Não há tempo para desperdiçar as oportunidades que a floresta nos proporciona do ponto de vista económico, mas também do ponto de vista ambiental e climático. Urge implementar uma estratégia responsável, robusta e inclusiva, de muito longo prazo, que tenha em consideração as múltiplas dimensões da floresta.
Por Jorge Cristino *
2022 é o ano internacional das ciências básicas para o desenvolvimento sustentável e nada melhor do que potenciar as atividades essenciais e primárias, de relação direta com a natureza, para ajudar a atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030.
Por esta mesma razão é importante lembrar que este ano comemorámos 150º aniversário do Dia da Árvore, pois tudo começou a 10 de abril de 1872, há 150 anos, quando o seu mentor, o jornalista e político Julius Sterling Morton, incentivou a plantação ordenada de árvores na cidade do Nebraska, nos Estados Unidos da América, promovendo o “Arbor Day”.
Comemorou-se ainda os 50 anos do Dia Mundial da Floresta, celebrado pela primeira vez em 1972, bem como os 30 anos do Dia Mundial da Água, aprovado em 1992, pelas Nações Unidas, sendo que, em junho próximo, celebraremos 50 anos da Conferência de Estocolmo, a primeira reunião à escala global centrada na necessidade de resolver problemáticas ambientais que ocorreram após o impacto económico do período a seguir à Segunda Guerra Mundial.
Passadas todas estas décadas e apesar destas iniciativas, foram destruídos no mundo cerca de 420 milhões de hectares de floresta, desde 1990, para a exploração agrícola.
Na última década, a cadência foi de 10 milhões de hectares/ano de desflorestação. Em Portugal, a perda foi de 3% de área florestal nas últimas três décadas (enquanto a União Europeia aumentou a sua floresta em 10%). Ainda assim, 30% da superfície terrestre está coberta por florestas, local de excelência de sumidouro de carbono. Em Portugal, a área florestal ocupa 3 milhões de hectares, o equivalente a um terço do País.
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As florestas, em conjunto com as algas marinhas são os “pulmões do mundo”, não apenas pela sua função de manutenção e renovação dos ecossistemas, como também pela sua importância em áreas estratégicas, como a economia e a produção de bens e alimentos, tão importante nos dias de hoje, de escassez de recursos.
São sobejamente conhecidas as vantagens de uma floresta sustentável, diversificada e multifuncional, assim como os benefícios dos recursos que daí advêm, sejam ambientais, sociais e económicos. Além de uma adequada gestão florestal integrada e multidisciplinar, é sobretudo necessária uma política capaz de traduzir as preocupações ao nível do combate à perda da biodiversidade, de alavancagem do rendimento económico e de inversão da desertificação do mundo rural, e, nalguns casos, orientadora da adaptação às alterações climáticas, bem como, de amplificação da função de sumidouro de carbono, neste caso como mitigação, e ainda por todo o serviço de ecossistema prestado à Humanidade.
Devemos, por isso, considerar 5 principais dimensões da floresta, em função dos seus serviços essenciais:
A primeira dimensão é a climática, pelo papel remediador global que presta, essencial no equilíbrio necessário do sistema terrestre, considerando as crescentes emissões de gases de efeito de estufa.
Uma segunda dimensão é a patrimonial, pela riqueza que representa para o planeta ao nível global, mas também para os estados em particular, necessitando, por isso, também, de ser vista como Património Comum da Humanidade, devendo ser mais valorizada e mais protegida.
A terceira dimensão é geobiológica, considerando a importância que a Floresta representa para o solo, quer quanto ao seu uso e ocupação, quer quanto à garantia que presta no fomento da biodiversidade, quer no impedimento da sua degradação e erosão.
A quarta dimensão situa-se na vertente territorial, ou se quisermos de ordenamento, quanto falamos na dicotomia rural e urbano. Em função do tipo de Floresta, é possível e desejável ter Florestas que desempenhem vários usos. Nas áreas urbanas, melhorando a qualidade do ar, diminuindo a temperatura das cidades, reduzindo o ruído, promovendo a biodiversidade urbana, servindo de áreas tampão para impedir a construção com a consequente impermeabilização de solos e evitando cheias e inundações, bem como melhorar a saúde e a qualidade de vida das pessoas, como recentemente a Organização Mundial de Saúde veio atestar. Nas áreas rurais, promovendo os serviços agrosilvoambientais e a produção de produtos endógenos, assim como na otimização da agricultura e sobretudo como proteção dessas mesmas áreas.
A quinta e última das dimensões da floresta é a (bio)económica. Não tenhamos ilusões quanto às vantagens que advêm de uma Floresta multifuncional que também possa ser produtiva e dar o rendimento necessário, principalmente tendo em conta a quantidade de produtos e subprodutos que são criados a partir desta área, ao mesmo tempo que continuam a ser prestados os serviços de ecossistemas úteis para a compensação da atividade antropológica.
Tendo em conta estas cinco dimensões da floresta, existem duas medidas essenciais a implementar.
A primeira é a de promoção de uma campanha consistente e de longo prazo de (re)arborização, ordenada, integrada e financiada, permitindo a criação e o alargamento de uma floresta cada vez mais de matriz autóctone em todo o País. Esta operação, onde o cadastro é o incontornável ponto de partida, poderia ser não só financiada pelo Fundo Ambiental, como também, diretamente pelas entidades que necessitem ou queiram ver a sua atividade compensada pelas suas emissões, criando assim um “mercado de carbono” de autorresponsabilidade ambiental.
A segunda é a urgente quantificação e valorização da Floresta enquanto Património Natural de modo que os proprietários possam vir a ser financeiramente compensados quanto aos serviços de ecossistema prestados e não apenas quanto ao produto ou recurso propriamente dito. Esta medida, neste momento, além de urgente, é a mais evidente nesta conjuntura que atravessamos de crise climática.
Já não há tempo para desperdiçar as oportunidades que a Floresta nos proporciona, quer do ponto de vista económico, quer do ponto de vista ambiental e climático. De facto, urge, definitivamente, implementar uma responsável e robusta estratégia de rentabilização de todo o espaço Florestal nacional, urbano e rural, assente numa visão holística e de (muito) longo prazo, onde toda a sociedade pode e deve ser ativamente envolvida.
* Mestre em Relações Internacionais, pela Universidade do Minho. Autor de “A missão das cidades no combate às alterações climáticas” (2021). Artigo publicado originalmente no site Florestas.pt.
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