É já habitual surgirem com grande impacto mediático visões e expressões culpabilizantes que apontam responsabilidade pessoal a quem está na pobreza, seja àqueles que já nasceram nessa situação e dela não saíram, seja àqueles outros que, tendo tido uma vida socioeconomicamente equilibrada, foram empurrados para a pobreza e para a exclusão social por acontecimentos inesperados tais como a doença incapacitante, o desemprego prolongado, a inflação acelerada.
Por João Maia Marques *
Com a difusão de tal tipo de avaliação e da correspondente pressão comunicacional, os seus proponentes e defensores pretendem reprovar os orçamentos públicos aplicados nas políticas sociais referentes à luta contra a pobreza e a exclusão social, e igualmente inibir a vontade e limitar a ação de pessoas e de organizações que procuram restaurar e manter a dignidade humana das pessoas pobres.
Colateralmente, pessoas psicologicamente menos bem estruturadas chegam a desenvolver sentimentos de culpa pela situação de pobreza em que se encontram, ficando ainda mais fragilizadas e tornando ainda mais complexa e mais custosa a sua recuperação pessoal e social.
Para justificar a falta de propostas e a ausência de medidas concretas e de ações práticas, os estudiosos e os decisores políticos invocam desculpabilizantes complexidades extremas da matéria usando a pobreza como um conceito, como uma noção abstrata.
Nesse âmbito, procuram segmentar, e catalogar, e quantificar casos avulsos de diversas origens e com diferentes características, para assim tipificarem e elencarem numerosos grupos sociais, coesos nas suas vulnerabilidades.
Como se esperaria, a diferentes promotores correspondem diferentes tipificações, e cada promotor defende a sua como a única base incontroversa para as imprescindíveis medidas a tomar no combate à pobreza. Infelizmente, tão laborioso trabalho desenvolve-se subalternizando – ou mesmo relegando para o esquecimento – a evidência insofismável de que a pobreza é constituída por pobres e que cada pobre é, de facto, uma pessoa situada em si mesma e condicionada pelas suas passadas e presentes circunstâncias envolventes. E isso é o facto primordial.
Sem culpa nem desculpa, ajamos nós considerando esse facto em relação a quem vive na nossa proximidade.
* Fórum da cidadania de Aveiro contra a pobreza / EAPN.
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