ADN ambiental ou eDNA: dados que protegem a biodiversidade e transformam ecossistemas

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Recolha de amostras de ADN ambiental, em Arouca. (foto partilhada pelo site Florestas.pt).

Já ouviu falar de eDNA ou ADN ambiental? Saiba como a recolha e análise do material genético deixado no ambiente pelos seres vivos ajuda a conhecer a biodiversidade de determinado ecossistema e a monitorizar a sua evolução. Estes são passos essenciais para atuar eficazmente na sua conservação.

Por António M. Mendes *

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Enfrentamos tempos de aceleradas mudanças climáticas que pressionam os ecossistemas e forçam os seres vivos a ajustar-se de uma forma sem precedentes. O colapso da biodiversidade é uma das maiores ameaças e um desafio urgente para a nossa sociedade. No entanto, a complexidade dos dados e a ausência de processos simples e eficazes para medir e monitorizar o estado da biodiversidade têm sido barreiras significativas à implementação de ações de proteção concretas e em larga escala.

Neste cenário, o ADN ambiental (do inglês: environmental DNA – eDNA) destaca-se como uma solução transformadora, que nos últimos anos tem redefinido a forma como monitorizamos e protegemos a biodiversidade.

O eDNA é uma ferramenta que permite recolher dados indispensáveis sobre biodiversidade de forma rápida, precisa e económica, promovendo uma gestão ambiental sustentável e a implementação de práticas mais eficazes de conservação.

Com base na análise do material genético deixado no ambiente pelos seres vivos, como pelos, células de pele e secreções, o eDNA permite identificar espécies presentes num determinado local apenas através da análise de amostras de solo, água, vegetação ou ar, sem necessidade de capturar ou observar diretamente os organismos.

Tal como a polícia utiliza fragmentos de ADN para identificar suspeitos numa cena de crime, a alta sensibilidade e especificidade do ADN ambiental possibilitam a deteção de espécies raras ou difíceis de observar, incluindo microrganismos e pequenos invertebrados do solo. Esta abordagem oferece uma imagem holística das interações ecológicas e da saúde dos ecossistemas, sem os perturbar.

Em comparação com métodos tradicionais, como censos visuais e captura com redes ou armadilhas, que são morosos e dispendiosos, o eDNA é mais rápido e eficiente, permitindo a monitorização recorrente em larga escala.

Recolha de amostras de ADN ambiental, em Arouca. Em poucos dias, quase 400 organismos identificados por ADN ambiental. Um exemplo prático do potencial e da simplicidade do uso de eDNA no sector agroflorestal é o estudo realizado pela SGS, a Navigator e a consultora 2bforest, que mapeou a biodiversidade de zonas de produção e de conservação em duas florestas maioritariamente de Eucalyptus globulus no norte de Portugal.

Em poucos dias de trabalho de campo, foi possível identificar por eDNA a presença de 398 espécies ou géneros distintos de organismos, incluindo 48 espécies de vertebrados, algumas com estatuto especial de proteção segundo a International Union for Conservation of Nature (IUCN).

Este estudo criou um referencial de base para a biodiversidade que auxilia na gestão sustentável destas florestas, permitindo avaliar a eficácia de diferentes intervenções e praticas na conservação da biodiversidade local. Além disto, forneceu uma métrica auditável para relatórios de sustentabilidade que pode facilitar o acesso a financiamentos verdes e mercados emergentes de biodiversidade.

Outro exemplo inovador – e que revela o potencial do eDNA para facilitar a deteção precoce de pragas – é um estudo realizado pela SGS e pelo RAIZ – Instituto de Investigação da Floresta e Papel, cujo objetivo foi identificar e monitorizar os principais insetos polinizadores de eucalipto. Em duas parcelas relativamente pequenas, além da identificação de 143 espécies de insetos, incluindo 14 espécies de polinizadores, foi possível identificar três das principais pragas do eucalipto no território nacional – Trachymela sp., Blastopsylla occidentalis e Gonipterus platensis –, apenas analisando os fragmentos de ADN deixados pelos insetos ao pousarem nas flores de eucalipto para se alimentar.

Proteger a biodiversidade é mais do que um desafio, é a uma responsabilidade coletiva que depende de ações concretas e inovadoras. O ADN ambiental é uma ferramenta científica que não vem substituir os métodos tradicionais, mas sim complementá-los, facilitando uma monitorização mais frequente e acessível, com dados padronizados que apoiam intervenções estratégicas. Desta forma, não só contribui para a proteção da biodiversidade, mas também abre caminho a novas estratégias de sustentabilidade e à construção de um futuro onde natureza e sociedade prosperem em equilíbrio.

* Biólogo Molecular Sénior. Field Application Specialist no Global Biosciences Center, da SGS – empresa global, líder em testes, inspeção e certificação, em Lisboa. Artigo publicado originalmente no site Florestas.pt.

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