Entre os partidos com acento parlamente – excetuando as coligações como a AD e, em tempos, a CDU – a Iniciativa Liberal é, até onde sei, o único partido a empregar um pronome feminino, o que, aliás, se percebeu pela forma como me acabei de referi a ela.
Por Por O VAZ *
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Nenhum outro partido, ao longo da história da política portuguesa, ousou identificar-se como uma lady. Nem mesmo o BE, PAN ou Livre que, aparentemente, teriam mais propriedade para tal. A título de comparação, a Iniciativa Liberal surge, de certa forma, como uma “vitória” na luta pela desigualdade de género político-partidária.
Até 2019, ano da sua entrada na AR, este e outros partidos femininos limitavam-se a ocupar o espaço de governo sombra. Elaboravam propostas de lei que, na maior parte das vezes, não passavam de sonhos utópicos, como a redução da carga fiscal sobre as recargas de aspiradores. Outras vezes, os assessores desses partidos propunham a um grupo de deputados de um partido masculino que abrissem uma CPI ao caso BES – a saber, o escândalo da instituição Balde Esfregona e Sabão.
Entre essas atividades, ainda sobrava tempo para organizar o pudim às terças-feiras como sobremesa na cantina da AR ou preparar os arranjos de flores para a sessão solene do 25 de abril. Enfim, entre outras atividades estereotipadamente femininas.
Até que, cansada deste trabalho de escrava, a IL bateu o pé e disse “PS, PSD, vou candidatar-me sozinha ao vosso cargo. E até digo mais! Vou roubar tantos votos ao CDS que daqui a duas legislaturas vai estar reduzido a pó como o Freitas do Amaral”. Assim disse, assim fez. A IL tornou-se o primeiro partido político feminino a ganhar assento parlamentar e romper com o patriarcado partidário. Ou será que não?
Na verdade, em tempos antigos, existiu também um partido que se dizia feminino. Em tempos onde as mulheres nem direito ao voto tinham, houve um partido que se ergueu como um monstro político, que prometia acabar com a crise política da 1ª República. Forte que nem a padeira de Aljubarrota, revolucionária como a Maria da Fonte, e robusta como Vera Lagoa. Esse partido, a União Nacional.
Fundado em 1930 por um tal de António de Oliveira, a União Nacional ostentava uma aparência de modernidade e igualdade – mesmo no auge da sua repressão – aparentava estar à frente do seu tempo. A ideia da combinação de partidos de extrema-direita e figuras femininas apenas começou a ganhar forma nos dias atuais, com figuras como Marine Le Pen ou Giorgia Meloni. E se Portugal foi, de facto, precursor nesta modalidade, poderíamos então classificar a nossa ditadura com uma ditadura feminista?
Acredito que, de algum modo, foi uma ditadura incompreendida, em que, para se fazer ouvir, a mulher teve de se esconder sob a máscara de um governo macho. No entanto, foi nesse silêncio forçado que a verdadeira política germinou, silenciosa, mas eficaz. Afinal, como sempre, é no poder que as mulheres se revelam imbatíveis. Eles só não repararam que o mundo sempre foi delas.
* Cineasta. [email protected]
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