
No que concerne aos desafios da sustentabilidade, a IA tem desempenhado um papel fundamental. Ela é utilizada para prever o consumo de energia, permitindo que as empresas planeiem e otimizem o seu uso, reduzindo picos e custos associados.
Por Ana Pires *
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Já existem sistemas de automação em edifícios que empregam a IA para controlar o consumo de energia em tempo real, ajustando a iluminação, aquecimento e arrefecimento conforme as condições ambientais e de ocupação. Adicionalmente, a IA encontra aplicações na gestão de recursos hídricos e na reciclagem de resíduos.
No entanto, a crescente utilização de IA para acelerar esforços e encontrar soluções para desafios comuns requer a análise dos impactes ambientais da IA e das subáreas, assim como das preocupações éticas. No artigo publicado na revista Nature India, Banipal e Mazumder (2024) referem que, caso a IA generativa fosse usada diariamente por todos os habitantes do planeta, a pegada de carbono anual total poderia atingir cerca de 47 milhões de toneladas de CO2eq, contribuindo para um aumento de 0,12 % nas emissões globais.
Mas os impactes ambientais não são apenas o aquecimento global. Também a pegada hídrica é um problema a ser considerado. A água que é consumida para arrefecer os centros de processamento de dados (data centres) que alojam os modelos de IA não pode ser reutilizada. No artigo de Li et al. (2023), foi quantificada a quantidade de água consumida por large language models (LLM) como o ChatGPT. Os autores estimaram que eram consumidos 500 mL de água por cada 20-50 consultas, sendo a água perdida diretamente por duas vias: evaporação, devido ao calor, e a descarga de água, à medida que o hardware dos centros de processamento de dados é arrefecido. Indiretamente, também ocorre o consumo de água, nomeadamente pela produção de eletricidade necessária para os centros de processamento de dados funcionarem. Se forem realizadas 105 mil milhões de solicitações diárias, tal corresponde a 383 mil milhões de litros num ano. Este montante é equivalente a sustentar a ingestão anual de água de 328 milhões de pessoas (Li et al., 2023).
Para além da pegada do carbono, a IA é responsável pela elevada produção de resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE). Os centros de processamento de dados têm necessidade de renovar os seus equipamentos com alguma periodicidade, o que obriga à substituição por equipamentos novos e ao encaminhamento dos resíduos produzidos para reciclagem ou aterro. Segundo Wang et al. (2024), os REEE podem alcançar entre 1,2 a 5 milhões de toneladas durante 2020-2030, podendo a quantidade aumentar devido à rápida rotatividade de servidores para reduzir os custos operacionais. Também a área de solo que ocupam é considerável, o que pode impactar a biodiversidade existente na região onde se encontram.
O contributo da IA para a vida dos cidadãos também é bastante promissor em vários domínios como a saúde, as finanças e a educação, apenas para referir alguns. No entanto, as preocupações com potenciais efeitos adversos têm suscitado perspetivas divergentes, que vão desde os riscos para a privacidade até à crescente desigualdade social. Paes et al. (2023) apontaram como possíveis impactes sociais o receio da IA retirar postos de trabalho nas áreas do comércio, indústria e transportes. Rakwski e Kowaliková (2024) salientaram que o uso da IA tem impactes sociais e políticos, nomeadamente as alterações no poder político através da cultura política, que podem fortalecer ou enfraquecer as posições dos governos, das empresas, da sociedade civil e dos indivíduos. Além disso, há uma mudança na estrutura social, à medida que a tecnologia digital altera o modo como as pessoas comunicam com a sociedade, alterando-se os valores sociais, pois as tecnologias digitais influenciam a perceção e a avaliação do mundo que nos rodeia (Rakwski e Kowaliková, 2024).
A IA terá de fazer um caminho para ser mais sustentável, e esse caminho passa por olhar para ela própria e encontrar soluções. A chamada computação sustentável (sustainable computing) já está a dar os primeiros passos e, com a ajuda da IA, poderá alcançar práticas ambientais e sociais cada vez mais responsáveis. A mitigação da pegada de carbono pode passar por modelos de IA eficazes que não necessitem de dados extensos. Também a mudança das operações de IA para centros de processamento de dados com eficiência energética ajudará a reduzir a pegada de carbono e a pegada hídrica. A reutilização e reciclagem da água nesses centros poderão, igualmente, diminuir o consumo de água potável. No que concerne os REEE, a redução da sua produção deve passar por estratégias de Economia Circular ao longo da cadeia de valor e pela gestão proativa dos equipamentos. Já os impactes sociais necessitam de ser minimizados, sendo apontado por diversos organismos a regulamentação das tecnologias digitais, o apoio à sociedade civil e a educação do público.
* Doutorada em Engenharia do Ambiente, CEO da Dimera. Artigo publicado originalmente no site Intermetal.
Referências
Banipal, I. S. & Mazumder, S. (2024) How to make AI sustainable. Nat India. https://doi.org/10.1038/d44151-024-00024-8
Li, P., Yang, J., Islam, M. A. & Ren, S. (2023) Making AI less “thirsty”’: Uncovering and addressing the secret water footprint of AI models. ArXiv abs/2304.03271
Paes, V.M., Silveira, F.F. & Munhoz, A.C.S.A. (2023) Negative Social Impacts of Artificial Intelligence and the Main Mitigation Actions: A Systematic Review. In: Pereira, L., Krus, P., Klofsten, M. (eds) Proceedings of IDEAS 2022. IDEAS 2022. Design Science and Innovation. Springer, Cham. https://doi.org/10.1007/978-3-031-29129-6_3
Rakowski, R. & Kowaliková, P. (2024) The political and social contradictions of the human and online environment in the context of artificial intelligence applications. Humanit Soc Sci Commun 11, 289. https://doi.org/10.1057/s41599-024-02725-y
Wang, P., Zhang, L.-Y., Tzachor, A. & Chen, W.-Q. (2024) E-waste challenges of generative artificial intelligence. Nat Comput Sci 4, 818–823. https://doi.org/10.1038/s43588-024-00712-6
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