12 conselhos sobre jovens agricultores

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Agricultura.

Ouvimos muitas vezes os mais velhos lamentarem a falta de jovens na agricultura, nas associações e nas cooperativas agrícolas, ouvimos discursos simpáticos e condescendentes sobre os jovens.

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Antes de 12 conselhos, duas notas prévias: a primeira é são conselhos sobre jovens, não conselhos para os jovens, mas os jovens, se quiserem, também podem ler, porque se Deus quiser, daqui a pouco já não são jovens e estarão a falar e fazer como nós, os mais velhos. Ainda me lembro, parece que foi ontem, estava no recreio ao lado da Casa-Escola Agrícola Campo Verde, ao lado da antiga casa da D. Laura que agora é sede da Junta de Freguesia de S. Pedro de Rates, Póvoa de Varzim, e ouvi os meus colegas de 18 anos criticarem os alunos mais novos, com 15 anos, por jogarem no computador em vez de jogar à bola como nós tínhamos jogado no campo que, entretanto, deixou de existir porque foi urbanizado. Segunda nota, decidi escrever sobre jovens agricultores depois de reparar que dentro dos tratores e dentro da organização dos cortejos de Natal que animaram várias localidades do nosso país, estiveram muitos (e muitas!) jovens agricultores e por trás desses jovens e desses tratores está o trabalho de famílias e gerações. Tal como o dinheiro, os “jovens agricultores” não caem do céu nem crescem nas árvores, tem de ser semeados, acompanhados e ajudados a crescer. Agora os conselhos:

– Para termos jovens agricultores temos de criar gosto na agricultura desde que nascem, têm de sentir que os pais gostam de ser agricultores, têm de brincar com tratores, cheirar as vacas, as ovelhas e os porcos, acompanhar os pais nas feiras agrícolas, no estábulo, na estufa, na cabine do trator ou da debulhadora ou até nas corridas de tratores. E foi aí, numa corrida de tratores a que também fui assistir com o meu filho pela mão, que reparei numa troca de olhares desiludidos entre o filho (um miúdo talvez com 10 anos) e o pai que acabara de perder uma das provas. A corrida foi perdida, mas o miúdo, aposto, está ganho para a agricultura…

– “Meu filho, quer queiras, quer não, vais ser bombeiro voluntário!…”, contava o Raúl Solnado numa das suas rábulas divertidas. Amigos, isto não vai à força, não vale a pena obrigar, até é pior, temos de preparar, propor e depois respeitar a liberdade e manter a porta aberta. A história da agricultura e até a Bíblia estão cheias de “filhos pródigos” que acabam por regressar a casa ou que primeiro dizem que não e depois vão “trabalhar para a vinha”.

– Miguel Cavalcanti, do Agrotalento, numa formação sobre gestão e sucessão, chamou a atenção para os abridores de portões: “Uma das primeiras tarefas que uma criança com 4 anos, ou pouco mais, pode fazer, e a torna feliz, é abrir o portão quando é preciso passar a cerca com o trator ou o jipe, mas há gente de 40 anos que continua a ser apenas “abridor de portões”. Há pais que não delegam responsabilidades, que não partilham decisões, que fazem projetos em nome dos filhos, mas depois querem ficar para sempre a controlar tudo. Ora nós, que sabemos que uma árvore para crescer precisa de um tutor com um fio de sisal ou plástico que vá cedendo até soltar, temos de saber e ser capazes de fazer o mesmo com os filhos.

– Também se pode casar e ser feliz com alguém de “fora” da lavoura. Há pais agricultores que sonham, teimam, pressionam e condicionam para que os filhos encontrem o parceiro para a vida dentro do setor, mas tem de perceber que antigamente era mais fácil escolher noiva ou noivo dentro do setor quando metade da população estava na agricultura.

– Quem casa quer casa. Um espaço só para si. Antigamente tínhamos famílias enormes e várias gerações na mesma “casa de lavoura”, também enorme, mas também tínhamos e temos problemas por causa disso, porque nos esquecemos de um velho conselho escrito na Bíblia“o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne”.

– Antigamente, como dizia a minha avó, tínhamos de escolher entre as vacas e os livros. Hoje temos de escolher os dois. Na família aprendemos os valores, ganhamos experiência, até podemos receber uma empresa agrícola em movimento com a força da “roda de volante” do motor, mas se “é preciso uma aldeia para educar uma criança” também são precisas as escolas agrícolas de nível secundário ou os cursos de nível superior para dar a formação cada vez mais necessária.

– A empresa agrícola da família deve ser o primeiro e o melhor estágio, mas estagiar noutras empresas e atividades abre outras perspetivas. A formação tem de continuar ao longo da vida, com visitas de estudo, leituras, congressos e formações obrigatórias e opcionais.

– Somos cada vez menos agricultores e jovens agricultores, mas se nos associarmos e encontrarmos já não estaremos tão sós. Participar em associações de jovens agricultores de nível nacional e de caráter local, capazes de organizar atividades e pontos de encontro, é muito importante.

– Ouvimos muitas vezes os mais velhos lamentarem a falta de jovens na agricultura, nas associações e nas cooperativas agrícolas, ouvimos discursos simpáticos e condescendentes sobre os jovens, mas depois fazemos como o galo velho do poleiro que se sente ameaçado pelo franganito que acabou de chegar. Ainda me lembro do que assisti e do que passei. Teremos muito a ganhar se tivermos consciência que nenhum de nós é o princípio, o centro ou o fim da história, somos apenas peregrinos que recebemos a terra ou as organizações como testemunho com a obrigação de passar nas melhores condições possíveis aos nossos filhos ou a quem nos suceder.

– Comprar um trator é mil vezes mais fácil do que fazer qualquer construção que exija licenças, nomeadamente ambientais. Claro que tem de haver regras, mas a nossa Europa que liderou o mundo nos últimos dois milénios tem de perceber que o excesso de regras a está a deixar para trás.

– Os prémios à primeira instalação e os apoios ao investimento são essenciais. Que haja controlo, mas que sejam simples e sejam rápidos os processos e os pagamentos e que haja para os jovens acompanhamento técnico e de gestão nos primeiros anos.

– Não adianta dar apoios à instalação se não houver depois um preço justo pelos produtos agrícolas, capaz de pagar o investimento, os custos de produção, o trabalho agrícola e dar algum lucro e esperança aos jovens para continuar a trabalhar, a investir e a construir o futuro para também um dia passarem o testemunho.

* Agricultor e produtor de leite. Artigo publicado originalmente no Agroportal.

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