As mesas dos cafés, a globalização e a crise das utopias

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Praia da Torreira.

No tempo em que vivemos, a que já alguém chamou “era da técnica”, a mesa do café saiu pela porta, pela janela, por onde pôde e estendeu-se pelo mundo. Globalizou-se.

ahcravo gorim *

As conversas alargaram-se aos cinco continentes, passeiam pelas ruas de todos os países, a distância morreu nos braços do WWW e tudo pode ser aqui e agora.

As redes sociais não são mais que a mesa do café globalizada. Quem o não entender hoje, terá dificuldade em estar no amanhã.

Veja-se a recente eleição de Bolsonaro como Presidente do Brasil e de Trump nos Estados Unidos, e as polémicas que geraram. No entanto, Obama foi dos primeiros a utilizar as redes sociais numa campanha eleitoral, que venceu, embora sem quaisquer polémicas.

Assim sendo o que é que as separa? Se o meio é o mesmo, a polémica só pode ser gerada pelos conteúdos, não na exposição das opções políticas, essas claramente diversas, mas por um qualquer outro motivo. Em relação à eleição de Bolsonaro soubemos pelas televisões, e pelas redes sociais também, que tinha difundido a notícias falsas sobre os seus adversários – note-se que na moderna linguagem da comunicação, mentira e falsidade são “inverdades”.

Será que isso só acontece nas redes sociais? E nos meios de comunicação tradicionais? Argumentarão os defensores destes que sendo os seus profissionais jornalistas, obedecem a regras deontológicas e de credibilidade que as redes sociais não contemplam. Seria verdade se não estivéssemos atentos às “notícias” que nos são servidas a toda a hora. “Notícias” que constroem redes sociais nas velhas mesas de café, gerando conversas que se debruçam sobre o “estado a que isto chegou !”.

As redes sociais são o inimigo número um da verdade na informação? Claro que não.Tal como não se pode dizer que os automóveis são o maior inimigo do homem, apesar dos últimos dados sobre os mortos causados por acidentes com automóveis.

A internet veio pôr à disposição do homem novas formas de comunicação, não criou um homem novo. Vivemos num tempo em que a crise das utopias se faz sentir ao nível dos valores e da ética: vale tudo desde que eu ganhe! O “nós” é um eu sem vergonha.

“Caro leitor” , sejamos claros e directos, vivemos numa sociedade onde o dinheiro comanda a vida – “… hoje tudo é mercado” escreveu Rosa Montero. António Gedeão neste momento, onde quer que esteja, só tem pesadelos.

Sei que escrevo esta crónica num jornal local digital, e o que escrevo aqui também o faço nas redes sociais, não é criado no silêncio dos corredores, numa fábrica das inverdades ou à mesa onde come a alta finança e tudo se planeia. Escrevo-o aqui e …. se já piquei de algum modo a sua curiosidade ou lhe abri uma janela para espreitar de outra forma a realidade que lhe servem em directo, já foi bom.

Até breve, aqui ou numa qualquer rede social perto de si.

* mestre de artes e ofícios.

(nota esta crónica surge na continuação da anterior e encerra-a)