Acesso à habitação: um direito fundamental

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Habitação Social, Orreiro, S. João da Madeira.
Natalim3

Há certas condições que são indispensáveis para que qualquer ser humano possa crescer, pelo menos, no plano bio-psico-social de forma equilibrada: alimentação, educação/instrução, saúde e habitação. Defende-se – estou de acordo – que uma, senão a mais importante, é a educação/instrução.

Por Eugénio da Fonseca *

Todavia, é importante nunca esquecer, que mesmo em países, constitucionalmente, obrigados a facultarem o acesso a estes direitos às suas populações, a maior parte deles está muito longe de cumprir esta obrigação. Poderá haver pessoas que, não tendo acesso a uma alimentação adequada, a uma habitação condigna e a cuidados de saúde essenciais, consigam, ainda assim, atingir notáveis níveis de educação/instrução, mas, há que reconhecê-lo, à custa de muito maiores esforços; contudo, o mais provável, é que muitos nunca cheguem a atingir as metas almejadas. É que, por detrás destas dificuldades de acesso estão geradas gritantes desigualdades socioeconómicas, cujas causas radicam nos reduzidos ou nulos rendimentos financeiros.

Nos últimos meses, um dos assuntos mais mediáticos da agenda político-governativa tem sido a preocupação com os enormíssimos problemas causados pela falta de acesso à habitação. Mais uma vez se volta a falar de realojamentos, da necessidade de mais habitação social, de casas devolutas, de incentivos contra a desertificação do interior. Entretanto, instalou-se mais uma crise económico-financeira na Europa. Pelas razões já conhecidas, somos, de novo, atingidos por uma monstruosa inflação que deixa os pobres mais pobres e empobrece a classe média. O que está a acontecer no domínio da habitação é do conhecimento público. Autênticos dramas a atingir milhares de famílias. Rasga-me a alma não ter visto, ainda, aparecer um Plano de Emergência para socorrer esta gente, a maior parte, casais jovens. Houve sempre muito dinheiro para financiar os Bancos, mas não haverá algum para ajudar aliviar dívidas, não fraudulentas? Das entidades financiadoras não se pode esperar qualquer forma de solidariedade, porque “o capital não tem coração” já o disse D. Manuel Martins. É preciso um novo apoio, porque o concedido até agora, pelos ecos que me chegam, foi pouco abrangente e está a tardar em chegar a quem se candidatou. Estamos perante uma situação inimputável às pessoas que dela estão a ser vítimas. Como o foi com alguns bancos, o Estado também tem de ser solidário com os cidadãos e corresponsabilizar-se pelo capital de risco, assumido por eles, ou, então, levar os bancos a permitir reequacionar novas cláusulas de empréstimo mais adequadas aos rendimentos dos credores.

Um Estado democrático, regido por uma Constituição que no n.º 1, do seu artigo 65.º afirma categoricamente que: «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.» e no número seguinte descreve as condições para que isso aconteça, e estabelece, nomeadamente, no nº 3: “O Estado adotará uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria”.

Não se pode considerar que vivemos numa verdadeira democracia, enquanto Governo e Partidos, com representação parlamentar, não encontrarem estratégias conjuntas para alcançar tão incontornável desígnio.

Imagino as repercussões que este gravíssimo problema estará a ter no que respeita às comparticipações das famílias. O Governo do nosso país está habituado a que, em tempos de crise, as IPSS reforcem a sua solidariedade, não negando a prestação de serviços a quem, por privação de recursos financeiros, deixou de poder assumir os seus compromissos.

Mas penso que as IPSS poderão dar um contributo maior na superação deste flagelo nacional ao:

• Sinalizar à autarquia situação de utentes da instituição, (com a concordância dos próprios e a participação deles), que vivam em condições de habitabilidade ou de salubridade indignas;

• Promover uma ação de sensibilização sobre créditos à habitação e como lidar com esta situação atual de maior risco;

• Disponibilizar um serviço de atendimento para quem queira apresentar as suas dificuldades relativas a este problema, identificá-las, registá-las, procurar esclarecimentos e encaminhar quem precisar desse apoio.

Outra sugestão, que não é nova no setor das IPSS, é a criação de Cooperativas de Habitação. Os tempos não são os mais propícios. Mas deixo o desafio para um médio prazo. Poderia ser mesmo uma experiência a realizar inter-IPSS em estreita articulação com as respetivas Uniões Distritais. Os modelos são muito diversificados, mas não apostaria numa metodologia que não implicasse, desde a construção, os cooperantes futuros proprietários ou residentes. Tenho consciência de que não se trata de um desafio fácil. Mas é uma aposta que visa colocar as IPSS, como sempre gostava de as ver, como forças motrizes do desenvolvimento socio-local, no qual a habitação tem um papel relevante. Para além de tudo, acredito que os dirigentes das IPSS continuam a ser gente audaz.

* Artigo publicado originalmente no site Solidariedade.pt.

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