — Os trabalhadores das atividades enunciadas no artigo anterior são mobilizados pela entidade empregadora ou pela autoridade pública.”

Esta medida não poderia estar mais errada. No plano humano, no plano da igualdade, no plano da solidariedade e no plano da estratégia da contenção do vírus e do funcionamento dos serviços de saúde.

Os profissionais de saúde, as pessoas mais expostas deste país, deverão deixar os seus filhos no mesmo estabelecimento de ensino para poderem estar todos ao serviço.

Já pensou na calamidade que pode criar se um destes pais, por contacto com um doente no hospital ou no centro de saúde, transmite a doença a um filho seu, esse aos seus colegas na escola e depois esses aos seus pais, aos professores…?

Já pensou que poderia pôr de quarentena centenas de profissionais e de pessoas com esta ideia irracional? Que está a criar vítimas desnecessárias? Porquê esta segregação?

Então não seria mais correto permitir que esses pais estejam com os seus filhos para depois poderem substituir os outros profissionais que ficarão exaustos perante este flagelo, criando necessários turnos nas unidades de saúde?

Faremos todos os sacrifícios! Colocaremos toda a nossa entrega. Estamos ao serviço do país e dos nossos doentes até à ultima gota da nossa força. Faremos os turnos que forem necessários.

Abdicaremos de tudo. Mas não nos peça que abdiquemos dos nossos filhos. Isso não seremos capazes. Não nos peça que, com esta medida insensata, coloquemos os nossos filhos em perigo e por seu intermédio os nossos colegas e outros profissionais. Não crie mais uma bomba-relógio com esta medida. Não nos peça este contributo irresponsável que irá esvaziar os hospitais de profissionais.

Esta não é uma solução. AS NOSSAS CRIANÇAS NÃO!

Continuamos cientes da nossa responsabilidade. Nunca iremos desistir até que esta calamidade esteja resolvida.

O país contará sempre com os seus médicos.

Carlos Cortes (Ordem dos Médicos, Centro).

* Presidente da Seção Regional do Centro da Ordem dos Médicos. (Informação ao minuto Covid-19 na RTP).

 

 

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