Nos últimos anos, a cidade de Aveiro tem sido pródiga em requalificações de artérias urbanas, de parques, e outros espaços públicos.
Naturalmente, a ADERAV e a BioLiving reconhecem a necessidade de tais intervenções, quando estas visam melhorar as condições de acessibilidade, a qualidade dos residentes e visitantes, e promover boas práticas ambientais e sociais. Porém, verificamos que a modernização dos espaços tem sistematicamente comprometido o tecido arbóreo da cidade, o que constitui obviamente um paradoxo face às premissas ambientais declaradas.
O recente anúncio da requalificação da Av. 25 de Abril deixa-nos muito preocupados, pois prevê “uma nova estrutura arbórea”. Se a intervenção seguir os moldes a que o executivo camarário nos foi habituando, o trabalhado eufemismo camufla um real abate das dezenas de choupos-brancos que ladeiam a avenida. Estes choupos, na sua grande maioria, apresentam uma adequada condição fitossanitária, pelo que o seu abate não faz qualquer sentido do ponto de vista da gestão do risco, pois ainda muitos anos de vida lhes estão reservados.
Representam um património cultural e iconográfico enraizado na cidade e profundamente apropriado pelos residentes da avenida que, ante a sua perda, se verão desprovidos dos elementos identitários fundamentais da sua área de residência. Já para não mencionar os serviços dos ecossistemas proporcionados por estas árvores de grande porte, entre os quais a regulação térmica de uma avenida onde escasseiam outros elementos vegetais, a capacidade de infiltração de água e prevenção de cheias, a capacidade de “filtração” do ar e acumulação de gases, partículas poluentes e outros agentes patogénicos, a promoção da biodiversidade (nomeadamente de aves e insetos, que nas árvores encontram os poucos locais favoráveis à sua ocorrência), entre tantos outros.
A eventual substituição destes choupos de grande porte por uma estrutura arbórea com árvores de menor porte, ou por espécies arbustivas, como vai sendo habitual na cidade é uma tentação fácil se a solução urbanística for, simplesmente, a de “aproveitar” o espaço. Todavia, existirão, com certeza, dezenas de soluções de planeamento urbano que permitirão a conciliação da requalificação com a manutenção deste património de valor incalculável.
Já anteriormente, a ADERAV e a BioLiving manifestaram as suas preocupações com este mesmo património, uma vez que as intervenções de abate têm sido habitualmente planeadas sem suporte de um estudo fitossanitário adequado, constituindo atos ambientalmente e culturalmente irreversíveis e necessariamente irrefletidos.
Somos totalmente a favor da requalificação para a promoção da mobilidade suave e das boas práticas ambientais e sociais. Somos a favor da modernização dos espaços e da facilidade de acesso e usufruto dos espaços públicos. Mas somos também a favor da manutenção e valorização do património arbóreo, que é também social, cultural, ambiental, económico e incontornável no plano da saúde pública e da qualidade de vida.
Somos ainda apologistas das decisões democráticas e participadas, pelo que lançamos o desafio à edilidade aveirense de abrir as requalificações urbanas ao debate prévio, auscultando os cidadãos, as pessoas que vivem o território no seu quotidiano, construindo políticas de sustentabilidade modernas, participadas, inteligentes e eficientes.
Manifestamos ainda a nossa disponibilidade para colaborar nesta eventual discussão participada e para facultar apoio técnico-científico, se ao bem comum os nossos conhecimentos e praxis forem úteis.
ADERAV (Associação para o Estudo e Defesa do Património Natural e Cultural da Região de Aveiro) e a Associação BioLiving, ONGs de defesa do ambiente e promoção da cultura.